O ENEM DEVERIA SER ANULADO
“Adestrar” alunos com “modelos” de redação é mais velho que andar para frente. Parece novo, mas não passa do velho com botox. Nos anos 80, não havia metodologia para redigir textos para as provas de vestibular e critérios de correção muito claros, pois a prova de redação ainda era novidade. Era comum que cursos “adestrassem” seus alunos. Nos anos 90, a Fuvest deixou mais claros seus critérios e revolucionou, passou a não punir a dissertações em 1ª pes./sing. (saíamos finalmente da ditadura). A Unicamp deixou claros os seus critérios, quanto a considerar um texto “autoral”. As escolas, então, abandonaram o decoreba para investir em “ensino”. Hoje: “Quem ensina, propõe um texto autoral”. Mirando-se nos 80: “Quem adestra, enfia modelos goela abaixo do aluno”.
O ENEM prestou um desserviço à educação, a partir de 2009. Retrocedeu aos anos 80 criando o seu “modelito” exclusivo. Arrastou consigo universidades federais (obrigadas a aderir) e boa parte de estaduais e particulares que resolveram ENENZAR. O MEC criou também o “show” do vestibular, além do professor “dador de aula”. Segundo o professor Mário Sérgio Cortella, em livro, o aluno adestrado entra na faculdade, mas raramente permanece, devido à sua dificuldade de ler, analisar e passar o que depreendeu para o texto. Muitas escolas e cursos impedem seus alunos de publicarem seus textos, não para que outros não os copiem, mas porque revelariam "modelos" que servem para quaisquer vestibulares. Ficaria descarado a linha de produção usando a “fórmula mágica”. Vestibular é competição? Sim. Robotização é educação? Não. Já levaram Admirável Mundo Novo? Se não leram, deveriam. O diferente revoluciona; os iguais se tornam futuramente medíocres: É sociológico, é histórico.
Você não verá uma redação de aluno do Criar que copie redações de outros alunos ou do site do INÉPITO. Todos os nossos alunos fazem questão de terem suas redações publicadas, inclusive, que façam parte do nosso material didático. Essa é a conduta seguida pelas 18 UNIDADES DO CRIAR, que comportam mais de 1000 alunos por ano. Não aceitamos, nem incentivamos, nem propomos que copiem modelos prontos. Já viram “Escritores da liberdade?”. Deveriam. É o exemplo bem acabado do que é educação.
Todos os professores, coordenadores, diretores, que debatem comigo, todos os jornalistas para os quais dei entrevistas, todos os meus alunos sabem que sou um crítico feroz do ENEM, justamente porque ele fez com que vivêssemos hoje uma “deforma” educacional. Li e vi várias entrevistas de alunos, que se preocuparam em usar o filósofo tal, o sociólogo tal, o filme tal, o livro tal na prova e nada falaram sobre qual tese defenderam e quais os argumentos que utilizaram para defendê-la. Podem ter tirado nota 1000, mas quantos deles passaram no vestibular?
Deixo claro que minhas opiniões são claras há anos, portanto, para evitar casos de vitimização, “não estou perseguindo essa ou aquela escola”, “esse ou aquele curso”, “essa ou aquela pessoa”. Inclusive, o MEC erra tanto, nos mesmos lugares, que estou ficando repetitivo.
Em 2009, desde que virou porta de entrada para universidades públicas, o ENEM escancarou o que já se sabia há décadas, ao publicar o questionário socioeconômico. Óbvio: os ricos entram nas melhores universidades. Em 2020, o INÉPITO e o MEC passaram de qualquer limite: uma prova “sem viés ideológico (?)”, “uma organização perfeita, para evitar vazamentos (?)”, “O maior ENEM de todos os tempos (?)”. Os humoristas vão perder o emprego e o governo o pouco de credibilidade que ainda lhe resta, se é que lhe resta alguma. É desonroso dizer que que as patacoadas do ministro “foram sabotagem”. Inépcia não é sabotagem. Infelizmente os candidatos à universidade, em sua maioria, são passivos.
Não há tempo para reverter isso, mas esse ENEM, desmoralizado, errado, deveria ser anulado.