
Celeiro de conflitos
Em 2015, sufocada por problemas de gestão financeira, a atual administração municipal adotou uma espécie de tática do “vai ou racha”, atropelando instâncias, discussões e debates em função da pressa. Quase ao final do terceiro ano, a gestão atual se encaminha para o crepúsculo, ansiosa para deixar um legado de obras que legitime a sua passagem. Isso tem provocado alguns atropelos e desgastes que poderiam ser evitados em nome dos interesses maiores da cidade. O caso mais corriqueiro fica evidenciado no descabido reajuste de 200% no valor da área azul. Qualquer pessoa de bom senso reconhece que o estacionamento rotativo ao preço de R$ 1,00, sem reajuste desde 1998, poderia sofrer uma correção. Os próprios comerciantes admitiam essa situação e entendiam que um aumento para até R$ 2,00, no máximo, seria tolerável, apesar da grave crise econômica que afeta o país e corrói o poder aquisitivo da sociedade. Inexplicavelmente, numa descabida demonstração de falta de percepção administrativa, a Prefeitura de Ribeirão Preto aplicou um índice exorbitante, que gerou uma demanda desnecessária e intempestiva para o Judiciário, já sobrecarregado com questões bem mais prementes. De forma correta, a juíza que julgou a ação popular e rejeitou o aumento explicou na sentença que a área azul objetiva proporcionar a rotatividade de vagas e não gerar arrecadação, mesmo que os cofres municipais estejam em situação de penúria. Com certeza, até mesmo os mentores da extemporânea proposta devem ter entendido a simplicidade dessa decisão.
Outra polêmica que a atual administração tem se esforçado muito para manter em fogo alto gira em torno da controversa construção de um terminal em frente à Catedral de São Sebastião. Sobram argumentos dos dois lados entre os que querem a preservação do maior patrimônio histórico da cidade e os que defendem a construção do terminal na Praça das Bandeiras para melhorar a mobilidade urbana. Uma guerra de laudos se instalou e à medida que o tempo passa o nível da discussão desce um pouco mais. Agora, o conflito já chegou à fase das meias verdades e até do arrepio da lei. Sem a autorização integral e definitiva do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), a Prefeitura anunciou que pretende prosseguir com a construção do terminal, embora isso signifique bater de frente com a igreja católica, uma das mais poderosas instituições do país. Mesmo que a atual administração vença essa batalha jurídica, “essa vitória” terá o custo de um enorme desgaste para uma administração cuja popularidade está em baixa.
O governo municipal está prestes a encerrar a longa e desgastante novela do calçadão, que tanto prejuízo deu aos comerciantes do centro. Pelo que se viu até agora, a reforma não ficará um primor que justifique uma demora de três anos. Quando essa polêmica finalmente se encaminha para o encerramento, a administração abriu outra frente de batalha, desta vez com o Ministério Público, a Justiça e as mães dos estudantes da rede pública municipal e estadual.
A despeito da complicada situação financeira da Prefeitura, em que quase todo dia tem um hospital cobrando repasses atrasados, a administração insiste na realização dos Jogos Abertos do Interior em um momento extremamente desfavorável da economia local, regional e nacional. A crise está estampada nos meios de comunicação, mas a Prefeitura teima em gastar R$ 240 mil para a realização do evento. Ribeirão Preto só herdou os Jogos do Interior porque a rica São José dos Campos desistiu da realização, alegando, justamente, problemas financeiros.
Além da falta de tempo para reformar os locais das provas, os alunos das creches e das escolas municipais e estaduais ficariam quase duas semanas sem aula para que os 20 mil atletas fossem alojados nas escolas. Ninguém contesta os benefícios do esporte e o possível retorno financeiro que a presença de visitantes pode trazer, mas todo mundo sabe que a reposição de aulas após as greves e outras interrupções não são feitas com muito esmero. Mais uma vez acertou o Judiciário em levar em conta o interesse maior da educação e proibir a realização dos jogos. Essa decisão está sub judice, mas bem que a atual administração deveria se inspirar no equilíbrio da Justiça para que o bom senso volte a ser um ingrediente obrigatório dos projetos e das propostas.