Para ser feliz
Num piscar de olhos, o fim de ano chegou. Não há como fugir do assunto. Na história recente da humanidade, não teve nada tão impactante como a pandemia do coronavírus que ligeiramente alcança o segundo ano, cheia de variantes, dados estatísticos, influencia padrões de comportamento, reflexos na economia e na política. Com o fim de ano, também surge uma avalanche de mensagens que chegam pelas redes sociais para tentar traduzir em palavras, emoções, sentimentos e inquietações. Tempo de reflexão, de repensar decisões e de fazer planos para enfrentar o que vem pela frente.
Um pouco do otimismo literário talvez seja mesmo necessário para superar velhos e antigos problemas que fazem parte da realidade brasileira. Uma parte da solução desses problemas depende das ações públicas que quase sempre deixam muito a desejar. Outra parte, não menos difícil, resulta da forma como as pessoas agem nas suas relações cotidianas, do grau de educação, civilidade, respeito e capacidade de construir entendimentos. Os dias atuais parecem mais carregados pelo destaque de tantas mortes, pelo radicalismo que aflora de maneira intensa. O obscurantismo mostrou suas garras e contamina legiões de pessoas. Fundamental nesta hora é manter o equilíbrio centrado no conhecimento próprio, mesmo que o universo, às vezes, esteja conspirando contra.
Para tentar decifrar o mundo, pode se recorrer à sabedoria dos filósofos, principalmente àqueles que se dedicaram a estudar a felicidade humana, caso do pensador alemão do Século XIX, Arthur Schopenhauer, para quem o homem não é um ser unificado e racional, que age conforme os interesses, mas um ente fragmentado e passional, que se movimenta influenciado por forças que fogem do seu controle. Tal pensamento se materializa em poucas palavras no poema “Para Ser Feliz”, apropriado para um ciclo que se fecha e outro que se descortina.
Para ser feliz
Abandonei os grandes planos de vida.
Entendi que a vontade do mundo
é um gato que não controlo,
pois só os felinos submetem os humanos.
Mas faço meus esboços,
coisas simples, breves e provisórias.
E mesmo estes — vai que... —
não podem ser rascunhados
sem antes beber alguma dose
de autoconhecimento e ter clareza
sobre o que desejo desta efêmera estação.
Como farei esboços sobre o futuro se
nem sei o que é essencial para
a minha felicidade?
Qual é a minha vocação?
E que tipo de relação
quero construir neste mundo?
Apenas com alguma clareza
sobre quem sou
poderei rabiscar alguns traços
sobre o meu porvir,
como quem dribla o destino,
porém nunca farei destes um dogma.
Tratá-los-eis como precários
porque a realidade é fluxo perene
de um imenso e caudaloso rio
e bem sei que não desejarei
— em pouco tempo! —
o que desejei antes, ardentemente.
E tudo isso significa que a vida me pede
um bailado, uma alma flexível
com asas de borboletas amarelas
para que o corpo, rígido como cadáver,
não quebre na pista,
mas dance no ritmo da existência, bela.