O limite da humanidade

O limite da humanidade

Se você não consegue diferenciar, realmente importa?

 

A afirmação: “a impressora não quer imprimir” te causa alguma estranheza? Que tal: “a televisão não quer ligar”? E uma última: “o celular não quer carregar”? Essas são frases comuns que ouvimos todos os dias, muitas vezes, sem refletir além do sentido óbvio que elas transmitem. Na verdade, a impressora, a televisão ou o celular não podem querer ou deixar de querer algo, pois, para tanto, seria necessário vontade, desejo, enfim, vida. Se a ideia de máquinas com “vontade” também lhe chama a atenção, este artigo está repleto de dicas para você.

Um menino de verdade

Vamos começar com o clássico A. I. – Inteligência Artificial, filme de ficção científica de Steven Spielberg lançado em 2001. Logo no início da narrativa o protagonista David, com cerca de 10 anos de idade, é abandonado em uma floresta pela mãe, que pede que ele desça do carro e fique ali, enquanto ela dirige para longe. Mas David não é uma criança “de verdade”, ele é um androide construído e programado para amar seus pais. Só que isso não torna a cena menos triste. Em um universo futurista em que humanoides são comuns e a inteligência artificial é muito avançada, A. I. – Inteligência Artificial traz a proposta de acompanhar David na busca pela Fada Azul, referência direta à história do Pinóquio, que também procura a fada para que ela o transforme em um menino de verdade. Carregado de drama e conflitos éticos, o filme nos convida a considerar os sentimentos daquelas máquinas, em especial do protagonista.

Uma nova integrante da família

A mesma proposta sobre sentimentos dos robôs humanoides está em Better than Us, série russa de ficção científica disponível na Netlfix. O protagonista é Georgy Safronov, que tem seu destino interlaçado com o de Arisa, uma androide que foge de seu proprietário, o antagonista Viktor Toropov, diretor de uma grande corporação especializada na fabricação de robôs. Arisa encontra uma grande amiga em Sonya Safronova, filha do protagonista e, a partir de então, tenta assumir o papel de mãe e esposa naquela família, o que serve de plano de fundo para a discussão sobre os sentimentos dos robôs. E o antagonista também tem problemas domésticos, pois sua esposa tem um androide idêntico ao filho falecido do casal, que ela trata como o próprio menino, mas Viktor o vê apenas como mais um produto da empresa. A série é incrível e traz diversas semelhanças com a obra que originou todo esse universo da robótica, o livro Eu, Robô, escrito por Isaac Asimov.

O gênio idealizador

Questões como robôs reduzindo vagas no mercado de trabalho, a relação entre homem e máquina e uma dependência crescente da tecnologia são questões que Isaac Asimov trouxe em sua obra de forma brilhante. Se hoje esses pontos estão se tornando cada vez mais reais e nós podemos imaginar aquele futuro, lembrar que o livro foi publicado em 1950 o torna ainda mais impressionante. Através de vários contos, Eu, Robô inicia com um cenário em que uma amizade sincera entre uma criança e um robô dá origem a uma revolta social, que só pôde ser solucionada (ou ao menos reduzida) com a aprovação de uma lei que proíbe robôs na Terra (sim, viagens interplanetárias são possíveis). O termo “robótica” aparece pela primeira vez e são determinadas as Três Leis da Robótica, que estão presentes em quase todas as obras do gênero a partir de então. Em 2004, Will Smith protagonizou o filme também intitulado Eu, Robô, mas não se engane, o filme é bom, embora não esteja nem perto da genialidade do livro.

Você é real?

Outra série que merece ser citada é Westworld, que estreou em 2016 na emissora HBO e é baseada no filme de mesmo nome de 1973 sobre um parque de diversões futurista no estilo faroeste que dá nome à série e se destaca pelos “anfitriões”, robôs humanoides que são a principal atração. A proposta de Westworld é a possibilidade de interagir com os anfitriões como se estive na época do velho oeste, podendo conversar, beber juntos, se divertirem e participarem de diversas aventuras. Ah, também é possível espancar, torturar, matar, estuprar, afinal, são só robôs, certo? O debate é muito profundo e pode ser bem exemplificado pela conversa do personagem William com a mulher que o recebe no parque. Após ela se insinuar sexualmente, ele pergunta: “você é real?” e ela responde: “se você não consegue diferenciar, realmente importa?”. Essa é a proposta de Westworld, que traz um dos melhores plot twist que eu já assisti, vale muito a pena conferir.

Uma guerra de ideais

E para finalizar, que tal deixar de ser mero expectador? Em Fallout 4, game de RPG de ação produzido pela Bethesda Game Studios, você é inserido em um futuro pós apocalíptico no qual a guerra entre três facções conduz a narrativa. O Instituto é uma organização que detêm a mais avançada tecnologia e produz os “sintéticos” (adivinhe só?), robôs idênticos aos seres humanos, que são utilizados como ferramentas para atingir os objetivos da organização. Já a Ferrovia é um grupo rebelde que acredita que a semelhança entre os sintéticos e os humanos lhes torna iguais. Eles atuam em oposição ao Instituto, libertando e reprogramando os sintéticos para inseri-los na sociedade como se fossem humanos. Há também a Irmandade do Aço, grupo militar que é contra a existência dos sintéticos, atuando para destruir todos os que encontram e, para cortar o mal pela raiz, também o Instituto. Em resumo, a criação dos sintéticos trouxe para o Instituto dois inimigos, a Ferrovia para libertá-los e a Irmandade do Aço para destruí-los. Por questões filosóficas, Ferrovia e Irmandade do Aço também são inimigas. O game permite que você se aprofunde nas três facções para conhecer os ideais e os objetivos de cada uma. Contudo, em determinado momento, uma escolha definitiva precisa ser feita. E aí? Robôs indistinguíveis dos humanos em aparência e inteligência devem ser tratados como meras máquinas, ser reconhecidos como iguais ou destruídos?

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