PALAVRA COME HOMEM
O presidente diz o óbvio. O ministro desdiz o óbvio. O assessor prediz o óbvio. O presidente diz que não disse o que todo mundo diz que ele disse. O ministro desdisse o que disse sobre o que o presidente disse. O assessor prediz o que o jornalista dirá sobre o que o presidente disse e o que ele diz que o presidente não disse. O presidente, o ministro, o assessor se apressaram a acusar a imprensa que imprensa de manipular o que o presidente diz que não disse.
O analista diz que o presidente manipula o ministro, que manipula o assessor, que não manipula o jornalista, que manipula o leitor. O presidente é imprensado pela imprensa, impressionada com o ódio destilado contra ela pelos correligionários dele. Os correligionários do presidente precisam da imprensa para propagar o seu ódio contra a imprensa. O presidente aponta o seu dedo acusatório. A imprensa disseca o acusador. Ironiza o seu dedo, que acusa a acusação.
O presidente berra que não tolerará a esquerda, que berra que não tolerará a direita, mas ambos entram na contramão. Os inimigos de hoje serão os aliados de amanhã: foi assim, é assim e assim será. Os da situação querem criar a lei para calar a oposição. Os da oposição querem criar a lei para calar a situação. E quem não é de esquerda, nem é de direita? Cala a boca? O equilíbrio não se sustenta, sustenta o desequilíbrio. Os espertalhões inventaram a centro direita, a centro esquerda e o centrão, uma espécie de virado a paulista: restolho de tudo o que há.
Direita volver!!! Esquerda volver!!! O maniqueísmo continua a assombrar o mundo. Mata sorrateiro mais que revolução. E a revolução que montava grupelhos do lado direito e do lado esquerdo da tribuna, que acabou em 1789, ainda nos assombra; a guilhotina também.
O ódio é fé cega, é faca amolada. Viraliza-se nas redes sociais virtuais e reais. A palavra manipulada pelo ódio mata mais que faca amolada. Uma mentira, dita mil vezes, não se torna verdade. Na verdade, atesta sim a burrice de quem não se embasa para desmenti-la. Se o fato é mais real, que qualquer realidade, imprima-se o fato. Mas, o que é mentira? O que é real? O que é fato?
Um post postado por um presidente vira fato, logo, em seguida, o suposto autor do suposto fato o retira, acusado de mentir. Mas, a mentira já se espalhou como fato. Imprima-se o fato? Vem uma enxurrada de comentários da direita e da esquerda comentando o comentário. Mas, e o fato de postar que virou também o fato de mentir? O assessor afirma que não foi o presidente que postou o post. O jornalista investiga para saber se a mentira é verdade.
Destruir a honra de alguém é muito mais fácil que construí-la, por isso os governantes governam agora via redes sociais. Sempre é: “Não fui eu”. “Forças ocultas querem me derrubar”. “Querem me derrubar”. A claque contratada aplaude a luta contra o sujeito indeterminado e apieda-se do vitimizado. É mais fácil construir uma verdade, que é mentira ou mentir sobre a verdade, que é verdade. O impacto viraliza, independentemente de ser verdade ou mentira: Primeiro, ambas são relativas; segundo, ambas sempre interessam a alguém.
Você já se perguntou a quem? Meias-palavras; meias-verdades, desinformação, subterfúgios: letalidade. Palavra mal intencionada é ovo da serpente. Você não entendeu nada? Informe-se. Cuidado: você está sendo enganado. E lapidado. E usado. E não é vítima. É responsável.