Vamos todos nos unir!

Vamos todos nos unir!

O caminho da vida poder ser livre e bonito, mas nós perdemos o caminho

 

Jojo Rabbit é o filme vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Adaptado e conta a história de Jojo Betzler um menino de dez anos que sonha em ingressar no exército nazista. Ele tem amigo imaginário, Adolf Hitler, interpretado por Taika Waititi, que também é diretor do filme. A narrativa é muito rica e consegue produzir alguns sorrisos com diversos ataques ridicularizando as ideias e as práticas nazistas. A descrição assustadoramente exagerada sobre os judeus que é apresentada as crianças, especialmente ao protagonista, e o uso excessivo e desajeitado da saudação nazista “Heil Hittler” são pontos de humor recorrentes.

Claro que um tema tão trágico não poderia ser trabalhado sem o drama que representa, mas o filme apresenta uma bela lição de esperança, do valor da vida e de resistência a opressão. Enquanto as ideias nazistas são alvo de chacota, há personagens que são um alívio humanitário. Entre eles, Rosie Betzler, mãe do protaganista, interpretada por Scarlett Johansson, que nos enche de esperança.

Mas a comédia com esse tema não é novidade. Em 1940, enquanto a França era ocupada pelos alemães, o gênio Charlie Chaplin lançou O Grande Ditador. Assim como em Jojo Rabbit, o papel de Adolfo Hitler foi interpretado pelo diretor do filme, o próprio Charlie Chaplin, mas ali o personagem se chamava Adenoid Hynkel. A pequena diferença no nome do ditador foi uma das mudanças, que juntamente com o cenário, o símbolo que se referia claramente a suástica, como todos os elementos não deixavam dúvida da crítica direta ao nazismo e à Adolf Hitler.

No filme, um barbeiro judeu, totalmente alienado ao estado de guerra e as ideias nazistas, é confundido com o ditador Adenoid Hynkel, pois ambos são interpretados por Chaplin. Ao final, um discurso emocionante dá lugar ao que seria uma incitação ao ódio do discurso nazista. Pela beleza e relevância da fala, assim como pelos mais de 60 anos do filme, vale a pena descrever esse discurso aqui (ah, vale dizer que na narrativa todos acreditam que quem discursa é Adenoid Hynkel):


Me desculpem, mas eu não pretendo ser um imperado. Esse não é o meu ofício. Eu não quero governar ou conquistar ninguém. Eu gostaria de ajudar à todos, se possível: os judeus, os gentios, os negros, os brancos. Nós todos queremos ajudar uns aos outros. Humanos são assim.

Nós queremos viver pela nossa felicidade e não pela nossa miséria. Nós não queremos odiar ou desprezar ninguém. Neste mundo há espaço para todos e a boa Terra é rica e pode prover para todos. O caminho da vida pode ser livre e bonito, mas nós perdemos o caminho.

A ganância envenenou as almas dos homens, cercou o mundo com ódio; nos levou à miséria e ao derramamento de sangue. Desenvolvemos velocidade, mas nós nos trancamos para dentro. As máquinas que produzem em abundância nos deixaram necessitados. Nosso conhecimento nos tornou cínicos, nossa inteligência, duros e cruéis. Pensamos muito e sentimos pouco. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade, mais do que inteligência, precisamos de bondade e gentileza. Sem essas qualidades, a vida será violenta e tudo estará perdido.

O avião e o rádio nos aproximaram. A própria natureza dessas invenções clama pela bondade nos homens, clama pela fraternidade universal, pela unidade de todos nós. Mesmo agora, minha voz está alcançando milhões em todo o mundo, milhões de homens, mulheres e crianças em desespero, vítimas de um sistema que faz os homens torturarem e encarcerarem inocentes.

Para aqueles que podem me ouvir, eu digo: não se desespere. A miséria que agora está sobre nós é apenas a passagem da ganância, a amargura dos homens que temem o caminho do progresso humano. O ódio dos homens passará e os ditadores morrerão, e o poder que tiraram do povo retornará ao povo. E enquanto esses homens morrem, a liberdade nunca morrerá.

Soldados! Não se entreguem aos brutos, homens que os desprezam e escravizam, que regem suas vidas, lhes dizem o que fazer, o que pensar e o que sentir, que os treinam, fazem dietas, os tratam como gado, os usam como bucha de canhão! Não se dêem a esses homens não naturais, homens-máquina, com mentes de máquina e corações de máquinas. Vocês não são máquinas! Vocês não são gado! Vocês são homens! Vocês têm o amor da humanidade em seus corações. Vocês não odeiam, apenas os não amados odeiam, o não amado e o não natural.

Soldados! Não lute pela escravidão! Lute pela liberdade! No capítulo dezessete de São Lucas está escrito: "O reino de Deus está dentro do homem". Não um homem, nem um grupo de homens, mas em todos os homens. Em você! Vocês, o povo, têm o poder, o poder de criar máquinas, o poder de criar felicidade. Vocês, o povo, têm o poder de tornar esta vida livre e bela, de tornar esta vida uma aventura maravilhosa. Então, em nome da democracia, vamos usar esse poder, vamos todos nos unir!

Vamos lutar por um novo mundo, um mundo decente que dará aos homens uma chance de trabalhar, que dará a você o futuro, a velhice e a segurança. Pela promessa dessas coisas, os brutos subiram ao poder, mas eles mentem. Eles não cumprem sua promessa, nunca o farão. Os ditadores se libertam, mas escravizam o povo.

Agora vamos lutar para cumprir essa promessa. Vamos lutar para libertar o mundo, para acabar com as barreiras nacionais, para acabar com a ganância, o ódio e a intolerância. Lutemos por um mundo de razão, um mundo onde a ciência e o progresso conduzam à felicidade de todos os homens.

Soldados! Em nome da democracia: vamos todos nos unir!


Jojo Rabbit é um excelente filme. O Grande Ditador é uma obra de arte incomparável. Mas, na verdade, em só queria divulgar este discurso do Charlie Chaplin à todos que puderem ler. Vamos todos no unir!

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