
Compulsão tecnológica
Em um canto da sala, um filho se distrai com o video game. Sentado no sofá, o outro está em um mundo à parte, completamente absorvido pelos encantos do tablet. No quarto, a filha passa horas no computador mandando mensagens pelo facebook, enquanto em outros cômodos o casal se distrai, cada um com uma TV, assistindo aos “instrutivos” programas que passam no horário nobre. Parece a cena de um filme surreal, mas a descrição acima, do estado de agonia do diálogo, está muito próxima do cotidiano da família brasileira. Aos poucos, a calorosa e fraternal convivência entre parentes, amigos e vizinhos está indo para o espaço.
Isso ocorre porque os significados dos verbos compartilhar e confraternizar andam esquecidos. Em uma visão mais pessimista, talvez já tenham sido irremediavelmente deletados. A humanidade sobreviveu durante quase dois mil anos sem a infinidade de aparelhos eletrônicos da vida moderna que, muitas vezes, nas mãos de usuáriuos incautos servem para conectar o nada a lugar algum. No entanto, algumas pessoas ficam com as mãos trêmulas se não estiverem plugadas minuto a minuto.Essa reclusão tecnológica espontânea tomou conta dos ambientes sociais em detrimento do convívio fraterno, do tête-à-tête que por centenas de anos foi a base do conhecimento e da evolução da espécie humana. A boa conversa está sendo substituída pela solidão dos artefatos eletrônicos.
Em um ritmo cada vez mais acelerado exacerbou-se a necessidade de ficar conectado à algo por mais absurdo que ele seja. Esse fenômeno da perda da relevância do conteúdo atingiu o ápice, recentemente, quando alguém plantou na internet uma bobagem qualquer a respeito do paradeiro de uma tal Luiza, que diga-se de passagem não moveu uma palha para se transformar em um “fenômeno midiático”. Imediatamente, milhões de pessoas no Brasil inteiro passaram a replicar automaticamente aquele despautério, dando ao fato uma importância que ele não tinha. Difícil encontrar alguma consistência nos assuntos mais comentados das redes sociais. Disparates como esse somem com a mesma velocidade com que aparecem, mas deixam para trás as marcas de um mundo que vai ficando cada vez mais fútil, mais volúvel e mais descartável.
O que há de mais fantástico na vida moderna em relação aos tempos de outrora são as múltiplas opções de escolha. Contudo, essa vantagem pode esfacelar a noção da hierarquia dos valores. Dizem os especialistas que quem divide, vive mais. Compartilhar significa tomar parte, confraternizar implica em conviver com camaradagem e interagir com quem ocupa o mesmo espaço, principalmente se os entes mais próximos forem os familiares. No meio deste mar cibernético de frivolidades está surgindo uma geração de criaturas ensimesmadas que passa a maior parte do tempo circunspecta ao próprio umbigo. Gente que não sabe conversar, insociável, sem capacidade de tolerância e que desconhece o prazer das experiências coletivas. São pós-graduados na individualidade com sérias dificuldades para refletir sobre si mesmo e sobre os outros. Estão virando reféns dessa terrível compulsão tecnológica.