O Grande vândalo

O Grande vândalo

Sentimento estranho que me acompanhou nesta segunda semana de junho de 2013. Os jornais e as redes sociais lotadas de imagens e textos sobre o quarto dia manifestação contra o aumento de 20 centavos das passagens de ônibus em São Paulo.

Mas apenas R$ 0,20? Este foi o aumento, justificado racionalmente pelo prefeito de SP. Mas  a razão conta nessa hora? Há como controlar manifestantes imbuídos de um ou muitos ideais? Ha como convencer um policial em não me agredir e respeitar meus direitos numa situação dessas? Há a racionalidade?

Manifestantes: o quê manifestam?

Várias coisas e talvez por isso seja difícil. Lembro agora de uma frase que pipocava na revolução de maio 68: “Sejamos realistas, exijamos o impossível”. É isso que os movimentos transpiram. Um caráter revolucionário geral e inespecífico.  Os R$ 0,20 representam diretamente um custo maior de um serviço que é péssimo, que proporciona uma experiência desumana, que não vale o quanto custa, que está entre os mais caros do mundo.

É uma manifestação pela Moral, e como todo grande tema humano, tem aspectos fugidios e difíceis de definir. 

A insatisfação indireta, que acho a mais importante, é quanto à corrupção e má gestão, que desvia recursos e que impossibilita qualquer tipo de serviço de qualidade nesse país. Pense na saúde, no quanto você paga de impostos na compra de qualquer coisa, no quanto você paga de pedágio em uma simples viagem... enfim, em como os impostos são altos no Brasil relativamente ao que a população tem em troca. O preço da corrupção custa para o Brasil entre R$ 41,5 e R$ 69,1 bilhões por ano. A estimativa é de um estudo divulgado pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). É um dinheiro que vaza! E Haddad (prefeito de São Paulo) fala na maior tranquilidade, apoiado por estudos técnicos (?), que não tem recursos para bancar um abaixamento do preço das passagens ou de dar mais subsídios. E acho que não tem mesmo, tamanha a falta de controle e irracionalidade dos processos técnicos e burocráticos no nosso país.

É disso que se trata. De um sentimento de que a corrupção, má gestão e incompetência no Brasil atingiram níveis absurdos.  

Vândalos e a mídia

O que se ouve por aí, das pessoas que “acreditam” na democracia ou gente que simplesmente não parou para pensar no que fala é: “Sou totalmente a favor de manifestações pacíficas, mas sou contra manifestações com vandalismo e baderna”

E nesse sentido Datena, do Programa Brasil Urgente (13/6) , faz uma pesquisa rápida por telefone e obtém uma surpresa. A maioria esmagadora se coloca a favor de “manifestações com baderna”. Datena simplesmente não acreditava no que via, ao vivo.

Jornalistas e fotógrafos foram atacados e uma quantidade brutal de vídeos e outra informações foram colocadas em tempo real na internet promovendo uma fato interessante: tem muita gente achando essas manifestações legítimas, porque estão tendo acesso ao outro lado da história pelas redes sociais.

Por outro lado, a Rede Globo no Programa Fantástico (17/6)  apresenta um jornalismo nojento, apático e sem sentido. O programa, que é muito bom em fazer coberturas enormes sobre futebol, assassinatos e outros, parece preferir não se envolver em questões políticas. Neste domingo, esperei o programa começar achando que haveria uma cobertura de no mínimo 10 minutos sobre os fatos dessa semana. Mas o que vi foram míseros 4min13seg. O mesmo tempo dado à matéria importantíssima sobre “Paquera anônima por bilhetinhos ganha rede sociais". A matéria “Brasileiros relatam problemas na cobertura de seguros de viagem no exterior” com 9min19 e “Escadas rolantes podem oferecer perigos” com 5min25seg. Pasmem! Mas mesmo assim, praticamente ignorando os fatos políticos desta semana, há também no discurso da rede Globo que houve sim abusos da PM e certa legitimidade nos protestos.

Enfim, algo de novo aponto no horizonte: a grande mídia parece não ser mais dona das informações, que estão chegando praticamente “cruas” (não editadas) na casa das pessoas. E isso é muito importante!

É absurda e ingênua a ideia de que uma manifestação com milhares de pessoas deve ou pode seguir linhas de civilidade. Haverá contravenções, crimes, depredação do patrimônio público, violência e truculência; sobretudo se a polícia revidar, como brucutus, como marginais. 

Isso precisa acontecer! Faz parte de uma estética revolucionária que povoa o imaginário das pessoas. (bombas fumaça, o punho cerrado, fogo e violência...  estudantes oferecendo flores aos policiais, é claro). Longe de mim protestar ou incitar atos público agressivos porque eu simplesmente não compartilho a ideia de que haverá um mundo melhor por vias políticas, e isso é outra história. Mas o que vimos nesse episódio é que a polícia abusou e utilizava métodos de repressão baseados na dispersão e terror, que atuam mais como gasolina no fogo do que água no fogo. É irresponsabilidade do Estado utilizar métodos completamente burros na lida com manifestações desse tipo. O simples pensamento “violência gera violência” poderia estar em pauta na formação dos policiais. Um policial que dá um tiro na cara de alguém (e isso aconteceu com uma jornalista da Folha de SP), revidando à um xingamento, é um vândalo, é um criminoso! Sabemos que nessas manifestações há um heterogeneidade. Vários grupos se reúnem. Tem gente dando flor para a policia, tem gente levantando bandeiras de partido politico, tem gente quebrando as coisas (chamados “Black Blocks”,  grupos que atuam desde os anos 1990 nos EUA e na Europa, chamam a atenção com atos agressivos contra o patrimônio público  e bancos). Todos compõem este exército, aparentemente sem líderes, que funciona por meio da autogestão e comunicação rápida pela internet.     

Há, portanto, dois grupos de vândalos: os de cima e os de baixo. Os de cima vandalizam dentro das normas, dentro de uma suposta legalidade e nas brechas, no subterrâneo. E os vândalos de baixo, tomam balas de borracha em suas cabeças lotadas de medo e esperança.

Dói, ver pessoas tomando tiros de borracha ao mesmo tempo em que gritam “Sem Violência, Sem Volência”. Dói, ver jornalistas sendo agredidos e carros sendo bombardeados com gás lacrimogênio. Dói, ver policiais quebrando o vidro da própria viatura para incriminar o movimento. Dói, ver um Estado psicopata desabando ao fluxo de palavras e pensamentos “racionais”, quando o momento exige parcimônia, diálogo e criatividade.

Talvez meu sentimento nesta semana que passou seja de orgulho. Vi também amigos que estão em Berlin protestarem à favor dos protestos, e a formação de uma rede de amor e consideração à estes jovens (em sua maioria) que saíram do Facebook, para gritar e tomar a cidade para si!

Por mais que haja todo um "blá-blá-blá" dos que pensam a política e a sociedade (e me incluo nesse time de "faladores") quero deixar expressa aqui minha simpatia com os brasileiros que todos estes dias se ferraram nas ruas de São Paulo. Eles podem ter feito tudo errado, mas merecem meus mais sinceros sentimentos de admiração e respeito!

 

 

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