LEMBRETE A QUEM PARTIR OU CHEGAR: “ATREVA-SE A CONHECER”.

LEMBRETE A QUEM PARTIR OU CHEGAR: “ATREVA-SE A CONHECER”.

            “Informando que sexta feira, dia 09/02, às 17:30 se encerra a crise no Brasil! Retornaremos com ela na quarta-feira ao meio dia!”. Esse humorado recado viralizou nas mídias sociais, durante o carnaval, o que sugere que raros devem ser os brasileiros que não tiveram oportunidade de o ler. Obviamente, seu conteúdo beira ao pastelão, tamanho caráter absurdo de sua essência. Entretanto, de forma preocupante e, ainda mais, sinalizadora, também pode ter sido assimilado, por tantos e tantos, de forma literal, sem qualquer pontinha cômica e metafórica. O que justifica essa estranha possibilidade é a crescente inabilidade de inúmeros brasileiros em “ler e entender”, adequadamente, a respeito dos diversos contextos sócio-políticos vigentes, antes apenas do Brasil, mas, de uns tempos para cá, também de e quando em outros cantos do Mundo. Em outras e mais diretas palavras, compatriotas estão se tornando inábeis em discernir entre funcionalidade e disfuncionalidade social, devido às crescentes e graves atração e habituação à vida nonsense. Novidade??? Talvez não. Porém, o que é mais novo, e ainda mais absurdo, – embora consequência previsível da referida inabilidade – é a certeza absoluta de que está tudo bem, a ponto de se desdenhar a lógica e comprometer, em algum grau, noções de civilidade e história alheia, em nome de egocentrismo, “cegueira”, alienação e teimosia.

                Europa. Século XVIII. Pode-se dizer ser o período ápice do pensamento crítico, baseado na razão, sempre em busca de desenvolvimento, progresso e aperfeiçoamento humano, especialmente, nas esferas filosóficas, políticas, sociais e intelectuais. O Iluminismo!!! Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Talvez, uma das expressões históricas mais valorizadas e conhecidas do planeta. Sobretudo, na França, senão berço principal, certamente, meio dos mais férteis para a propagação, teórica e prática, Iluminista. Assim ainda o é e, possivelmente, será cada vez mais. O combate à ignorância, ao absolutismo (não somente como teoria política, mas, sobretudo, como sentido de vida), às desigualdades, aos privilégios de poucos, etc. Luz contra toda escuridão e, até mesmo, contra a mínima leve penumbra. Curiosamente, mas não coincidentemente, os conceitos Iluministas são opostos às ideias que fundamentam o culto à ostentação, tão modismo, lido, ouvido e vivido no Brasil – e tudo do que dele deriva. Portanto, naturalmente, o modo Iluminista de refletir e agir traz consigo determinadas consequências morais e civis agregadas. Consequências essas que só são notadas e adequadamente experimentadas por aqueles que têm em si bom grau de sensibilidade, discernimento e educação, as fomentando consciente e diretamente. Mas, tais consequências, embora não percebidas, também atingem aqueles que, por falta de oportunidade ou pura preguiça em buscar cultura e conhecimento, nem ao menos ouviram falar da mera palavra Iluminismo, ou, muito menos, sobre sua relevância histórica. Preço da ignorância: palavras, atitudes, simples gestos, etc, que não estiverem em consonância com os ideais do Iluminismo são detectados e, tanto quanto combatidos, simplesmente deslocados. Em função da palavra Igualdade, não importando a condição geral do indivíduo – magnata, jogador ou operário -, cada um será cobrado a reforçar e defender o sentido prático de Fraternidade e Liberdade.  Liberdade que já pressupõe quebra de qualquer ideia de subjugação. Fraternidade que já deixa implícito o zelo um pelo outro. Mundo, Tempo, Mundo, Tempo...Estariam os ideais Iluministas ultrapassados? Tais ideais não são produtos de marketing empresarial, mas, pedras fundamentais das construções de grandes nações. Esses ideais ecoarão eternamente na memória dos povos, os fazendo lembrar de quanto cada uma de suas conquistas, grandes e pequenas, custaram de coragem, suor e sangue. Não há pirotecnia midiática ou projeções em pontos turísticos que consigam sobressair à preceitos históricos. Sim! Casos esportivos recentes são ótimos exemplos de quanto o brasileiro médio acredita em seus absurdos e não se manca sobre a sua mentalidade, insistentemente, limitada. Não, não é culpa de fulano ou jogador A, B ou C, mas de suas manias, tão perdidas e esvaziadas de sentido e coerência. Manias socialmente aprendidas, repetidas e reforçadas por supostas e distorcidas necessidades de combate ao, convenientemente, declamado complexo de vira-latas. A previsível e empoeirada demonstração de arrogância disfarçada de autoestima. Demonstrações típicas de sujeitos sem limites, principalmente do ridículo, aspirantes à malandros heróis, à macunaímas contemporâneos. Na realidade, malandragem desmazelada, trôpega por e a cada instante no qual o disparo, com única direção possível, mira e acerta em cheio o próprio pé (alguns vivem tão entorpecidos pelo lustre de si mesmos, que só sentem as dores do ferimento muito tempo depois), complicando a caminhada salutar rumo ao desenvolvimento coletivo. John Locke, talvez, ficaria ruborizado ao constatar que sua ideia sobre aquisição de conhecimento via empirismo é posta, diariamente – do Oiapoque ao Chuí -, em xeque. Bem como Montesquieu, nos dias atuais, tenderia a ser, mediocremente, considerado o utópico do (rabo de) foguete Brasil. Ou, ainda, Rosseau, possivelmente, se tornaria mais um a ser chutado para escanteio dentro de várias legendas político-partidas (leia-se currais eleitorais). É irônico, quase cínico, que o Brasil seja o país que mais recebe radiação solar no Mundo. Afinal, os brasileiros, não raramente, se jogam e são jogados nas mais densas trevas, especialmente, filosóficas. Não por acaso, a frase infeliz de um profissional de jornalismo, após noticiar ondas de violência durante o carnaval carioca: “Não é isso que a gente quer que o turista veja.”. No Brasil, há recusa do privilégio da visão.

                Aí vai uma possibilidade que, quem sabe, talvez, um dia, quase sem querer, deve-se pensar e considerar. Ao invés de serem memorizadas, somente, musiquinhas e dancinhas “agora eh tóiss, agora éh tudo toiss...”, “eu quero tchu, eu quero tcha...”, “quando eu mandei quadradinho, mostrando o meu talento...”, etc...,  também seria importante memorizar e se familiarizar mais - especialmente, quando em outros ares que não os brasileiros - com letras tais como “Tremei, tiranos! E vós pérfidos. O opróbrio de todos os partidos...”, “Unidade e justiça e liberdade! Para a pátria alemã! Zelaremos todos para isso! Fraternamente com coração e mão! São a garantia da felicidade!...”, “E a bandeira coberta de estrelas em onda de triunfo! Sobre a terra dos livres e o lar dos bravos!...”. Significados de frases como “de um povo heroico o brado retumbante. E o sol da liberdade, em raios fúlgidos. Brilhou no céu da pátria nesse instante” podem estar se tornando cada vez mais estranhos, desconhecidos, ou démodé por quem as decoram e tentam cantar – só de vez em quando. Mas, é importante não incorrer no erro de pensar que assim acontece generalizadamente, em todo e qualquer lugar e circunstância. Do contrário, que não haja estranhamento quando nomes, seja de quem for, forem guilhotinados por revoltas, canetas e discussões.    

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