
A receita da longevidade
Para divulgar a Revide Ancienne, o médico e escritor Drauzio Varella realizou uma palestra no Theatro Pedro II sobre o envelhecimento com qualidade de vida. Drauzio faz parte de uma seleta parcela de pessoas que conseguiu destaque em sua profissão. A fama não foi decorrente de um dom artístico ou de algum cargo importante, mas resultou do conhecimento que adquiriu ao longo da vida. Entre as muitas experiências que teve a de maior destaque foi o trabalho médico e de assistência social em cadeias, a do Carandiru, principalmente.
Três dos livros que publicou — Estação Carandiru, Prisioneiras e Carcereiros abordam o sistema prisional brasileiro que provoca arrepios para quem está do lado de fora. Bem ao seu estilo, Drauzio entrou para valer, durante anos atendeu detentos e ouviu suas histórias. Talvez não haja lugar mais fecundo para conhecer as desventuras da alma humana do que o submundo de uma cadeia. Depois das prisões masculinas, também faz o mesmo trabalho voluntário na Penitenciária Feminina de São Paulo. O médico foi um dos primeiros a se interessar pelo estudo da AIDS.
Tanto desprendimento chamou atenção da mídia.Tornou-se colunista de jornais importantes e há anos mantém o quadro semanal no Fantástico da Rede Globo onde percorre o país e apresenta vários temas, discutindo doenças e tratamentos de saúde. O reconhecimento que conquistou contribuiu para popularizar as informações médicas no país. Fumante por mais de 20 anos, hoje, elegeu o cigarro como um dos principais inimigos a ser combatido. “A dependência do cigarro é imediata. O sujeito acaba de fumar um e dali a 30 minutos está tentado a fumar outro. Lá no fim, o resultado é desastroso com os piores tipos de cânceres que já vi na minha carreira”, afirmou o médico, classificando a nicotina como uma das piores drogas para viciar o ser humano.
Aos 76 anos, em plena forma física, Drauzio não faz parte do grupo de médicos que reza pela cartilha do “faz o que eu digo, mas não faz o que eu faço”. Pelo contrário, de passagem por Nova Iorque há alguns anos, se autodesafiou a mudar o estilo de vida e se tornou um corredor de maratonas. Em 2015, publicou um livro sobre o esporte. A preparação para correr longas distâncias exige muita disciplina e sacrifício. Para isso, contou que acorda às cinco horas da manhã e só se dá ao direito de desistir da empreitada depois de colocar a roupa, os tênis e escovar os dentes. “Na cama, deitado, o ser humano não tem caráter, vive inventando desculpas e protelando decisões para amanhã”. Frequentemente, Drauzio corre maratonas de 42 km e revela que fica cansado lá pelo km 35. Se quisesse, Drauzio poderia ir a Orlândia correndo ou fazer um bate e volta até Cravinhos.
A corrida tem a ver com a síntese do pensamento que o médico propaga nas palestras que faz pelo país. Reforça a ideia de que o corpo humano, desde os tempos das cavernas, foi projetado e desenvolvido para o movimento. Por isso, tem pernas e braços longos. “Não sou daqueles que diz que o esporte dá um prazer danado. Pratico por necessidade. O prazer e a recompensa aparecem lá no final, depois do exercício feito”, observa o médico. Quem assiste às suas palestras sobre o envelhecimento com qualidade de vida, geralmente espera alguma receita diferente do que a mídia tem divulgado insistentemente. A principal receita do famoso escritor e colunista não poderia ser mais simples. Seguindo a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), o médico prescreve que uma boa saúde começa pela prática de 30 minutos de exercícios físicos cinco vezes por semana.
Isso é o mínimo. Segundo Drauzio, não há desculpas para o não cumprimento dessa meta como a falta de tempo, de dinheiro ou problemas de agenda. “Quem não consegue 30 minutos de um dia de 24 horas para cuidar da própria saúde, está vivendo de maneira errada. As pessoas precisam se conscientizar de que, na lista de prioridades, a saúde do corpo vem em primeiro lugar, antes mesmo da família e do trabalho. Quem morre ou fica paralisado por um AVC, não cuida da família e nem trabalha”, diz o médico de maneira taxativa, avisando que perdeu a paciência com as desculpas que ouve dos pacientes no consultório. Hoje, cerca de 90% da população brasileira com mais de 60 anos tem algum problema crônico de saúde. O normal seria que apenas 10% tivessem algum problema, pois as doenças crônicas não deveriam fazer parte da velhice.
O médico se declara ateu e por várias vezes já foi atacado nas redes sociais pelas críticas que faz às políticas públicas e à indústria farmacêutica. Ao final da palestra, Drauzio fez um alerta para os pais, familiares e a comunidade médica. Ele acredita que o mal deste século será a depressão, que será a principal causa da falta ao trabalho. Todos precisam ficar atentos para perceber os comportamentos que revelam os sintomas que afeta, principalmente, um número crescente de jovens e mulheres. “O corpo e mente são prioridades de cada ser humano”, concluiu o médico.