A Normandia do PMDB

A Normandia do PMDB

Em vez de saída, retirada ou abandono, a imprensa e a opinião pública optaram por chamar a evaporada que o PMDB deu no governo da presidente Dilma Rousseff de “desembarque”. Na história mundial, essa expressão remete ao famoso “Dia D”. O 6 de junho de 1944 marca o desembarque das forças aliadas no litoral da Normandia para salvar a humanidade da ameaça nazista. Se as tropas americanas e do Reino Unido não tivessem sido bem-sucedidas nessa batalha, a história da humanidade certamente seria bem diferente. O que acontecerá com o Brasil se o impeachment não for aprovado?

Guardadas as devidas proporções, a saída do PMDB do governo, no dia 29 de março de 2016, também é um fato que entra para a história, embora o ato liderado pelo vice-presidente, Michel Temer, não seja revestido de tanta nobreza como foi o desembarque dos alidados. A retirada está diretamente relacionada à percepção óbvia que o partido teve que o barco governista está afundando rapidamente. A sigla, que esteve durante 13 anos no poder, ocupando inclusive a vice-presidência, decidiu a debandada em singelos três minutos. Quem presidiu a sessão foi o senador Homero Jucá, um líder governista por várias temporadas. Na foto da reunião, aparece um Eduardo Cunha sorridente com o rompimento, embora o presidente da Câmara dos Deputados não tenha tantos motivos para sorrir. Deve ser o próximo da lista a sofrer um processo de cassação. Os ocupantes dos ministérios e dos cargos de confiança terão mais alguns dias para limpar as gavetas, até 12 de abril. O ministro do PMDB, da Aviação Civil, Mauro Lopes, avacalhou um pouco mais o processo. Primeiro, contrariou uma decisão do Partido e entrou para o governo. Depois, antecipou-se à deliberação do PMDB e resolveu sair dizendo que “queria mesmo ser ministro de Estado, nem que fosse por uma semana”. Quem frequentemente ou esporadicamente anda de avião no país tem motivos de sobra para ficar de cabelo em pé. A aviação civil lida com milhões de vidas e não merece tamanho descaso.

Num passado distante, o PMDB teve um papel importante na história brasileira, período que coincide com a sua fundação, em 1966. Naquela época, capitaneou a resistência ao regime militar com lideranças expressivas, como Freitas Nobre, Jarbas Vasconcelos, Miguel Arraes, Pedro Simon e o próprio Ulysses Guimarães. Depois disso, virou um conglomerado de interesses regionais dividido entre ser governo e oposição. Transformou-se no mais fisiológico dos partidos.

De certa forma, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro, que possui as maiores bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, sinteza o que rege a política brasileira, predominantemente determinada por interesses circunstanciais. O tratamento discriminatório e subalterno que a presidente Dilma Rousseff deu ao seu maior aliado foi determinante para rompimento do PMDB. Isso ficou evidenciado na carta em que Michel Temer profetizou a saída do governo. Foi um erro estratégico crasso de Dilma que Lula nunca cometeria.

Esse não foi o único desacerto. O impeachment de Dilma Rousseff, tal qual o de Fernando Collor, será merecido. A presidente pedalou, foi omissa na roubalheira da Petrobras, fraudou campanhas eleitorais e sabia de tudo que ocorria, como revelaram as denúncias do senador Delcídio do Amaral e as conversas gravadas. Com o seu governo desastrado, mal gerido economicamente e conivente com a corrupção, Dilma alimentou por anos um descontatemento que se generalizou entre empresários, trabalhadores, Congresso Nacional, Ministério Público, Judiciário, imprensa, OAB e tantos outros segmentos que demonstraram esse descontamento nas ruas. Não se pode classificar o movimento pró-impeachment como um golpe. Sempre vale lembrar que Lula concluiu dois mandados e a própria Dilma terminou um sem que essa tese fosse levantada. Daqui a alguns anos, a leitura da história, “dessa fatídica Normandia”, mostrará que Dilma foi vítima da sua própria omissão e incompetência. 

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