
A arte de escrever
Recebi um convite do Colégio Marista para participar de um debate com escritores locais sobre a arte de escrever. O encontro objetivou despertar nos estudantes do Ensino Médio o gosto e o prazer pela leitura. Sempre que participo desse tipo de encontro ressalto que jornalistas não são, necessariamente, escritores, embora o jornalismo e a literatura sejam duas áreas próximas. A literatura inclusive figura entre os gêneros estudados pelo jornalismo. Nos últimos anos, jornalistas alcançaram sucesso na literatura, especialmente no segmento das biografias. Laurentino Gomes com a trilogia 1808, 1822, 1889 e o livro sobre a Escravidão se tornou um dos escritores mais aclamados do país. Um pouco antes, Fernando Morais também se notabilizou com livros-reportagens e biografias sobre “Olga”, o “Mago” (Paulo Coelho) e “Chatô, o Rei do Brasil”. Ruy Castro se destacou com obras sobre “Garrincha”, o “Anjo Pornográfico” contando a história de Nelson Rodrigues e “Chega de Saudade” abordando a Bossa Nova.
Sempre que se analisa o ato de escrever, surge o questionamento indagando se o talento literário se trata de um dom nato ou se resulta numa habilidade conquistada com muito treino? Ambas as alternativas estão corretas. Ninguém desconhece que escritores do porte de Machado de Assis, Graciliano Ramos e Jorge Amado nasceram com a famosa “veia literária” e que as suas experiências de vida apenas deram vazão a uma sensibilidade nata. Por outro lado, o próprio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) tem demonstrado com os alunos nota 1.000 que o domínio da técnica de uma boa escrita pode ser alcançado com muito treino e repetição. Depoimentos dos estudantes que produziram preciosidades literárias em curto espaço de linhas e de tempo revelam que a nota 1.000 pode ser obtida com mais de 1.000 redações.
Um dos talentos do escritor é a percepção aguçada do abstrato. O jornalismo, por natureza, está mais ligado aos fatos do cotidiano, mas a inspiração não obedece a regras, não tem hora e nem lugar marcados. Talvez a característica que mais diferencie o escritor da pessoa comum é a sensibilidade para perceber, a capacidade para ver algo diferente num lugar comum para o qual todos estão olhando. Quem é afeito às letras consegue traduzir isso em palavras. Por motivações diferentes, os jornalistas e os escritores precisam ser bons observadores para ver o novo interessante com relevância pública onde todos estão vendo uma cena corriqueira.
Na era da internet, a cada segundo, uma avalanche de publicações vem à tona. Assim, novas exigências vieram compor os ingredientes da boa escrita: a originalidade e a criatividade. Esses pré-requisitos desafiam o escritor e o jornalista que quase todos os dias sentem a angústia de olhar para a tela vazia do computador. Como ser original e criativo num mundo em que tanta coisa já foi publicada? Sobre o quê ainda falta escrever? Ainda tem algum assunto, alguma abordagem diferente sobre a qual ninguém tenha escrito?
Pois bem, a palavra para o ser humano é tão essencial quanto o ar que se respira. Só consegue escrever bem quem já leu muito. Para perceber as nuances do cotidiano se torna necessário exercitar o senso crítico com responsabilidade social para não prejudicar terceiros. Independentemente de qualquer pretensão literária ou educacional, saber se expressar corretamente virou uma necessidade, pois todas as pessoas precisam passar adiante sua mensagem com clareza e precisão, se possível obedecendo às regras da gramática. O escritor britânico Conan Doyle bem resumiu: “com a pena na mão começo a perceber que a coisa tem que ser apresentada de modo a interessar o leitor”.