
Ribeirão Preto - entre o café e a cana
dos coronéis aos carcamanos
do café à cana-de-açúcar
das casas em arte Nouveau aos prédios novos-ricos
Gradativamente mata o seu passado
Ribeirão Preto gira em torno de Getúlio Vargas, talvez alguém tenha planejado isso.
O cartão-postal é a Avenida 9 de julho com suas pedras e buracos: Aos pulos, a modernidade dos motores vai devagar. Nasce de uma bifurcação pedregosa para morrer em outra, já asfáltica, símbolo de que o atraso “ficou para trás”.
Para quem tem alguma dificuldade com história: 9 de julho (Aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932: São Paulo x Minas Gerais e Rio Grande do Sul). Os casarões simbolizam o poder dos barões do café. O símbolo do poder da elite cafeeira começa em uma encruzilhada pedregosa e esburacada.
Suprema ironia, é cortada, primeiro pela Avenida Independência, segundo, pela Avenida Getúlio Vargas. Ela, que vinha pedregosa e preguiçosa, do tempo das charretes e cupês, a partir da Avenida Independência, é coberta pelo asfalto. O progresso vem com pressa, passando por cima ou por baixo da história.
A Avenida Independência e a Avenida Getúlio Vargas correm em direção ao mundo dos endinheirados, porém ambas, por ironia, dão de cara com a Avenida João Fiúza, um professor de História, que decreta suas mortes.
ADENDO EXPLICATIVO: O baiano conservador João Fiúza, curiosamente, foi um professor de “história”, que jamais pisou nessas plagas de coronéis e carcamanos. Quem loteou a região, foi seu filho Godofredo Fiúza, aliado das poderosas famílias tradicionais. O nome da Avenida é, logicamente, uma homenagem ao pai. Curiosamente, no trajeto em direção ao mundo dos ricos, morre em Bomfim; no trajeto em direção ao mundo dos pobres, morre na Avenida Caramuru.
Para quem não é afeito à história, Caramuru foi a denominação que os tupinambás deram ao navegador Diogo Álvares Correia, que naufragou no sul da Bahia.
Enquanto a Independência morre, a Getúlio Vargas resiste até a bifurcação com a Avenida João Fiúza: à esquerda, atendendo aos interesses da elite cafeeira, Godofredo vendeu os lotes do Alto da Boa Vista, de onde os coronéis poderiam assistir ao aumento da pobreza daqueles que os serviam. Á direita, desce em linha reta, colocando um ponto final na Independência, morrendo na bifurcação com a Avenida Caramuru, ali começa a Vila Virgínia, um dos bairros mais pobres e populosos da cidade.
A Rua Lafaiete recebe outro capítulo à parte. O nome é uma homenagem ao intelectual aristocrata revolucionário liberal francês, que também lutou nas guerras de Independência dos EUA. Inicia-se na Rua Jerônimo Gonçalves, almirante que lutou na Guerra do Paraguai, é cortada pelas ruas Américo Brasiliense (presidente do partido republicano paulista), pela Visconde de Inhaúma (português, monarquista, amigo de D. Pedro II, lutou na Guerra do Paraguai), pela Barão do Amazonas (português, monarquista, amigo de D. Pedro II, lutou na Guerra do Paraguai), pela Cerqueira César (advogado, sucessor de Américo brasilense na presidência do partido republicano), pela São José (intelectual visionário), Garibaldi (Giuseppe – revolucionário de dois mundos, lutou na Guerra do Paraguai e para fundar a república sul-rio-grandense), pela 7 de setembro (1822, Independência do Brasil) até cortar a Avenida Independência em direção à avenida Francisco Junqueira (nobre de ideais liberais, que derrotou o candidato conservador de D. Pedro II nas urnas). Tem fim a saga da rua Lafaiete entre guerras, conservadorismo e revoluções). Ribeirão Preto é uma ironia a céu aberto.