
Entre Mendoza e Ribeirão Preto
Entre similaridades e vicissitudes, a grande Mendoza (cerca de 800 mil habitantes) na Argentina e Ribeirão Preto ( 605 mil habitantes) permitem comparações para o turista despretensioso que mora em uma e visita a outra por conta própria, sem compromisso com o turismo oficial. Mendoza, no norte da Argentina, nas barbas da Cordilheira dos Andes, foi erguida no meio de um deserto, um lugar onde de dia faz um calor escaldante e de noite um frio de rachar. No inverno, as temperaturas caem abaixo de zero. Como não foi privilegiada pela natureza com a abundante oferta de água do Aquífero Guarani, a população da cidade economiza a água represada em um dique. A neve que derrete nas montanhas é a única fonte de abastecimento para a população e para a produção agrícola. A chuva é um fenômeno raro, menos de 300 mm por ano. Os argentinos de Mendoza costumam brincar que a chuva é algo tão excepcional que quando aparece alguma nuvem, eles pegam as máquinas fotográficas e aproveitam “para sacar una foto”.
Com o aquecimento global, o volume de neve está diminuindo na Cordilheira e, talvez por isso, em Mendoza não se vê ninguém lavando calçadas compulsivamente. Esta semana, a imprensa de Ribeirão Preto divulgou que o reservatório de água do Daerp, no bairro Alexandre Balbo, na zona norte, tem pelo menos 10 furos e a água vaza constantemente há pelo menos cinco anos. As fotos mostravam um reservatório que mais parecia uma cascata com o doloroso chuá do desperdício.
Depois de 155 anos de fundação, os moradores de Ribeirão Preto convivem com um calor infernal, segundo os especialistas, fruto do enorme passivo verde que as sucessivas administrações municipais não conseguiram resolver, desde o início dos anos 90, época em que a questão ambiental ganhou prioridade no cenário mundial com a Eco-92.
Previdentes, quando fundaram Mendoza, os pioneiros projetaram estrategicamente uma cidade com várias praças devidamente arborizadas que até hoje são regadas diariamente para que a vegetação esteja sempre verde e com aspecto de dar inveja. Difícil encontrar uma rua nessa metrópole dos vizinhos que não esteja arborizada. No centro da cidade, o céu tem a cor verde e pelo lado das calçadas correm pequenos canais que fazem a irrigação das árvores.
A cidade ainda tem mais alguns atrativos bem interessantes que chamam a atenção de quem chega de fora. Com mais de 1.000 vinícolas espalhadas pelas redondezas, a região responde por 70% da produção de vinhos da Argentina, que diga-se de passagem são de excelente qualidade, principalmente os do varietal malbec. Que os “hermanos” não leiam, mas o churrasco argentino corre parelho com o gaúcho. A macia carne do bife de chorizo vem acompanhada de verduras grelhadas no fogo: cebola, batata, beterraba, abóbora e “otras cositas más”. A entrada pode ser a caseira “empanada”, um pastel de carne moída assado em forno de pizza. Cada iguaria sempre vem acompanhada da variedade de vinho mais apropriada. De sobremesa, o tradicional “flan”, um pudim que vai bem com “dulce de leche”. Dependendo do lugar, tudo isso pode ser degustado com uma deslumbrante vista da imponente Cordilheira dos Andes, uma gigantesca cadeia de montanhas com 8.000 km de extensão, uma obra de arte que a natureza demorou milhões de anos para esculpir.