TOMAR PAU NO VESTIBULAR

TOMAR PAU NO VESTIBULAR

Ainda no bercinho, você se deleita com a voz de travesseiro da mamãe. Ela solfeja uma cançoneta, que algum gago sádico anônimo criou: “Atirei o pau no gato, tô, tô/ mas o gato, tô, tô, não morreu...rreu..rreu. / Dona Chica...ca...ca... admirou-se...se.../ por que foi que o gato não morreu”...

Começa aí a sua saga com a palavra Pau: Pênis. Cacete. Chifre. Corno. Paulada. Pancada. Porrada. VESTIBULAR.

Como pretendo falar sobre o tal vestibular, vou me concentrar nos significados menos nobres da palavra PAU, até porque não há de nobre em “tomar pau”.

Pau de dar em doido.

Não deu certo, deu pau.

Você é mesmo um cara de pau.

Você só sabe meter o pau nos outros.

Se eu levar mais drible, dou um pau nesse cara.

Primeiro, eu converso, se não der, vou para o pau.

Pau, que nasce torto, morre torto.

Escreveu, não leu, o pau comeu.

Pau que dá em Chico dá em Francisco.

Nossa sociedade é medida pelo tamanho do pau: Pau grande (viril, macho, garanhão, reprodutor, vencedor, competente, decidido: Aquele que põe o pau na mesa). Pau pequeno (ridículo, inofensivo, desprezado, inferiorizado, humilhado: Aquele que não tem coragem de por o pau pra fora).

Imagine o quanto a expressão “Tomar pau no vestibular” está tatuada, adesivada, carimbada no inconsciente coletivo? A pergunta devastadora, supostamente consternada de alguém raivoso e/ou piedoso para quem não passou, foi reprovado, tomou na cabeça, se deu mal é “de novo?!”.

Repetida à exaustão, ano após ano, “tomar pau no vestibular” apavora qualquer adolescente, entre 18 e 22, que passa por uma fase de conflitos tanto psicológicos, quanto físicos, hormonais, sentimentais etc. Pior: há escolas que, de forma irresponsável, começam a falar sobre vestibular, já no 5º ano do ensino fundamental: “Se você continuar assim, nunca passará no vestibular, Joãozinho”.

A expressão estampada na cara do “derrotado” expõe a sua vergonha, a vergonha à qual submeteu a sua família, o desprezo do investimento familiar. “Tomar pau” remonta ao ridículo, aos risinhos de canto de boca dos primos, àquela espécie de vingancinha dos concorrentes, dos amiguinhos de balada, das tias fofoqueiras, dos “conhecidos” do condomínio, dos professores do cursinho que o chamaram de “coçador” etc.etc.etc.

Pior ainda é quando o “de novo?” vem pregado àquele consolo capcioso, de alguém: “Não se preocupe, não. Todo ano tem. No ano que vem, você tenta de novo”. Aí a ladainha continua: “Agora, vê se para de vagundear e estuda mesmo, porque o filho, do amigo do sobrinho, do meu amigo passou de primeira”.

Para um vestibulando, nesta época do ano, o medo absorve a coragem. Perder é mais concreto que ganhar. Para ele, será impossível disputar pau a pau com os melhores da turma, da escola, do país, do mundo. A concorrência assusta mais pela quantidade do que pela qualidade.

O que o salva: “Mostrar-lhe que ele não é um comedor de páginas de apostila, muito menos um assistidor de aulas. É um ser humano que precisa se divertir, comer, dormir, beijar, abraçar...” Conseguir a vaga na faculdade vem com a qualidade das horas de estudo e não com a quantidade.

Sim, é possível.

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