
A transparência do prefeito
A campanha eleitoral terminou e pelo jeito não vai deixar muitas sequelas. Na política, os inimigos de ontem são os amigos de amanhã. Desta vez, o cavalo de batalha foi a possível construção de uma estação para tratar a água do Rio Pardo. Muito provavelmente, o atual governo terminará sem que Ribeirão Preto tenha construído essa badalada estação de tratamento. A cortina de fumaça se dissipa logo. Os estudos nem começaram e em curto prazo não há recursos para iniciar uma obra de tamanha envergadura, embora ela seja absolutamente necessária num futuro não muito distante. Ninguém pode esquecer que os recursos do Aquífero Guarani são imensos, mas finitos.
Encerrados os imbróglios da eleição, a cidade e o futuro prefeito não podem perder o foco, pois embora essa seja uma questão importante, há muitos outros problemas bem mais graves para solucionar. Em tom de homenagem, Duarte Nogueira Júnior disse que espera realizar um governo melhor do que o do seu pai, de quem recebeu o capital inicial para ingressar na política. Ao contrário da maioria dos políticos que começa a carreira como vereador, Nogueira iniciou a trajetória concorrendo a prefeito em 1992. Dois anos depois, elegeu-se pela primeira vez deputado estadual. Apesar de ser filho de um ex-prefeito, de ter ocupado cargos executivos e de ter desempenhado mandatos no Legislativo passou por um processo de provação. Foram quatro tentativas para, finalmente, vencer a disputa para prefeito. O eleitorado espera, incluindo-se aí quem votou e quem não votou no tucano, que o novo prefeito não desperdice uma oportunidade que demorou tanto para vir.
A cidade que seu pai governou por duas vezes não tinha tantos problemas como Ribeirão Preto tem hoje. Havia uma situação financeira bem melhor, a ponto de permitir que a Prefeitura criasse e investisse em empresas públicas que atuavam no transporte coletivo e no setor habitacional. A questão financeira será o grande desafio de Nogueira. Para vencer a eleição, o futuro prefeito fez muitas promessas. Para cada um dos problemas da administração pública, tinha um discurso pronto que foi exaustivamente repetido durante a campanha eleitoral. Por conta da operação Sevandija, a corrupção foi tema predominante. Por várias vezes, além da criação de uma controladoria, o prefeito eleito declarou que examinará todos os contratos que estão em vigor com uma lupa. Também prometeu dar transparência total à real situação financeira e orçamentária que encontrar na Prefeitura. Essas são duas promessas chaves pelas quais será cobrado.
O pente-fino nos contratos e a transparência financeira já serão um divisor de águas para que o eleitor descubra se a nova administração vai implantar um novo jeito de fazer política ou se vai repetir as velhas práticas institucionalizadas por governos anteriores, que colocaram a cidade no caos atual. Até hoje, na história política recente de Ribeirão Preto, mesmo as administrações que sucederam governos antagônicos omitiram dados sobre a realidade financeira do município como se isso fosse um arquivo confidencial que o eleitor não deveria ter acesso. A realidade dos contratos, das dívidas e dos pagamentos sempre foi tratada como segredo de estado, de uso restrito dos altos escalões. Governos passados nunca se preocuparam em fazer uma grande demonstração pública sobre a situação financeira que a administração anterior deixou. O máximo que aconteceu foi uma briga estéril através da imprensa sobre quem deixou dívida ou dinheiro em caixa.
A operação Sevandija, realizada em setembro de 2016, foi o ato mais transparente da história das finanças municipais. Tamanha discrição financeira de diferentes governos tem um motivo muito forte. Mesmo que sejam rivais nas disputas, governantes têm um senso corporativo e sabem que a política dá muitas voltas. O favor de hoje vira o benefício a ser cobrado no amanhã. Já o cidadão e o eleitor costumam prestar mais atenção na realidade mais palpável: a deficiência do atendimento de saúde, os buracos na rua e a qualidade do transporte coletivo, mas a transparência dos números torna-se vital para o futuro da cidade, pois dela depende a resolução de todos esses problemas.
O novo prefeito tem, agora, a oportunidade de inovar nesta área, fazendo a leitura do recado das urnas. Pelo país afora, o eleitorado optou por políticos “outsiders” que prometeram um jeito novo de fazer política. Os casos mais visíveis foram de João Dória em São Paulo e de Alexandre Kalil em Belo Horizonte, eleitos por partidos pequenos e com um forte discurso “antipolitico”. As abstenções, os votos nulos e em branco sinalizam o cansaço do eleitor com a mesmice da política. Recém-eleito, Nogueira tem a chance de começar inovando pela transparência na gestão financeira. Se quiser ser bem-sucedido, precisa estender esse “modus operandi” para todos os setores da administração pública.