
Os dedos-duros da corrupção
A corrupção é a grande vilã, responsável pelo desencanto do brasileiro com a política. Nos últimos anos, os sucessivos escândalos que atravessaram governos de todos os partidos, nas três esferas de poder, afastaram milhões de eleitores da política. Expressando uma aversão que se tornou exagerada, para milhões de brasileiros, todo o político é ladrão até prova em contrário. Apesar do esforço feito pelo Ministério Público, pela Justiça e as denúncias publicadas pelos órgãos de imprensa, a corrupção gerou essa enorme descrença que na última eleição afastou das urnas 1/5 dos eleitores brasileiros. Depois de perder essa guerra por muitos anos, período em que bilhões de reais foram desviados da administração pública, a sociedade começa a encontrar mecanismos para se proteger de corruptos e de corruptores. Se é verdade que a corrupção é um câncer social, que desde o começo da humanidade não pode ser 100% extirpado, seu grau de incidência poderá ser minimizado se houver punições mais severas para os culpados.
Alguns passos já foram dados nesse sentido. Na política, a lei da ficha limpa barrou quase 1.000 políticos que possuíam pendências com a Justiça Eleitoral, em 2014. A tendência é que, nas próximas eleições, os candidatos com a ficha suja enfrentem cada vez mais dificuldades para concorrer. Embora muita gente tenha ficado decepcionada com o desfecho, o julgamento do mensalão, capitaneado pelo saudoso ministro Joaquim Barbosa, foi histórico, emblemático, pedagógico e um marco para a política brasileira. Pela primeira vez em 125 anos, a República fez valer a sua máxima de que todos são iguais perante a lei. Os figurões da corrupção sentaram no banco dos réus. No fim, com a virada de mesa no Supremo Tribunal Federal, os poucos meses de cadeia ficaram barato demais para os mensaleiros. Contudo, o paradigma da punição foi criado. Digamos que, desta vez, a bola da punição exemplar bateu na trave. Na próxima... Pouca gente sabe, mas já está em vigor no país a chamada Lei Anticorrupção que, em síntese, aumenta as penas e a responsabilidade das empresas beneficiadas pelos atos de corrupção. A partir de agora, as empresas e seus dirigentes pagarão mais caro pelas vantagens obtidas indevidamente na administração pública. Atualmente, na Petrobras, os casos de corrupção são um poço profundo que deve atingir até a camada do pré-sal. O episódio da estatal brasileira do petróleo abriu a discussão em torno de um mecanismo que até aqui, inexplicavelmente, havia sido ignorado pela Justiça Brasileira. No acordo de leniência, mais conhecido como delação premiada, o réu que fornece revelações significativas sobre uma investigação, avalizadas por um juiz, pode ter até dois terços da pena reduzida.
De novo, o mensalão foi muito pedagógico neste sentido. O empresário Marcos Valério era o operador do esquema e no final das contas pegou 40 anos de prisão. Está pagando pelo escândalo praticamente sozinho. Os mensaleiros mandantes ficaram poucos meses na cadeia e, hoje, já desfrutam do regime semiaberto. Para evitar esse mesmo desfecho, o ex-diretor de abastecimento Paulo Roberto Costa e o megadoleiro Alberto Youssef enveredaram por outro caminho e resolveram abrir o bico em troca de penas mais brandas. Por enquanto, os depoimentos estão sendo guardados a sete chaves, mas extraoficialmente sabe-se que uma centena de políticos e eminentes figuras da República, há várias noites, não conseguem dormir direito. O Brasil até hoje não havia usado a figura jurídica da delação premiada. Na década de 1980, o mafioso italiano, preso no Brasil e extraditado, Tommaso Buscetta entregou a máfia italiana e pessoas que contrabandearam heroína para os Estados Unidos. Estima-se que o rombo da operação Lava Jato seja de R$ 10 bilhões. Como parte do acordo, Paulo Roberto Costa devolverá, no total, à Justiça Brasileira mais de R$ 60 milhões, um recorde na recuperação de ativos. A democracia é um sistema que nunca será perfeito, mas que pode ser aperfeiçoado infinitamente. Essa utopia deve mover os governados e os governantes.