Os números do desencanto

Os números do desencanto

Os números são frios e ao mesmo tempo ambíguos. Quando se referem à política, a interpretação fica carregada pela subjetividade da ideologia. Logo que saiu o resultado da eleição para prefeito de Ribeirão Preto, o lado vencedor declarou que a democracia estava consolidada e que o melhor projeto ganhou. Os derrotados colocaram o resultado em xeque, destacando o alto percentual de votos nulos e brancos. Somando as abstenções, esse número totaliza 197 mil pessoas ou 44% do eleitorado. O contraditório da democracia se alimenta de visões antagônicas sobre a mesma realidade.

Os números refletem o desencanto, a desconfiança e a indiferença de uma parcela expressiva do eleitorado local com a política. Para um em cada três eleitores, a escolha do prefeito não faz muita diferença no cotidiano da sua vida. Ribeirão Preto teve a maior abstenção do Estado, 35,61% e a segunda do Brasil. Em 2014, 2016 e 2018, esse percentual foi em média de 21%. A indiferença local cresce a cada eleição.

Várias razões podem explicar essa apatia. A primeira delas foi o processo traumático que a cidade passou em 2016 com a perda quase que generalizada da credibilidade dos representantes. No país, há alguns anos, a política não vem sendo bem vista pela opinião pública. Outra razão, não menos importante, foi o risco oferecido pela pandemia, apesar de todas as precauções da Justiça Eleitoral. Como afirmam muitos analistas, pode ser ainda que o eleitor tenha mandado um recado a todos os candidatos que fizeram parte do processo eleitoral, sejam aqueles que tiveram votações pífias ou os que venceram perdendo para as abstenções.

Como as regras eram essas e o processo foi legítimo, para o bem da democracia, vencidos, vencedores e indiferentes precisam fazer movimentos contrários às suas convicções. Quem perdeu precisa avaliar porque não foi capaz de se afirmar como uma alternativa ao que considerava muito inadequado. Quem ganhou certamente teve méritos para obter esse resultado, mas se olhar friamente os números vai concluir que o desempenho não foi suficiente para convencer parcelas significativas da sociedade. Mais à frente, os que se mantiveram alheios ao processo correm o risco de serem chamados a pagar a conta da indiferença.

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