
Suprema decepção
O Brasil está mudando. Por incrível que pareça, nesse processo de limpeza nacional que está em andamento, hoje, os brasileiros conhecem melhor as posições dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) do que as habilidades esportivas dos 11 jogadores que defenderão o Brasil na Copa da Rússia. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, já é mais conhecido que o atacante Philippe Coutinho, titular da Seleção Brasileira. No entanto, à medida que esse processo de politização nacional avança, as decepções são inevitáveis e ficam cada vez mais frequentes. Talvez a maior frustração nesse momento em que tanto se espera das instituições, tenha sido a última sessão do STF, que por falta de disponibilidade dos ministros para prorrogar a jornada de trabalho, empurrou a decisão com a barriga por 15 dias, depois do feriadão da Semana Santa.
O mérito das decisões está sob a jurisdição dos doutos ministros que ganham uma remuneração muito acima da realidade dos brasileiros. Com os auxílios e os penduricalhos, passa dos R$ 40 mil por mês. Todos sabem que o país tem uma situação controversa para resolver sobre o futuro do ex-presidente Lula, decisão essa que impacta, inclusive, na eleição presidencial que se avizinha rapidamente. Sem entrar no mérito, seja qual for o veredito, o que os nobres ministros das capas pretas não podem se esquivar é de dar uma resposta ao povo brasileiro que paga seus altos salários e regalias através de uma carga tributária sufocante.
O escárnio dessa situação foi a cena patrocinada por Marco Aurélio de Mello. De maneira vexatória, o ministro justificou sua necessidade de abandonar a sessão, mostrando uma passagem de avião marcada para o principal dia de sua agenda de trabalho. No supremo entendimento do ministro, o seu compromisso particular era bem mais importante do que o julgamento da ação em pauta. O país que espere por um dia mais adequado à agenda pessoal do magistrado. O Judiciário tem lá suas formalidades, um “juridiquês” de pouca objetividade prática, mas o discurso empolado, que foge da compreensão da maioria dos brasileiros, inclusive daqueles que possuem um bom nível de escolaridade, não contribui para a transparência que hoje o país tanto persegue. As eminências jurídicas se esmeram em filigranas do direito de onde extraem teorias cheias de subjetividade que tentam justificar as mais contraditórias decisões. Embora se diga que a Justiça é cega, ela abre pelo menos um olho quando o réu é rico, poderoso e com influência política.
No pano de fundo do teatro armado, está o cumprimento da pena em segunda instância, tema que o próprio Tribunal decidiu em 2016. Acontece que um ministro morreu e o outro diz que mudou o entendimento, assim, a saída é votar de novo para ver se o resultado se altera. Caso haja uma mudança, haverá uma tremenda insegurança jurídica no país. Por esse raciocínio, se no ano que vem algum ministro sair ou se aposentar, a questão será revista novamente? O país espera que o STF crie uma jurisprudência longeva capaz de estabelecer a igualdade de tratamento a todos os brasileiros, sem mudar de posição a cada dois anos.
Com a devida data vênia, nenhum dos atuais 11 ministros tem legitimidade e representatividade suficiente para decidir questões relevantes para a nação. Todos foram escolhidos pelo pior critério possível, o interesse político do presidente e dos ex-presidentes. A casa está dividida entre os ministros do Fernando Henrique, da Dilma Rousseff, do Lula e do Michel Temer. O vaidoso ministro Celso de Mello, prestigiado “decano do STF”, sem falsa modéstia, profere longos votos em que cita a si mesmo. O ministro Gilmar Mendes mais parece um pugilista sempre disposto a dar um soco em algum colega. Na última sessão, no meio de um bate-boca vergonhoso para uma instituição da qual os brasileiros tanto dependem, o ministro Gilmar Mendes disse que o ministro Luis Roberto Barroso deveria fechar o seu escritório, incompatível com o cargo que ocupa. Barroso respondeu que Gilmar “é a mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia.”
Depois de horas discursando na sessão sobre o julgamento do habeas corpus de Lula, o plenário encerrou a sessão sem decidir o mérito da ação, apenas concedendo um salvo conduto ao ex-presidente até o dia 4 de abril. Está certo, não foi possível fazer uma sessão extra na Semana Santa, uma vez que na sexta tem feriado. Que emendada foi essa! A sociedade precisa incluir na pauta das discussões do interesse público uma nova forma de eleger os representantes do Supremo Tribunal Federal. O destino de 200 milhões de pessoas não pode ficar ao sabor de artimanhas políticas. Hoje, infelizmente, no STF, não se faz justiça, mas sim um ardiloso jogo de interesses.