Precisamos aprender a jogar o jogo proposto pelo Bolsonarismo

Precisamos aprender a jogar o jogo proposto pelo Bolsonarismo

O jogo é este

1. Bolsonaro fala merda

2. Esquerda se escandaliza

3. Mídia repercute

4. Bolsonarismo se fortalece (volta ao item 1)

É um jogo que se retroalimenta em ciclos, resultando no aumento de adesão ao Bolsonarismo. Bolsonarismo é um movimento cultural que se alimenta do conflito em si e não de sua resolução. Quanto mais conflito melhor. Não estão abertos a diálogo, porque os conflitos são propositalmente insolúveis. 

Se nós, os opositores a este movimento criticam, eles ganham. Eles sempre ganham. É um movimento de guerra cultural que visa destruir seus opositores, então tudo que acreditamos - inclusive a ciência utilitarista que produz desenvolvimento em todos os níveis - é negado.

Erramos muito.

O nosso erro número 1 é jogar o jogo sem seguir as regras.

Por exemplo, não dá pra jogar futebol e ganhar, sem seguir as regras. Vamos ter que seguir as regras do jogo para ganhar.

Neste jogo, não há ciência, diálogo, democracia ou qualquer coisa que adoramos usar como argumento infalível. Falou “democracia”, perdeu! Falou em “a ciência diz que...”, perdeu! “Especialistas indicam que...”, perdeu!

O jogo é baixo, rasteiro. Ou jogamos o jogo em níveis bem baixos - como ele foi desenhado, seguindo as regras - ou não jogamos.

Temos que não jogar o jogo, penso. Mas isso não é tão simples assim porque o jogo é convidativo.

Lembro do biólogo Atila Imarino, paciente e elegante em todos os seus comentários sobre a COVID, que anda perdendo a paciência. Alguém perguntou a ele, ironicamente "Quais os próximos passos? E ele pontuou: "plantar o cu em casa e esperar a vacina no posto".

E o virologista do Hospital de Base de Rio Preto, Maurício Lacerda Nogueira? Respondendo a um post que dizia que pessoas estão morrendo por tomar vacinas, disse simplesmente: "Teu cu"

Olavo de Carvalho, um dos mentores do "Bolsonarismo Teórico" (kkk), foi o criador das regras deste jogo, que necessariamente versam sobre o cu e outros palavrões e ofensas que nos lembram idos tempos da nossa 5a série.

Lembrem-se o jogo é baixo.

Nosso erro número 2 é confundir Bolsonaro com Bolsonarismo.

Bolsonarismo faz parte de um movimento cultural mais amplo, de uma resposta contra “tudo que está aí” (a modernidade). Esse movimento é uma sopa de ideários elitistas, religiosos, conservadores e antidemocráticos, que deu origem ao Trumpismo inclusive.

Perceba que, quando nos indignamos com algum ato ou fala de Bolsonaro, já pensamos no efeito que isso causaria nas pessoas que amamos ou nos perguntamos: como as pessoas podem apoiar esse sujeito? Como meu pai, meu marido, meu filho pode seguir as ideias desse cara? Portanto, temos asco do efeito que Bolsonaro causa nas pessoas (o Bolsonarismo) e não ao que ele, pessoa física é. Acho importante separarmos as duas coisas: causa e efeito.   

Bolsonaro é um fantoche com função de para-raios. É uma figura que provoca naturalmente a violência, ao mesmo tempo, em seus opositores e seguidores; mas que se recarrega e prospera com cada ataque. Ao atacarmos Bolsonaro – e não importa se temos razão ou não - passamos o seguinte recado subliminar aos Bolsonaristas: “veja só como a esquerda é escrota e violenta, atacam Bolsonaro, atacam o que acredito, e ele, Bolsonaro, me protege. Bolsonaro defende essas pessoas que se sentem atacadas e perseguidas desde o início deste século.

Assim, facilmente Bolsonaro vai sendo colocado no lugar de um pai protetor, de um mito vivo. Uma figura que vai adquirindo mais e mais poder, em cada post, cada tweet, cada crítica dos telejornais.

Acho que para neutralizar o Bolsonarismo, temos que ignorar Bolsonaro... no máximo ridicularizá-lo em alguma piada. Mas nunca o levar a sério. É bom dizer que me refiro ao que nós, o povo, simples mortais, poderíamos fazer no nosso cotidiano para que esse movimento (o Bolsonarismo) se enfraqueça. Instâncias democráticas e a imprensa devem fiscalizá-lo, como estão fazendo alias. Nós não somos a imprensa, nós não somos ministros do STJ!

 

Erro número 3 é acharmos que temos a obrigação de emitir opiniões e notas de repudio particulares.

As redes sociais nos convidam a dar opiniões e repercutir ondas de notícias que alimentam o tal jogo (item 2 do jogo). Entretanto, não há dúvidas de que as redes socias são instrumentos importantes de pressão popular aos Governos. E ficamos numa sinuca de bico.

Esse é o ponto. Nós, a oposição popular (mas não a imprensa, que, penso, deve fazer sempre esse trabalho!) precisamos cuidar do que postamos, o que compartilharmos, de modo a não alimentar o jogo – que como sabemos, é jogo perdido.

Pautas morais e merdas que o Bolsonaro fala ou faz, questões diretamente relacionadas a ele – que é mito - devem ser excluídas do nosso rol de interesses.

Fazendo o pai fundador perder importância de para-raios, que defende e protege seus seguidores - solapamos o movimento como um todo. E para que ele perca essa importante função, ele precisa ser ignorado. Em outras palavras, precisamos atacar a função que Bolsonaro exerce sobre o movimento, e não atacarmos a ele próprio.     

Enfim, lutemos contra “o Bolsonarismo, movimento cultural”, mas não contra “o Bolsonaro ele mesmo”. Se não, perdemos.

 

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