
Cidade amedrontada
Na noite de segunda-feira, dia 17 de fevereiro, um ribeirãopretano, chefe de família, foi morto dentro da própria casa no Jardim Centenário. O pintor de 39 anos foi surpreendido por uma quadrilha de assaltantes quando tentava desfrutar do mais trivial dos direitos de qualquer cidadão: ficar sentado na calçada de sua casa, conversando com a família e os vizinhos, mantendo vivo um hábito cultivado por várias gerações de moradores, um costume usual das cidades do interior.
Um clima de medo, de pânico e de horror tomou conta da cidade neste começo de ano, destruindo a sensação de tranquilidade da pacata Ribeirão Preto de outrora. Uma população aterrorizada assiste atônita às sucessivas vitórias da criminalidade, agora admitidas pelas autoridades. Mortes violentas e crimes sem punição destroem a paz e a integridade das famílias. Uma das categorias profissionais que está na linha de tiro é a dos frentistas dos postos de gasolina, profissão de altíssima periculosidade, não pelo risco da explosão dos combustíveis, mas pela desproteção diante das ações cada vez mais ousadas e rotineiras dos criminosos. Além do arsenal pesado e da truculência dos bandidos nos assaltos, as quadrilhas usam dinamite para explodir os cofres, o que pode provocar uma tragédia se o depósito de combustível for atingido. Após registrar cerca de 200 assaltos e 27 explosões de cofres e caixas eletrônicos somente neste ano, os empresários donos de postos de combustíveis de Ribeirão Preto recorreram à polícia para pedir mais segurança.
Uma reunião foi realizada na Prefeitura de Ribeirão Preto no dia seguinte à morte do pintor. A preocupação e o medo estavam estampadas nos rostos dos frentistas e dos empresários, mas o resultado do encontro não foi além do esperado. Há anos, a cidade vem perdendo a guerra contra a violência, o quadro atual é o resultado da insuficiência de investimentos durante décadas. Agora, choramos o sangue derramado. Faltam armamentos, o contingente de policiais precisaria ser maior, assim como o salário de quem tem a responsabilidade de garantir a segurança.
A sinceridade das declarações das duas autoridades policiais, presentes à reunião dos frentistas, causou espanto, mas não podem ser reprovadas. Não adianta tentar camuflar. A explosão da violência é uma verdade cruel que o cidadão precisa tomar conhecimento para não ser surpreendido na porta da própria casa. Geralmente, os responsáveis pela segurança pública minimizam o crescimento dos índices da violência, dão ênfase ao trabalho que estão desenvolvendo e argumentam que as estatísticas estão “dentro da normalidade.”
Nessa reunião com os frentistas, o diretor do Deinter 3, João Osinski, foi corajoso ao assumir que o atual aparato policial não consegue fazer frente à criminalidade. “Estamos (polícia e sociedade) no mesmo barco, e ele está afundando. Os bandidos estão organizados e nós precisamos nos unir para combatê-los”, disse Osinski ao jornal Folha Ribeirão. Na mesma linha, o comandante regional da Polícia Militar, José Roberto Malaspina, reconheceu que a violência atingiu um novo patamar, mas que a culpa não é só da Polícia. “A escalada de violência é fruto do que a sociedade plantou. Nunca a polícia prendeu tanto como hoje, mas você prende o bandido agora e amanhã ele já está solto. A sensação de impunidade é muito maior do que a de insegurança,” declarou o coronel, afirmando que a polícia não pode oferecer uma segurança especial aos postos.
De fato, a declaração do comandante regional da Polícia Militar está correta. A segurança pública não pode privilegiar os bancos, as farmácias, as residências, o centro ou a periferia. Não seria correto, por exemplo, se as viaturas policiais ficassem só circundando as padarias, os bares e os carrinhos de lanche. A estratégia de segurança precisa ser universal, uniforme, sem privilégios que levem em conta a renda do cidadão ou a nobreza do bairro. O morador da favela tem o mesmo direito à segurança que o morador da zona sul.
A presença ostensiva da polícia inibe a ação do criminoso, mas só isso não basta. A cidade tem que exigir um efetivo maior, reforçar a instalação de câmeras de monitoramento e cobrar um aprimoramento maior da investigação policial. A fama de município rico chamou a atenção da criminalidade que aqui instalou seus tentáculos. Agora, Ribeirão Preto precisa se contrapor ao mostro da violência gestado pela riqueza mal distribuída. Enquanto as autoridades não conseguem resolver o problema, o cidadão comum precisa estar consciente de que ficou desprotegido e que precisa adotar medidas para garantir a sua segurança e a da sua família.