ESCREVEREI SOBRE O NADA

ESCREVEREI SOBRE O NADA

(O BOCA DO INFERNO – SEM NADA NA BOCA)

 

Hoje escrevo. Obrigado. Não quero escrever. Não tenho nada a dizer. Sinto-me só, não tenho dó nem estômago, para desatar esse nó: nenhuma perspectiva para mudar essa vida bandida, à flor da pele, em carne viva.

Li hoje uma notícia bélica que provavelmente mudará os rumos do mundo: Kayzar vence Paula e é o novo líder do BBB18. Terrível, mas é verdade verídica, fatídica. Agora Kayzar, Kim Jong Il e Donald Trump são donos do mundo. O primeiro está às voltas com as tramoias para ficar em primeiro no imundo BBB18. Não ganha um milhão, quem fica em segundo. O segundo, destrambelhado, talhado para usurpador do estado, anda metido em tramoias com a China para conquistar o imundo; o terceiro, bem, o terceiro imundo ganhou, chegando em segundo. Você pode até escolher em qual das tramoias anda metido: subornado por Putim (ninguém se chama Putim impunemente), dono da Rússia (imbecil astúcia), estuprando Seul, humilhando a Coreia do Sul, assédio sexual contra uma atriz pornô, assédio moral, atitude amoral, imoral, contra esse mundo imundo, agindo nas sombras do submundo.

Hoje não quero falar sobre nada. Não quero falar sobre a recuperação de Neymar, do medo do PSG de perdê-lo para o Real. Neymar está insatisfeito em Paris, desacostumado com os buracos nos gramados ordinários e a violência dos adversários. Queria vê-lo satisfeito na Rocinha, refém da violência do tráfico, raivoso com os buracos de bala na parede da sua casa. Dirão sobre o que digo, repetindo, monotonamente, como um bate estaca: "Isso é coisa de um idiota delirante, coisa de babaca". Neymar nos redimirá, ele nos salvará.

Neymar Junior ambiciona ser o primeiro do mundo, não aceita ser o segundo. Não pode ser derrotado, contrariado, precisa ser amado, paparicado como um rei. Neymar está acima de tudo,  anos luz da lei. Alugou uma mansão, de frente para o mar, para poder se curar do mal no dedo, do medo de nunca mais jogar. Curado, cairá no colo do capital do time da capital espanhola. Um craque não vive de esmola, no entanto parece um boneco de mola nas mãos de seus proprietários, estes sim, empresários donos da bola. É refém da escravidão moderna, não da brancura dos dentes, mas da estrutura das pernas.

Nesse caso, prefiro falar da minha unha encravada, do Rio de Janeiro, que virou piada com a intervenção militar, para intimidar o cidadão, calar a insatisfação com o desgovernador Pesão, com os bandidos fardados, os à paisana, com a polícia e a milícia que mandam massacrar qualquer "não" atirando a bordo do caveirão. Rio, uma doença supurada, purulenta como uma ferida desgraçada. O cidadão vitimado, torturado, vendo impotente, alijado, aleijado, sua casa alvejada, sua alma cravejada de balas, sua família escorraçada. Quer sobreviver, ver seu filho crescer, amadurecer. Com sorte, ele chegará aos vinte anos, sem ser atropelado pela morte. Insegura, a população vê apenas o muro erguido com o dinheiro da corrupção.

Marielle Franco representante dos negros, aqueles que sempre perdem os empregos, vítimas do racismo de filho de preto, que acha que é branco. Morreu, mas seu eu sobreviveu. "Mulher vai aonde quer"; "Mulher veste o que bem quiser". esses eram os slogans do movimento, atento aos clamores, vitorioso. Será? Uma bala atravessará toda aquela que desafiar todos os que não querem mudar. Assim ainda é. Assim será. Quem, como Marielle, os desafiará? Marielle Presente: um presente que deveria durar, para lutar contra a hipocrisia, contra essa mania das mulheres que insistem em se desprezar, que creem que um voto nada mudará.

Hoje não quero Temer o temer e sua corja de ladrões do erário, de assistir impotente o Maluf virar ex-presidiário e do STF soltar mais um megaempresário. Não quero falar que o Maluf se auto excluiu da cadeia, afinal o judiciário é uma teia. Teia de leis, tecidas para prender otários, os que lavam a bunda na privada imunda. Salvar reis, como Sarney, dono do Maranhão, onde ninguém é cidadão. Maluf saiu por questões humanitárias (?), foi cumprir prisão domiciliar e gargalhar da nossa idiotia, da nossa distopia, nossa miopia, na nossa cara. Seu advogado dispara que, como o ex-prefeito, ex-governador da ditadura, que ainda dura, é mestre na arte de ludibriar. Bateu no peito, para nos humilhar. Maluf inocente é o mesmo que acusar de comilão um povo sem dente.

Nesse caso, prefiro falar da tropa de choque do Lula, da sua corja de ladrões do erário, de como seu advogado ridiculariza o “phoder” judiciário, do Gilmar que tem o cacoete de soltar qualquer amigo rico mandatário, ao invés de mandar baixar o cassete no lombo nesses safados, como faz o carcereiro subornado no lombo do encarcerado. E o agente penitenciário, cheio de dívidas para pagar e sua vida preservar descem o porrete. Até Zé Dirceu, réu confesso no confessionário, tornou-se ex-presidiário, trancou Sérgio Moro no armário e foi dançar forró num aniversário, zombando do povo otário.

Hoje não vou falar do Tite, nem da sua tropa de elite, nem de como sua seleção nos salvará, será a nossa redenção, nos tirará do terceiro mundo. Tite, sinônimo de Valdenor, o vencedor, o salvador. Ganhar é o que importa em um país de moral torta, em que se espera todo dia nascer um salvador. Deixaremos de ser um povo pária, viraremos uma pátria. Pátria de chuteiras, em que intelectual é todo aquele que só fala asneiras, vítima de um sistema educacional, incompetente, indecente, imoral, que confunde ensino, com educação e besteiras. A copa nos guindará à condição de país desenvolvido, antes dominado, subnutrido. Nem de longe o país de politiqueiro, onde só é cidadão, quem tem dinheiro.  

Nesse caso, prefiro falar do imundo. E olha que não me chamo Raimundo. Nem trago nos ombros o peso do mundo. Também não sou rima, nem lima, nem jamais serei solução. Não sou apaniguado, nem tenho mansão de frente para o mar e me recuperar de tanto apanhar do sórdido zagueiro, que recebeu dinheiro, para me quebrar. Se a imprensa deixar, posso até descansar de descansar. Como você, recebo também essa informação deturpada, acanalhada. Não sou genial como Drummond, muito menos intrépido como Santos Dummont, sou apenas mais um brasileiro, morador de um imenso Rio de Janeiro. Terra em que ninguém tem voz, grita dentro de uma casca de noz, massacrado por uma impotência atroz.

Encomenda mais um jornalista em tom solene, em um momento pobre, a que chamam nobre: em quinze segundos, faça um vídeo com o celular deitado eternamente em berço esplêndido, dizendo que país você quer para o futuro. Quem sabe um país sem muro, que não caia de Maduro, fingindo ser uma democracia, como a Venezuela, quando é, na verdade, uma dura democratura, estúpida, enferma e corrupta. Desculpem minha rima miserável, por muitos intolerável.

Não fiz o vídeo, mas se o fizesse resumiria o que eu quero desse país. Resumiria em três palavras minha utopia, ainda que miopia: “Quero um país”.

Hoje não vou falar do Lula nem da sua caravana, na qual idiotas deram tiros, jogaram pedras e até banana. Isso é oposição? Só se for em um mundo cão, em que o imbecil acha que é cidadão. Nem do MST que promete porrada, propõe, então, não propor nada. Isso é oposição? Só se for neste nosso mundo cão, em que o eleitor não tem a mínima consciência do que significa uma eleição. Eleger é plantar, mas também cobrar. "Não apenas votá e deixar pra lá". Sou devoto do voto. O povo sabe votar sim. Vota com o bolso e estômago. Não vota, porque foi estimulado a acreditar que vale mais a pena disciplinar. Governar com fuzil? O votante talvez não conheça a história, não lembra que não  há glória no cabresto. Assim vale aprender já que o ex-presidente não está sendo preso por causa de um apartamento no Guarujá. Faz-me rir, quero saber já onde meu dinheiro está ainda. Escarnecerá de todos nós o governo, criando um novo Collor deposto por causa de um Fiat Elba e reformas na Casa da Dinda. Faz-me rir, Collor não foi preso e nem devolveu meu dinheiro ainda.

Neste dia solene penso e penso e penso para amadurecer. Será que não é melhor pensar em emburrecer para conviver? Pensar em não escrever? Pensar que vale a pena embrutecer para sobreviver? Tampar os olhos para não ver? Comprar armas para resolver? Fazer uma revolução, para que uma nova elite chegue ao “phoder”? Sempre neste estado de comoção, nenhum de nós é cidadão, por isso aprendeu que voto não muda nada, isso deu asas ao fanatismo, ao nanismo cerebral. Desculpe-me não deu rima.

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