Mau gosto

Mau gosto

Não foram as faltas cometidas em Neymar, o pênalti perdido por Lionel Messi, os gols de Cristiano Ronaldo ou a presença do árbitro de vídeo nesta Copa do Mundo de 2018 que chamaram a atenção nas redes sociais. O destaque da primeira fase da competição, para o Brasil, veio de fora dos gramados. E não foi dos melhores: o vídeo que mostra um grupo de torcedores fazendo piada de mau gosto com uma jovem russa.

Na gravação, os brasileiros gritam, em repetição, alusões ao órgão sexual feminino, junto da estrangeira. A publicação tomou proporções inesperadas pelos protagonistas, que agora sofrem as consequências de uma infantilidade que cruzou fronteiras.

Alguns dos participantes da “brincadeira” deram entrevistas e comentaram a repercussão gigantesca do caso. Um deles classificou como uma “tempestade em copo d’água”, afirmando que a jovem russa não foi obrigada a participar da piada e que o fez porque quis – inclusive, sabendo o que significam as expressões ditas.

Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas, divulgados pelo jornalista Ancelmo Gois, no jornal O Globo, em quatro dias, foram 55 mil menções ao caso no Twitter. A estatística chegou a 30 tuítes por minuto em um dos períodos analisados. E as publicações (ou, pelo menos, a esmagadora maioria delas) condenaram os brasileiros. 

Quando publicamos, nas redes sociais da Revide, a notícia de que o Ministério do Turismo condenou o comportamento dos brasileiros e classificou a atitude como misógina, recebemos o comentário de um internauta que prosseguiu na brincadeira (se é que a ação pode ser assim considerada). O usuário da rede fez menção à música cantada no vídeo.

Essa atitude nos faz repensar o real papel dos veículos de comunicação, nos tempos atuais. Será que a nossa tarefa, em uma terra virtual sem lei, é apenas informar? Será que não cabe a nós, também, contribuir com a formação dos cidadãos? Sabemos que, até agora, apenas reproduzir notícias e tentar, minimamente, oferecer conteúdo informativo aos leitores e internautas tem parecido função incompleta a nós, jornalistas. Há uma lacuna no respeito e nas relações sociais que não temos encontrado meios de preencher.

É fato que o mundo anda bem politicamente correto, o que impede certo tipo de humor antes propagado à exaustão. As piadas que faziam referências a negros, gordos, loiras, ou estereotipam qualquer ser humano, eram repetidas com frequência – e até faziam sucesso. Hoje, há quem diga que o mundo está chato, que falta “senso de humor”. 
A história dá grandes exemplos de artistas que faziam e fazem piadas sem desrespeitar uma classe, um gênero, um sexo ou tipos de corpos. Dá para ser engraçado sem invadir o espaço do outro, mas também dá para invadir o espaço do outro sem ser engraçado – e essa é uma opção que jamais deveria ser considerada. 

Imagem: Reprodução de vídeo

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