
As lições da tragédia
O país ainda não tinha se recuperado do massacre ocorrido na escola Professor Raul Brasil em Suzano quando Ribeirão Preto acordou sobressaltada, na segunda-feira 18/03, por uma ameaça em uma escola tradicional dos Campos Elíseos. Através de mensagem na rede social, um adolescente de 16 anos ameaçou promover uma matança indiscriminada na Escola Técnica Estadual José Martimiano da Silva (ETEC). A veiculação assustadora ocorreu na noite anterior (domingo, 17/03). O menor dizia possuir cartucheira, pistola e faca. Digna de elogio foi a pronta reação do professor que não menosprezou o fato ao ver o post em um grupo das redes sociais. De acordo com o boletim de ocorrência, o professor avisou a direção da escola que chamou a polícia. Na casa do adolescente, em Sertãozinho, foram encontradas caixa vazia de simulacro de armas, roupas e touca camufladas. O adolescente declarou que tudo não passava de uma “brincadeira”.
Na mesma data, situação semelhante a que ocorreu em Ribeirão Preto aconteceu em Brasília em uma escola do Plano Piloto. Via rede social, quatro alunos do Centro Educacional Gisno, três menores e um maior de idade, ensaiavam uma “competiçãozinha para ver quem mata mais”. Um deles dizia aceitar “fazer parte da linha de frente no massacre”, e outro detalhava como o atentado deveria ser executado. Por medida de precaução, as aulas foram suspensas e os estudantes responderão por ameaça e incitação ao crime. “Pelas janelas de trás, lançar bombas de gás lacrimogênio nas três primeiras salas, e efetuar disparos com revólver nas últimas a fim de colocar todos para correr. Depois dar a volta… eliminando todos que for possível, que estarão trancados por conta do portão”, descrevia uma das assustadoras mensagens que circulou pelas redes sociais.
O fato de as ameaças não terem se consumado não diminui a gravidade das postagens. Jovens adolescentes dentro de uma escola revelam um enorme desprezo pela vida humana relegada ao mesmo nível de um objeto qualquer. A tragédia de Suzano provocou grande repercussão. Informalmente, professores comentam que alguns estudantes consideraram os assassinatos na escola como um fato “da hora”. Nos últimos tempos, pela sucessão de acontecimentos, a cultura da violência se fortaleceu como uma erva daninha que se espalha por todos os cantos. As reações são desproporcionais aos fatos. Por um motivo banal, alguém pode ser morto a tiros ou espancado até a morte. Em depoimento à Polícia, um dos estudantes de Brasília elogiou a matança de Suzano. O episódio não pode ser esquecido e deve servir como ponto de partida para uma profunda reflexão dos pais, alunos, professores e todos os envolvidos no processo de ensino.
Há que se buscar as razões para tamanha irracionalidade sem paixões, ódios ou a necessidade de encontrar culpados ou razões únicas para explicar acontecimentos tão traumáticos. A mesma prudência se recomenda quando se envereda pelas subjetividades da natureza humana para se encontrar os motivos, as explicações e as causas para tamanha barbárie. O certo é que a partir da tragédia de Suzano todos os envolvidos no processo educacional têm agora uma preocupação a mais: evitar que um novo massacre se repita. Não há dúvidas de que a dimensão do fato deixa como herança nefasta uma motivação potencial, um barril de pólvora que pode ser acionado em qualquer momento, em local incerto e não sabido.
Em parte, a grande maioria desses desatinos se explica por problemas de saúde mental de homicidas e de suicidas. Em outros casos, alunos que sentem excluídos ou violentados pelo bulling reagem de forma violenta. Não se pode vincular diretamente qualquer ato de violência aos jogos de videogame, porém, esses jogos estimulam, são fontes de inspiração e ajudam a consolidar essa cultura da violência. Quem observa essa linha do tempo, constata que os episódios violentos são cada vez mais frequentes e devastadores. Grupos nazistas, de extermínio, racistas e organizações terroristas encontram adeptos com certa facilidade, principalmente na internet. Sozinha, não há política pública que enfrente essa onda. Trata-se de uma questão cultural que precisa ser combatida na família e nas escolas. Pais e professores precisam fortalecer o diálogo e ficar atentos aos comportamentos dos filhos e dos alunos