
Vilões da modernidade
A internet popularizou as famosas listas com os 10 programas que você pode fazer de graça, os 10 lugares onde se pode entrar em contato com a natureza ou mesmo passear com as crianças. Nos sites e nos portais de notícias, há listas para todos os gostos. Uma das relações mais interessantes dos últimos dias foi divulgada por uma revista especializada que apresentou 20 vilões famosos no cinema. Quem encabeça a lista é o sombrio Darth Vader de Star Wars, a mais famosa série que o centenário cinema já produziu. Além do semblante obscuro e assustador, certamente o que pesou contra Darth Vader foi a pura falta de compaixão que o levou a tentar matar o próprio filho, Luke Skywalker. O segundo vilão mais apreciado dessa lista foi o Coringa, eternizado graças à magistral interpretação do ator Heath Ledeger. O inimigo número 1 do Batman tinha ares sinistros e macabros.
A relação prossegue com algumas injustiças como a ausência do “Jason” da Sexta-Feira 13 e a presença imprescindível do Freddy Krueger. Lá pela quinta colocação, aparece aquele considerado por este escriba como o mestre de todos os vilões: o “Hannibal Lecter”, de o “Silêncio dos Inocentes” um assassino inteligente, frio e sanguinário, sempre à espera do momento mais oportuno para matar. No filme, no antológico quiproquó entre o Dr. Lecter e a angelical atriz Judie Foster, forma-se uma parceria doentia para encontrar um assassino. Até mesmo uma mente maligna pode praticar o bem.
A vida real sempre foi a principal fonte de inspiração para as melhores histórias que o cinema contou. O criador do psicótico Dr. Lecter, o jornalista e escritor Thomas Harris, revelou que o famigerado personagem foi inspirado a partir de uma entrevista que fez com um médico mexicano, um doente mental condenado à morte pelo assassinato de três pessoas. A entrevista tomou um rumo desconcertante quando o médico assassino começou a questionar o jornalista sobre a natureza dos tormentos submersos nas profundezas da alma humana.
Já na fase moderna do cinema, o asqueroso Gollum de “O Senhor dos Anéis” apresentava uma faceta interessante que tem a ver com a modernidade. O personagem se tornou um mestre em disfarçar muito bem o seu perfil ardiloso para desarmar os espíritos em volta até encontrar o momento propício para praticar maldades. Quem assistiu a algum filme da série Harry Potter não deixaria Voldemort de fora. Ao contrário de Gollum, esse vilão é o maligno clássico e assumido. Hoje, a ciência empreende descobertas pelos perigosos caminhos da Inteligência Artificial com a construção de máquinas cada vez mais complexas. Será ficção pura o risco de, lá na frente, surgir um ciborgue assassino implacável semelhante ao T-1000 que perseguia Schwarzenegger no “O Exterminador do Futuro”. Pelo menos na arte da vilania, há um equilíbrio relativo nos papéis de homens e de mulheres. Na tela já apareceram vilãs sedutoras protagonizadas por mulheres como Sharon Stone em o “Instinto Selvagem” e Glenn Close de “Atração Fatal”. Difícil esquecer o olhar sombrio da enfermeira Mildred de “Um Estanho no Ninho”. Na lista feminina ainda tem bruxas, feiticeiras e as musas malignas e encantadoras da série do 007.
Por serem marcantes, os vilões materializam algumas lições que transcendem a maldade em si, propositalmente evidenciada com exagero dramático do cinema. Com suas nuances, esses personagens revelam que a mente humana não pode ser vista de forma simplista e maniqueísta, principalmente quando se trata de distúrbios ou comportamentos doentios. Um pouco além das aparências e da superfície, a mente se torna indecifrável e imprevisível. Isso explica o que se vê com frequência no noticiário da imprensa. Além das manifestações clássicas de violência, ocorrem cenas bizarras, agora registradas em vídeos e reproduzidas nas redes sociais. Os vilões estão à solta e vivem um momento de estrelato. Até mesmo pacatos cidadãos, sob algum tipo de pressão ou influência psicológica, cometem as maiores barbaridades. Esse parece um componente assustador no mundo atual. Necessário se faz perceber o que acontece em volta, não apenas estar de corpo presente, mas prestar atenção ao comportamento das pessoas. A indiferença ou a falta de compreensão com quem precisa de ajuda pode ser o novo grande vilão dessa conturbada modernidade. Faltam iniciativas que estendam a mão e sobram atos de intolerância, hostilidade, agressividade e falta de compreensão até mesmo entre parentes próximos. Tanto na vida real como no cinema, os vilões, sejam seres humanos e seus comportamentos, estão por perto, escondem a sua verdadeira face e estão sempre prontos a nos atacar.