Prefeita, não é o que parece

Prefeita, não é o que parece

  
A prefeita Dárcy Vera não gostou da matéria de capa da edição 515 sobre a crise na saúde. No seu blog, comentou a reportagem com o título “Parece matéria encomendada da saúde”. Encerrou o texto repetindo a mesma afirmação. Como escreveu “parece” e não disse quem poderia ter feito a suposta encomenda, a prefeita demonstra que não tem certeza da afirmação. Cara prefeita, imagine se a Revide e os veículos de comunicação da cidade tratassem o seu governo com esse impreciso verbo. “Parece que a saúde está a Deus dará!”, “Parece que falta planejamento para a gestão da saúde”. Não seria um tratamento justo.

Em nome do seu importante cargo de prefeita, das duas uma: ou a senhora tem certeza que a matéria foi “encomendada” e deveria comprovar o que disse ou não deveria fazer essa afirmação. Não houve nenhuma conspiração envolvendo poderosas forças ocultas, apenas uma decisão editorial da revista. A própria prefeita já foi capa da Revide e outras dezenas de vezes deu entrevistas, apareceu inaugurando obras, participando de eventos, em festas e em reuniões políticas. Na mais recente, apareceu fazendo o anúncio da aquisição do Hospital Santa Lydia pela Prefeitura. Em todas essas aparições, também não houve nenhuma “encomenda”. Todos os veículos de comunicação, sem exceção, escolhem seus entrevistados e as matérias que publicarão. Essa é uma decisão editorial da direção da empresa e de seus jornalistas.

Senão, vai parecer que a senhora sofre de uma síndrome muito comum que afeta o presidente Lula, o ex-técnico Dunga e a grande maioria dos políticos brasileiros: a dificuldade para conviver com a crítica. Mídia boa é a favorável que vai ao encontro da satisfação dos interesses políticos e eleitorais. Cabe ao público leitor o inalienável direito de ler, apreciar ou não o conteúdo da publicação. A Revide é uma revista de circulação gratuita com 43 mil exemplares. Na parte que nos toca, depois de 24 anos de trabalho, ficamos satisfeitos ao constatar que todos os dias chegam, via e-mail ou telefone, inúmeros pedidos de moradores dos mais diferentes bairros desta cidade interessados em receber a revista, sem custo algum, nas suas residências. Pedidos que na maioria das vezes não podemos atender devido aos custos de impressão para aumentar a tiragem. No caso dos três entrevistados na edição 515, a Revide usou como critério ouvir a opinião de pessoas que já ocuparam cargos públicos na área da saúde para que relatassem suas dificuldades e que apontassem possíveis saídas para a pasta. Tanto que o título da capa foi “Soluções para a crise”. O Dr. Oswaldo Franco e o Dr. Sebastião dos Santos foram secretários da Saúde e o Dr. Marcos Felipe de Sá dirigiu o HC. O médico da USP, Juan Yaslle, especialista em saúde pública, secretário da Saúde governo do ex-prefeito Antonio Palocci, no passado vinculado ao PT, também foi convidado para a entrevista, mas não pode comparecer por motivos profissionais.

No comentário que fez no blog, a prefeita não respondeu a nenhuma crítica feita na reportagem e “pareceu” incomodada com o fato que os especialistas convidados pela Revide são médicos ligados ao PSDB. Até onde se sabe, os três profissionais entrevistados são pessoas idôneas contra os quais não pesa nenhuma acusação de má utilização de verbas públicas. O fato de serem ligados ao PSDB não desqualifica suas opiniões. Pelo contrário, independentemente da preferência partidária de cada um, a administração pública seria bem melhor se a escolha dos dirigentes não fosse uma questão aleatória, presa à subjetividade dos nomes. Haveria mais eficiência nas esferas de governo, se os dirigentes estivessem vinculados a uma ideia, a um projeto político claro e transparente que tornasse pública a proposta a ser executada. Essa identificação com uma proposta ou projeto político é bem melhor do que fazer escolhas por simpatia ou barganha política. E cá entre nós prefeita, pelo que parece, o PSDB nem é tão ruim assim. Haja vista que o seu partido, o DEM, é parceiro de longa data dos tucanos em eleições presidenciais, estaduais e por aí a fora. Nas eleições de 2010, essa longa parceria se repetirá.

Nos seus comentários, a senhora pareceu deixar nas entrelinhas que a reportagem é uma peça de uma disputa política, embora este não seja um ano de eleições municipais. Isso também não é verdade. A reportagem não teve a pretensão de fazer um julgamento definitivo do desempenho da atual administração na área da saúde, estabelecendo uma espécie de confronto maniqueísta, entre o governo e a oposição, entre bem e o mal. A distorcida ideia “de que quem não está comigo está contra mim” remete aos mais sombrios tempos da ditadura.

Entretanto, em uma questão pelo menos, estamos de pleno acordo: quando a senhora diz no seu blog que os problemas da saúde não começaram no seu governo e que dois dos entrevistados tiveram a oportunidade de resolver os problemas da saúde e não conseguiram. De fato, os problemas nas unidades de saúde do município são tão antigos quanto os programas de rádio que denunciam as reclamações dos usuários. Aliás, essa foi uma das razões que pesou na escolha dos nossos entrevistados. Temos a certeza que a população quer saber porque é tão difícil melhorar a saúde de Ribeirão Preto. Queríamos ouvir a opinião das pessoas que já tiveram essa experiência. Eles não conseguiram resolver todos os problemas e infelizmente a senhora também não está conseguindo, apesar de ter feito muitas promessas na campanha eleitoral de que melhoria o sistema rapidamente. Só boa vontade não basta, prefeita.

A proposta da matéria não foi fazer um amplo debate com todos os envolvidos no problema. Se assim fosse, seria preciso convidar o Sindicato dos Médicos, o Sindicato dos Servidores Municipais que representa os funcionários administrativos, os prestadores de serviço, sem esquecer do principal interessado: o usuário do sistema. Teríamos que fazer uma revista temática sobre o assunto.

Também causou surpresa, o furor da sua reação no seu blog, especificamente contra a Revide, já que quase todos os veículos da cidade fazem diariamente inúmeras reportagens contundentes sobre o assunto. Qualquer cidadão minimamente informado conhece os problemas que a saúde de Ribeirão Preto enfrenta. Há pouco tempo, um jornal da cidade publicou uma matéria de três páginas com ex-secretário Sebastião dos Santos em que ele fazia as mesmas críticas explicitadas na Revide e “parece” que não houve de sua parte a mesma reação.

A senhora reclamou da ausência do secretário Stênio Miranda, que está completando os 100 primeiros dias no cargo, tempo que se dá ao governante para que conheça a realidade da sua pasta e possa colocar as suas ideias em prática. Entendemos que o recém-empossado Stênio Miranda não tem nenhuma responsabilidade sobre o que está ocorrendo na saúde pública de Ribeirão Preto. Como se diz na gíria popular, o novo secretário recebeu uma “batata quente”, mas fica aqui o convite público para que, em futuro próximo, o secretário apresente à população de Ribeirão Preto, em uma entrevista à Revide, os resultados de seu trabalho. De bate-pronto já podemos deixar “encomendada” esta matéria.
Como escrevi anteriormente, não se trata de uma caça às bruxas. Para retomar o cerne do debate, reiteramos algumas reflexões importantes contidas na matéria da semana passada que podem contribuir para a solução do problema, afirmações essas que não são da Revide, mas dos entrevistados, vinculados ao PSDB, ouvidos na reportagem. Eleita pela maioria dos eleitores de Ribeirão Preto, a senhora tem o soberano poder de ler essas sugestões, fazer uma avaliação dentro do contexto da sua administração, levá-las em consideração ou ignorar todas se assim entender.

1. Ribeirão Preto não deveria enfrentar problemas tão graves de saúde, já que o Estado via HC e outros hospitais tem uma participação expressiva na área, situação que não ocorre em outros municípios.
2. O problema da saúde de Ribeirão Preto não é de verbas, pois o município destina mais de 20% do seu orçamento e a cidade ainda recebe repasses do governo estadual e federal.
3. Não dá para fazer saúde pública sem médicos. Portanto, a Prefeitura precisa fazer todo o empenho para resolver o mais rapidamente o desgastante conflito com a categoria.
4. Os profissionais da saúde merecem uma remuneração melhor, mas em compensação os índices de produtividade e a assiduidade ao trabalho precisam ser revistos e cobrados.
5. É preciso melhorar os mecanismos de gestão e evitar as interferências políticas que colocam pessoas despreparadas em cargos de direção.

Finalmente, a despeito das divergências políticas e jornalísticas, desejo que a prefeita Dárcy Vera e sua equipe consigam resolver esses problemas dentro do seu mandato. Quando se trata de saúde pública, problemas como os que estão ocorrendo em Ribeirão Preto podem significar o sofrimento e a morte de pessoas nas filas de espera.

A cobertura da posse, janeiro de 2009Capa da cobertura da posseAnuncio da aquisição do Santa Lydia
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