
As decepções de Marta e Simon
A política começou o ano com duas boas entrevistas, ambas publicadas no domingo (11.04.2015). Petista com carteirinha assinada há muito tempo, a senadora Marta Suplicy deu uma entrevista bombástica ao Estadão. A outra análise conjuntural partiu do octogenário senador gaúcho, Pedro Simon, que no crepúsculo da atividade parlamentar, aos 84 anos, foi ouvido pela Veja. As duas entrevistas possuem peso político adicional, porque os entrevistados conhecem e participam dos meandros do poder e mesmo que tenham razões políticas fizeram revelações interessantes que ajudam a compreender a grave crise política, econômica e institucional que o país está enfrentando.
Durante muitos anos, Marta Suplicy fez parte do núcleo petista e agora, sentindo-se preterida pelo partido que ajudou a fundar, resolveu contar um pouco do que sabe. Com um sapato fino, provavelmente um Louboutin, Marta literalmente chutou o balde. Esperta, estrategicamente, posicionou-se ao lado de Lula, o político mais influente do país, e na oposição à presidente Dilma Rousseff e ao Ministro da Casa Civil, Aloísio Mercadante. Marta chamou o presidente do partido, Rui Falcão, de traidor e Aloísio Mercadante de inimigo de Lula. Segundo a senadora, Mercadante já ligou o trator para tentar ser o sucessor de Dilma Rousseff, será candidatíssimo em 2018, mas “terá contra si a arrogância e o autoritarismo”. As disputas internas no PT e em outros partidos, quando o poder graúdo está em jogo, costumam ser antropofágicas. O próprio Partido dos Trabalhadores viveu essa experiência, recentemente, com o ex-ministro José Dirceu, derrubado por conta das denúncias do Mensalão.
De saída do PT para disputar a próxima eleição municipal, a senadora disparou para todos os lados. Desde que Dilma Rousseff assumiu a presidência, a mídia especula sobre os enfrentamentos entre a presidente e o ex. Até então ninguém de dentro do círculo do poder havia confirmado publicamente o embate interno. Marta deixou claro que, em 2014, o ex-presidente autorizou o “Volta Lula” e que só desistiu da movimentação diante do confronto iminente que seria desastroso para as pretensões eleitorais do partido. “Estou conversando com ela, mas não adianta, ela não ouve”, teria dito Lula sobre Dilma em um jantar organizado por Marta.
De acordo com a senadora, nas rodinhas com empresários, Lula fazia coro com as reclamações contra a política econômica e também “decepava” a presidente. Na parte mais engraçada da entrevista, Marta apresenta as razões pelas quais teria sido preterida pelo partido nas disputas para a Prefeitura de São Paulo e para o governo do Estado. “Sempre achei que acabaria ficando meio de fora das coisas, talvez pela origem, talvez por ser loura de olho azul, não sei”, disse a senadora. Estarrecida com as notícias de desvios de dinheiro público na Petrobras, disse que “ou o PT muda ou acaba”. A verve da senadora ainda produziu mais estragos. Na saída, Marta ainda entregou a Controladoria Geral da União documentos que comprovam irregularidades cometidas por Juca Ferreira, seu companheiro de partido, desafeto declarado e antecessor no Ministério da Cultura, que agora reassumiu o cargo.
Na outra entrevista, publicada pela revista Veja, as críticas contra o descalabro atual partiram do senador gaúcho, Pedro Simon, que do alto dos seus 60 anos de vida pública, encaminha a aposentadoria estarrecido com o que classificou de “um dos maiores escândalos de corrupção do mundo.” Desde que ingressou na vida pública, Simon nunca ficou um único dia sem mandato. Assistiu ao começo e ao término de vários governos e considera melancólico o final do primeiro mandato de Dilma Rousseff e o começo deste. “É muita desgraça. A presidente acaba de ser eleita e a impressão é a de que não tem comando”. Para o senador, o ex-presidente Lula foi a maior decepção de toda a sua carreira política por ter permitido o mensalão e o petrolão. “Se não tivéssemos tudo isso, se tivéssemos feito um governo austero, o Brasil hoje seria diferente, muito melhor”, declarou Simon.
Com a autoridade de quem ficou 32 anos no Senado, Simon adverte que o país não pode esperar por nenhuma iniciativa do Congresso Nacional definido por ele como um ajuntamento de corporações, sindicatos, empreiteiras e de empresas multinacionais. “Ninguém ali fala pelo povo. Se deixar tudo calmo, não fazem nada, ou só fazem coisas de interesse de determinados grupos”, observou o político gaúcho. Convicto, o senador afirma que só haverá mudança se o povo voltar às ruas para pressionar o Congresso Nacional, pois foram as mobilizações que provocaram as últimas principais mudanças políticas do país: o fim da ditadura militar, a cassação do ex-presidente Fernando Collor e o julgamento do mensalão. O desfecho do petrolão ainda está por ser escrito.