
Celebridades tipo B
Às vezes, a democracia cobra um preço salgado demais. Esse sistema milenar inventado na Grécia antiga, baseado em consagrados princípios da soberania popular e da distribuição do poder, possui preceitos interessantes que mudaram a história da humanidade. Muito antes de Cristo andar pela Terra, os gregos já possuíam uma visão nobre da política, entendiam que a arte do bem comum era na verdade uma ciência superior, determinante para qualquer tipo de organização social e que, por consequência, exercia uma grande influência sobre a vida dos indivíduos.
Devido a essa sofisticada sapiência do pensamento grego, hoje, em um país democrático, qualquer cidadão tem o direito de ser candidato. Na liberal democracia brasileira, o sujeito pode até ser acusado de homicídio ou de crime hediondo que mesmo assim terá sacramentado o direito de concorrer.
Quando alguém com currículo vil resolve ser candidato, não há nada que se possa fazer, a não ser lamentar e aguardar pelo julgamento das urnas. Isso explica a última cartada daqueles que já foram famosos no passado, mas que agora, longe dos holofotes, deslizam celeremente para o limbo do anonimato e do esquecimento.
Nas próximas eleições, essas celebridades tipo B, que não querem cair para a segunda divisão da mídia dos fuxicos, tentarão desesperadamente transformar em votos o restinho de fama que ainda possuem. Muitos não têm escrúpulos para assumir que não possuem proposta alguma ou que adotarão como estratégia os planos esdrúxulos ou as propostas estapafúrdias.
Os incontáveis fãs do BBB certamente lembrarão da simplória figura do Kleber Bambam, aquele ex-BBB que agora é pré-candidato a deputado estadual pelo PTB de São Paulo. Em uma entrevista para um site de "celebridades", o "brother" reconheceu que não é muito afeito à política e que pretende fazer um curso "fast food" para deixar de ser um neófito nessa arte.
Outra candidata cujos atributos podem empolgar uma parcela do eleitorado é a "Mulher Melão", candidata a deputada estadual pelo Partido Humanista da Solidariedade (PHS). Coincidentemente, a Melão também não tem plano de campanha, mas comentou dia desses que possui "seios grandes e sabe da importância dos exames preventivos do câncer de mama." Que o destino tenha compaixão e poupe a nação do infortúnio!
Se a torcida do Corinthians for tão fiel como dizem, Marcelinho e Vampeta podem ficar tranquilos. Pré-candidato a deputado federal pelo PTB, Vampeta sempre foi bem mais autêntico que Marcelinho e assume que não tem plano nenhum. "Seus amigos se encarregarão das propostas de trabalho." Já Marcelinho, pré-candidato a deputado federal pelo PSB, garante que tem um projeto de atuação "que só vai revelar depois que for eleito." No ano do centenário do Corinthians, a expectativa é que o "pé de anjo" tenha mais de 300 mil votos.
Não se trata de invocar hoje a pureza do pensamento de Sócrates, Platão e Aristóteles para definir critérios ilibados para a escolha dos representantes da democracia, mas o mínimo que cada eleitor deve fazer é ficar atento. Em cada estado, em cada cidade, desfilarão candidatos sem uma história de vida ligada à questão política ou aos problemas sociais. Se isso não for observado, corremos o sério risco de eleger um punhado de celebridades que desconhecem o sentido da representação política tão bem pensada por nossos ancestrais gregos.