
Não passarão
O Brasil encerrou 2015 de forma melancólica. Em uma época do ano em que todo mundo faz um esforço para levantar o astral, o bombardeio intenso do noticiário ruim provocou uma sensação de desalento no cidadão comum, que cansou de ouvir as notícias de corrupção. O ano que ora termina também ficou marcado pela triste constatação de que os principais representantes da República estão direta ou indiretamente envolvidos com a corrupção. A presidente, Dilma Rousseff fecha o ano com a economia em frangalhos e respondendo a um processo de impeachment. O terceiro na hierarquia republicana, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, está envolvido em gravíssimas acusações de corrupção, já teve seu nome citado por delatores da lava-jato e foi alvo de uma operação da Polícia Federal. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido de afastamento cautelar do presidente Cunha do cargo de deputado federal e de presidente. Por conta do inoportuno recesso do STF, esse pedido só dever ser julgado em fevereiro quando termina as férias do Judiciário. Até lá, Eduardo Cunha, o grande beneficiado dessa paralisação, segue fazendo das suas. Vai virar o ano como presidente da Câmara dos Deputados, usando todas as artimanhas para brecar o processo em que é réu.
Com a pauta tão carregada e o país mergulhado em uma grave crise institucional, um aspecto negativo foi a manutenção do recesso do STF, que só retornará as atividades em fevereiro. No Brasil, as prioridades sempre são corporativas, nunca de interesse público. Até o Carnaval passar, sabe-se lá o que acontecerá com o país. O que muitos já sabem é que no Senado a situação não difere muito da Câmara dos Deputados. O presidente do Senado, Renan Calheiros, também foi denunciado na operação da lava-jato e logo, logo será arrastado para esse turbilhão. O cidadão que acompanha o passo-a-passo do impeachment sente calafrios quando pensa que caso ocorra o impedimento de Dilma Rousseff, o partido que deve assumir o poder é o PMDB de Cunha, Calheiros, Jader barbalho e do Sarney.
As más notícias da política contaminaram ou minaram a economia. No apagar das luzes, a agência de classificação de risco Fitch rebaixou o grau de investimento do Brasil, decisão que já havia sido tomada por outra agência, a Standart & Poor´s. O atual governo costuma dar de ombros sobre essa questão, mas qualquer leigo sabe que em um mundo globalizado como o atual, nenhuma economia sobrevive sem investimentos externos, ainda mais o Brasil cujas finanças estão exauridas e o governo está sem capacidade de investir na infraestrutura ou na geração de empregos. O crédito para o governo e para as empresas ficará mais caro e isso, no final das contas, representará custos maiores.
Todas essas notícias ruins do ano que está terminando talvez pouco representem perto da tragédia de Mariana. Além dos prejuízos ambientais, que certamente nunca serão recuperados, e das mortes, centenas de famílias perderam tudo. Assim como ocorreu no incêndio da Boate Kiss em Santa Maria, as tragédias brasileiras revelam que a ganância e o lucro a qualquer preço se sobrepõem à segurança de vidas humanas.
No meio de todo esse desalento no ano que passou, as declarações de dois brasileiros genuínos comoveram o país. Numa cerimônia olímpica, o ex-tenista Gustavo Kuerten fez um apelo emocionado que até soa como ingenuidade em um país que possui um nível de governabilidade tão baixo. Guga conclamou os “governantes a se espelharem nos atletas para serem justos, honestos e brasileiros de verdade.” Em um discurso bem mais contundente, talvez o mais importante e significativo do ano, realizado na sessão que discutia a prisão do senador Delcídio do Amaral (PT), a ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmen Lúcia, mandou um recado aos navegantes dos mares da corrupção. “Criminosos não passarão sobre o Supremo”. Para que 2016 seja melhor, o Brasil espera que o discurso da ministra Carmen Lúcia se transforme numa vigorosa profecia. Boas Festas!