A pauta da vez

A pauta da vez

Recentemente, o Brasil parou para assistir à semifinal da Taça Libertadores da América entre dois clubes brasileiros, Flamengo e Grêmio. Todo mundo esperava um jogo equilibrado, truncado, típico de uma decisão, mas o resultado foi surpreendente, tal qual àquele inesquecível 7 a 1 que Alemanha aplicou no Brasil em julho de 2014. Ao contrário do que vem ocorrendo no país, o jogo do Flamengo encantou, fluiu como música suave. Em poucos minutos do segundo tempo, o time rubro-negro desandou a fazer gols. 

A agenda do Brasil de hoje não flui como o empolgante futebol do Flamengo. Sempre tem um fato, um acontecimento, um problema a ser resolvido para complicar e atrasar a pauta. Desde que essa crise começou em 2015, com as sucessivas quedas no Produto Interno Bruto (PIB) e o aumento do desemprego, o país não retornou ao caminho da normalidade. As discussões sobre o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff começaram ainda em 2015, a aceitação da denúncia ocorreu em dezembro e se encerrou em agosto de 2016. O país ficou praticamente paralisado nesse período todo, pois nenhuma economia anda com o presidente na berlinda. 

Consumado o impeachment, Michel Temer assumiu, mas a normalidade não voltou. Já durante a interinidade do vice- presidente, vários processos de afastamento pipocaram. Um a um foram sendo rejeitados até que em maio de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) divulgou o áudio da conversa entre o empresário Joesley Batista e Temer. O país ficou estarrecido com o teor do diálogo às escondidas, na calada da noite, entre o presidente e o empresário envolvido até o pescoço com a corrupção.  O pior ainda estava por vir neste fatídico maio. Apareceram, na mídia, as escandalosas imagens do braço direito de Temer, Rodrigo Rocha Loures, correndo pelas ruas de São Paulo com uma mala cheia de dinheiro.  Tal como um gato de sete vidas, Temer se livrou de vários pedidos de impeachment, mas na prática seu governo acabou ali e se arrastou até o final apenas para preservar o mandato. A pá de cal ocorreu em março de 2018, quando a economia ensaiava uma tímida recuperação. Embora a greve tivesse motivos justificados, a paralisação dos caminhoneiros acabou com qualquer esperança de retomada de desenvolvimento naquele ano. 

No começo de 2019, o novo governo começou, mas a reativação da economia dependia da aprovação da Reforma da Previdência. O desfecho da secular questão previdenciária brasileira demorou mais que novela da Globo. Por ora, estados e municípios ainda estão fora da reforma. Quando esse desfecho se aproxima, eis que surge uma nova questão que passa a influir na recuperação; o julgamento do STF para definir o cumprimento da pena a partir da segunda instância ou somente após o trânsito em julgado. Todo mundo sabe que a economia e a política andam juntas. 

Na fase atual, essa passou a ser uma questão emblemática para o país, pois o futuro da operação Lava-Jato depende dessa decisão. De um lado, estão os “garantistas” que só admitem a prisão depois que todos os recursos forem esgotados. Do outro lado, estão os “legalistas” que consideram que a presunção de inocência está assegurada na segunda instância que analisa as provas do processo. Os adeptos dessa corrente entendem que o preso pode recorrer cumprindo a pena. Grande parte da mídia e da opinião pública avalia que a reação à prisão em segunda instância se trata de ação orquestrada por membros da elite e de políticos influentes que não admitem serem punidos pelos crimes que cometeram.
 
Esse jogo decisivo já tem data marcada e acontecerá antes da final da Libertadores entre Flamengo e River Plate que acontecerá no dia 23 de novembro. A grande final da pauta judiciária brasileira está prevista para o dia 7 de novembro no prédio do STF, em Brasília, também com transmissão ao vivo na TV. Se no futebol o resultado possui as cores do imprevisível, no campo do judiciário alguns prognósticos são certeiros. Por enquanto o placar provisório está 4 a 3 a favor da execução antecipada da pena, mas pode haver uma virada. Marcaram tentos nesse time Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Barroso e Luiz Fux. A ministra Carmen Lúcia deve jogar no mesmo lado. São declaradamente contra a pena antecipada, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski.

Fatalmente, o jogo ficará empatado em cinco a cinco. Caberá ao presidente Dias Toffoli, o famoso voto de minerva. Toffoli sabe que essa é uma decisão emblemática para o futuro do país, para o combate à corrupção e para a recuperação da economia. A liberação de Geddel Viera Lima, Eduardo Cunha e tantos outros presos por corrupção poderá confirmar a tese de que o Brasil não é um país sério e que por aqui o crime compensa. Além do mais, Toffoli será lembrado para sempre como o presidente do STF na época em que essa decisão vital foi tomada. Façam suas apostas. Esse é um jogo que terá fortes emoções e o Brasil vai parar para ver. Como diz Galvão Bueno, “vale a sua torcida”.  

Compartilhar: