Mensagem silenciosa

Mensagem silenciosa

Talvez seja o filme a melhor metáfora para tentar explicar as indecifráveis dimensões da vida. Nessa junção entre o real e o imaginário, os sonhos inspiram os planos e as palavras esculpidas com esmero vão tecendo, lentamente, essa película que um dia chegará ao seu final. Livros e filmes famosos retratam esses dois mundos na forma de uma viagem. É como se a cada dia houvesse um trem parado na porta da sua estação, à espera de uma decisão corajosa, de um começo, de um embarque rumo a um destino desconhecido. Nesta época de cartões, de festividades e de lembranças, um ano solta a fumaça da chegada e o outro apita para avisar a partida.

De súbito, os pensamentos vão se aglomerando para o embarque. Cada vagão vai ficando carregado com aquelas lembranças vivas ou as que foram ficando esquecidas, ofuscadas pela passagem do tempo. Nesse conhecido vaivém do trem, o passado se mistura com o presente, fatos inesperados atropelam os sonhos e a nostalgia enfrenta a ânsia do que ainda está por ser feito. Seriam as circunstâncias as grandes regentes da vida?

O trem segue impávido, às vezes para, mas logo recomeça a andar novamente. Nessa mesma sincronia, a vida se transforma num esforço diário em que o maquinista tenta pilotar o próprio destino, mas, entre uma balançada e outra, o rumo vira obra do acaso. Entre milhões de possibilidades, a vida nasce do ocasional encontro de um óvulo com um espertozóide. A esse, seguem-se outros milhões de encontros e de desencontros. Nessa viagem, quem olha para trás, pela janela do trem, frequentemente, costuma se perguntar se faria algo diferente, se tomaria um novo rumo caso tivesse a chance de retornar a algumas das estações do passado. Quem aspira por mudanças, costuma pensar nas grandes decisões, nas atitudes mais radicais que tomou, mas os momentos mais revolucionários, as horas da vida que realmente fizeram a diferença não foram feitas na base do improviso e de atos repentinos. Foram decisões pensadas, muito discretas, silenciosas e, às vezes, mudas. Foram as horas em que o silêncio falou mais alto.

Os grandes personagens do mundo eram pacientes e silenciosos por natureza. Mahatma Gandhi, o Dalai Lama, Nelson Mandela e Charles Chaplin eram sonhadores destemidos, gente com coragem suficiente para embarcar no trem sem o medo do encontro com o destino. Chaplin entrou para a história porque a simplicidade do seu personagem contrastava com a ambição sem limite dos seus sonhos. Mesmo sendo pioneiro do cinema mudo, conseguiu ficar mundialmente conhecido. Em uma época em que guerras sanguinárias faziam muito barulho, transformou a mímica numa arma poderosa e fez milhões de pessoas sorrirem sem dizer uma única palavra. A genialidade de Chaplin reside na sutil nobreza do silêncio.

Pode até parecer um contrassenso, muito difícil de acreditar, mas para encontrar um futuro promissor há que se fazer uma viagem de volta. Algumas das particulares e das explicações mais importantes da vida estão estacionadas em algum lugar do passado. Não existe ausência completa, pois mesmo quem parte continua presente na vida de outras pessoas. Independentemente da vontade própria, uma parte de nós sempre permanece, sobrevive em alguém, mesmo que no meio haja uma enorme distância. Algo que “Traduzir-se” do imortal Ferreira Gullar poetiza muito bem.

Na verdade, naquela viagem para um lugar muito distante, estamos indo ao nosso próprio encontro, mesmo que seja na mais efêmera de todas as voltas. É justamente por isso que as melhores viagens são as solitárias. O Natal e o Ano Novo são especiais por isso. Abrem um tempo para permitir a caminhada ou o regresso, um espaço para um encontro, para rever e relembrar de alguém que estava distante. Que neste final de ano, a tua silenciosa viagem te projete para novas realizações em 2015. 

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