FICÇÕES BRASILEIRAS

FICÇÕES BRASILEIRAS

     Em 2005 uma estorinha de ficção juvenil balançou milhões de corações por todo planeta. Em 2008, transformada em filme, o fruto da imaginação da autora americana Stephenie Meyer, concluiu sua marcha de conquistas mentais pelo globo. Aparentemente, tamanho era o poder de sedução da obra em questão que muitos, os quais ainda não haviam tido qualquer contato com a mesma, pensavam se tratar de algo, supreendentemente, único, inigualável, magistral. Era tanto bafafá que o simples título aguçava tremenda curiosidade. Sem mencionar ainda o fato de que, nesse texto, até aqui, os verbos referentes ao “efeito social” da obra estão conjugados no tempo pretérito por mera questão cronológica, porém, sem sombra de dúvidas, do ponto de vista dos mesmos efeitos, podem ser conjugados no presente e futuro. Exagero??? De forma alguma!!! Os olhares hipnotizados e suspiros de paixão da mocinha, os músculos agressivos e devotos do lobão sem camisa e os encantamentos penetrantes, hesitantes e maliciosos do mocinho - antes das noites, mas, agora do dia inteirinho - eram suficientes para arrebatar até as cabeças pensantes. Mil análises, de psicológicas à sexológicas, foram feitas na tentativa de entender melhor o fenômeno. Mas nada interessava. E por quê? Provavelmente porque a autora conseguiu perceber um ponto fundamental sobre o público que viria a ser seu consumidor fiel: ainda que muitos rapazinhos e mocinhas paguem de bem resolvidos, independentes e prafrentex no quesito “o(a) outro(a) na minha vida”, sobra, em tantos, carência, fragilidade e medo do mundão real - condição própria das antigas donzelas em perigo e seus príncipes montados nos cavalos brancos. Pois bem...Stephenie Meyer, por sua percepção emocional, se deu muito bem no ramo da literatura ficcional. Bem como no ramo sócio-político brasileiro - realidade crua e nua - no qual outros, há décadas e, principalmente, nos últimos meses, já perceberam carências, fragilidades e medos similares de grande parte da população, e vêm se dando muito melhor em termos de dominação que a autora americana. Como???

     Não se trata de disputa territorial entre lobisomens e vampiros. Mas, de algo muito mais assustador, perverso e “chupinha” também  - em função de caráter manipulador e ultrapassado - do que a rixa entre as duas míticas espécies do terror. Entre 1789 e 1815 - período da Revolução Francesa - foram cunhados termos que iriam perseguir o imaginário humano “para sempre” - mas sem qualquer felicidade - , pois, Girondinos e Jacobinos, em razão de suas posições de assento na Assembleia, deram origem às noções políticas de “direita e esquerda”. A tal esquerda foi mais associada à uma noção de justiça social, socialização dos meios de produção e economia, progressismo...Já a direita ficou famosa por visão conservadora, tradicional, religiosa. E, durante os séculos seguintes, esses conceitos se arrastaram pelo campo histórico, formando, miseravelmente, suas verdades absolutas, ajudando a dar contornos maniqueístas para o mundo - ainda que com suas supostas derivações. Maniqueísmo facilmente percebido no Brasil dos últimos tempos. E, só como ele pode ser, “excelente” galanteador e, por isso mesmo, maldito enganador. Tem o poder de fazer sucumbir no Homem a sua concepção mais essencial: ser, antes de rótulos, humano. Desse modo, é como se ambas - ou quaisquer - orientações políticas, indubitavelmente, tivessem impresso em cada indivíduo os conceitos absolutos, como “mal” e “bem”, somente dependendo da referência de quem estiver analisando ou levantando bandeiras. O irônico é que, “quase sem querer”, as derivações já citadas (como “centro esquerda”, “centro direita”, “socialismo democrático”, “social democracia”, “socialismo cristão”, etc)  tiveram como função manter tais bandeiras erguidas, mas com tons sutilmente “diferentes” em função de ditas adaptações ideológicas, sempre em detrimento do fator humano essencial. Entretanto, possivelmente, seja mais realista entender que as referidas adaptações nada mais sejam do que “maquiagens necessárias” para tentar esconder os resquícios inevitáveis advindos dos efeitos colaterais da tentativa de opressão sobre o caráter humano, geral e comum, que grita nas sociedades, alheio às camisetas, santinhos e siglas. Nada mais esperado e natural. Afinal, interessante um socialista sendo dono de meio de produção. Ou um capitalista sem qualquer apego ao seu patrimônio, em nome de salvar vidas durante a Segunda Grande Guerra. Ou comunistas se esbaldando em luxo restrito enquanto o povão agoniza na miséria. Direita bradando por impeachment e denunciando golpe. Esquerda vociferando por impeachment e acusando golpe... Enfim, não que a essência humana iguale os indivíduos de modo a suprimir as características únicas de cada um, estabelecendo uma massa global, ideologicamente homogênea. Não! Jamais! Mas, como exposto pela Pirâmide de Maslow, o Homem - especialmente em situações extremas ou próximas delas - independente de legendas, busca satisfazer suas necessidades. E, em algum momento e circunstância, pode haver, pelos indivíduos de quaisquer carteirinhas, certa distorção e estagnação dessas e nessas necessidades, em cada nível possível, como, por exemplo, exageros de fome, sexo, abrigo, status, segurança, etc. Jacob - o descamisado, egocêntrico e povão -, rivalizar com Edward - o almofadinha que não sabe se vai, se fica, se aparece, se some, se corre ou se come -, pelo interesse e atenção da sempre ébria, pastelona e demasiada humana Bella é, para o brasileiro, atualmente, muito mais do que licença poética ou mera coincidência. Sem falar no pai de Bella, a autoridade, sempre passos atrás no (des)entendimento do que está acontecendo ao seu redor.   

    Ok. Talvez poderia admitir que a Saga Crepúsculo é obra “velha” para estabelecer analogias com o cenário sócio-político atual. Já se foram 11 anos do fenômeno Edward - Bella - Jacob, não é? Mas, não será possível tal admissão, pois, ainda mais velhos - questão de séculos - são tantos conceitos insistentemente postos (ou impostos???), sem nenhuma atualização histórica e repletos de distorções oriundas de interesses tacanhos. Interesses de gente que, de verdade, demonstra não ter nenhum compromisso com teorias políticas do passado, sejam elas quais forem. Portanto, sem haver compromissos com qualquer “happy end” para nação, até agora, tudo não passa de uma corrida alucinada entre lobões descamisados - ditos revolucionários - e vampiros engomadinhos elitizados, com único, comum e repetitivo objetivo de dominar e devorar a mocinha confusa e bocó - vulgo sociedade.

 

 

         

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