Qual cheiro está no ar?

Qual cheiro está no ar?

Assepsia. Termo que significa o processo de limpeza e higienização de algo. Indispensável e fundamental na prática de diversas atividades humanas, das mais variadas naturezas. Garantia de saúde, evitando ocorrência de doenças originadas por agentes patogênicos. Mas, quando feita inadequadamente, falível. Se falível, permite consequências danosas. Danos previsíveis e/ou não! Em graus leves, moderados ou severos, porém, sempre realidade e nocivos ao organismo que a eles são expostos. Não há outro fim. Não há outra hipótese possível. Não há surpresas. Recentemente, divulgou-se, em alguns meios de comunicação, a notícia de que um casal norte americano foi acusado de maltratar seus quatro filhos, obrigando-os a conviver com dejetos de animais e, consequentemente, viver em ambiente insalubre, tomado por moscas. Como consequências desse inegável e inaceitável abuso, a desnutrição severa e a óbvia debilidade extrema, quadro clínico das quatro crianças. Tão extrema que elas, ao serem resgatadas, somente se comunicavam por grunhidos. Desnecessário comentar o absurdo da situação em questão, porém, possivelmente, relevante considerar alguns aspectos que a tangenciam...E, lamentavelmente, não somente a ela se relacionam.

Primeiramente, a ausência absoluta de cuidados não apenas favorece, mas, literalmente, promove a criação de um ambiente, em qualquer nível, impróprio, insustentável, o qual inviabiliza qualquer mínima chance de sobrevivência (e, muito menos, de vivência) sadia. Ainda que só se perceba o fato em longo prazo. Entende-se por sadia as condições básicas para um indivíduo se desenvolver e gerar, para si mesmo e para outros de sua proximidade, prosperidade. Sendo essa última, principalmente, dos pontos de vista ideológico e comportamental. Do contrário, portanto, o que será possível, posteriormente??? Grunhir ou gemer por sofrimento! Ou seria razoável ainda esperar que pessoas, sendo usurpadas em suas condições mais básicas (em extremo, incluindo a capacidade do uso da comunicação), possam oferecer e usufruir de quaisquer mínimas vantagens oriundas do convívio social? Outro aspecto é o comportamento, por vezes, arbitrário dos seres humanos. Desconsiderando a dinâmica natural da existência e a sensatez dela advinda, seja por alienação, incapacidade cognitiva ou, até mesmo, conveniência sádica, são mantidas circunstâncias horrendas nas quais indivíduos definham, até que algo (no caso das crianças, a Justiça) os interrompa na atitude doentia e imensurável. Voltando, especificamente, ao caso norte-americano, o cessar da violência parental parece não ter sido cogitado pelos próprios, talvez pela presença e influência de um olhar caótico, que distorcia e corrompia a ideia de prazer ou necessidade. Analogamente aos regozijos de muitos, quando perpetram somente o que lhes é vantajoso, não se sensibilizando com toda a estrutura, a qual, em algum momento, sucumbe. Essa ideia soa novidade aos já infecionados ouvidos brasileiros?  O terceiro ponto (mas, talvez, não o último) é a percepção dimensional e temporal da situação. Talvez haja a consideração de que esse (tal como outros) seja caso isolado, o qual não é merecedor de análises mais detalhistas e criteriosas, no que diz respeito ao trato social nele implícito. Mais um embuste essa noção! Há contato contínuo com dejetos! E cheiram muito mal! A tal ponto que, em muitos casos, as próprias moscas não mais suportam parasitar.

Sabemos que, em muitas de nossas estruturas não são identificados elementos básicos e pré-requisitos para nossa expansão global. Somos chacoalhados pela consciência de que a recorrente arbitrariedade social não se dissipa nem quando agoniza na máxima e inviolável lei de causa e efeito. Porém, teremos, em breve, mais uma oportunidade de realizarmos significativa e oficial assepsia. Saberemos executar o procedimento? As quatro crianças, inicialmente citadas, felizmente hoje se encontram em situação mais promissora. Segundo notícias, estão em ambiente limpo, descontaminado e protegido. E nossas crianças? E nós, “crianças peraltas”? Estimularemos e propiciaremos ambiente mais promissor? Ou, mais uma vez, teremos e aceitaremos promessas de ambientes, sendo os mesmos incertos e, não raramente, já inóspitos.

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