A longevidade das gerações

A longevidade das gerações

Nunca se falou tanto sobre a velhice, quer dizer, a terceira idade. A primeira mudança está justamente no eufemismo que ficou consagrado para definir a fase da vida de quem passa dos 50 ou dos 60 anos. Também não há consenso sobre quando começa efetivamente o derradeiro período. Antigamente, quem passava dos 50 anos era considerado um velho e ponto final. Carta fora do baralho. Para alguns, passava a ser merecedor de um obsequioso respeito pelo conhecimento acumulado e as experiências vividas. De outros, entretanto, recebia um tratamento desdenhoso, pois tinha ficado senil, fora de moda e não entendia mais nada do novo mundo que surgia. 

A questão semântica até pode ser secundária, o que vale mesmo são as condições reais que um país possui para cuidar com a população idosa. No Brasil, nada foi feito nesse sentido. Na proporção em que idosos forem chegando, vamos ver como é que fica, mas à medida que o tempo passou os anciãos foram se impondo em quantidade, em longevidade e em desempenho. A inversão da pirâmide etária se apresenta como um fenômeno novo, atípico no Brasil e no mundo, sem precedente na história da humanidade. O Japão é uma das raras exceções. Daqui para frente, a geração dos cabelos grisalhos será protagonista de uma extensa lista de atividades. Em Ribeirão Preto, por exemplo, nada menos do que 1/3 da população será composta por pessoas com mais de 60 anos em 2050. 

Amparada pela divulgação de informações sobre saúde, nos avanços da medicina e na mudança de hábitos, a expectativa de vida dos brasileiros veio aumentando desde os anos 60 e em 2018 chegou à expressiva marca dos 76 anos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As atividades físicas rotineiras foram fundamentais para o alcance desse resultado. Aliás, nas corridas de ruas dá para ver jovens com a língua de fora, enquanto os sessentões sobem a rampa sem precisar trocar de marcha.

Inclusive essa sólida construção da longevidade está na raiz do maior problema nacional: a Previdência Social. A demora em mudar a legislação permitiu que uma geração, em pleno vigor físico, se aposentasse precocemente, já a partir dos 50 anos. A despeito de outros problemas — corrupção, sonegação, disparidade entre funcionários públicos e trabalhadores da iniciativa privada e os privilégios de alguns setores que aposentam com os vencimentos integrais — a reforma se faz necessária para que o país possa se enquadrar a nova realidade de uma população com vida mais longeva. O potencial desse público consumidor já chamou a atenção das empresas. Uma nova denominação surgiu, “o mercado do cabelo grisalho”, pois parte desse público acumulou economias, tem mais tempo para curtir a vida e possui necessidades especiais de saúde, por exemplo, que criam novos nichos de oportunidades de negócios. 

Contudo, há uma face sombria nessa realidade emergente. Se é verdade que uma parte dessa população idosa chega a surpreender pelo vigor físico e pelo poder aquisitivo, há outra parcela que alcançou a terceira fase com problemas físicos e de saúde. Sem recursos financeiros ou com uma aposentadoria minguada, essa faixa etária descobriu às duras penas que a velhice é um estágio oneroso e inclemente da vida. Muitos idosos que alcançaram a longevidade sem qualidade de vida, por descuido ou fatalidade, perderam a autonomia pelo caminho e se tornaram dependentes financeiramente e para execução das atividades cotidianas. O Brasil de hoje não tem estrutura e não está preparado para lidar com “dependentes” que custam caro, tomam tempo e requerem uma atenção especial.

As famílias também foram surpreendidas por parentes com problemas crônicos de saúde, incapacidade física e demência mental. Essa nova realidade tem gerado muita controvérsia e desagregação familiar, pois os idosos do século XXI são os pioneiros da longevidade. Além das preocupações econômicas, sociais e familiares, a Medicina dá um importante conselho para enfrentar a trilogia, longevidade,  qualidade de vida e a própria morte em última instância. A velhice saudável depende muito de  um investimento precoce que precisa ser sustentado em todas as fases da vida. 

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