Ar irrespirável

Ar irrespirável

Esta semana, de uma hora para outra, o ar de Ribeirão Preto ficou irrespirável em grande parte da cidade, repetindo um cenário muito desfavorável que já havia acontecido no ano passado. Tradicionalmente, a cidade apresenta um clima quente, mas, nos últimos anos, a elevação da temperatura além do padrão normal pode ser facilmente observada, mesmo sem as medições oficiais. Um desconforto que se sente na pele e na garganta. O clima quente e seco serve de faísca para o fogo que consome canaviais, matas e áreas verdes, aumentando a sensação de calor. Nesta semana, na consequência mais trágica, duas pessoas morreram por causa de incêndios que ocorreram na região. Definitivamente, a poluição que antes era um problema das grandes metrópoles se torna algo presente na rotina das pequenas e médias cidades do interior.

As medições oficiais também comprovam a degradação da qualidade ambiental. No começo da semana, segundo a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), Ribeirão Preto registrou a pior qualidade do ar do Estado. Para completar ainda teve uma chuva de carvão que tingiu de preto milhares de residências. Isso se deve à grande quantidade de queimadas no entorno da cidade. O coquetel de intempéries se completa com a queda umidade do ar. O tempo seco com muita sujeira aumenta o consumo de água, fechando o ciclo do desequilíbrio ambiental.

A percepção das alterações climáticas se alterna entre mudanças lentas e graduais com eventos bruscos que fogem do histórico da normalidade. Há um consenso mundial entre universidades e instituições de pesquisa de que o planeta está aquecendo. Pelo menos na teoria, a luta a favor do meio ambiente deveria unir e mobilizar as populações de cidades, estados e países, num movimento mundial que precisa de milhões de iniciativas individuais como ponto de partida para a transformação. Na prática, essa mudança de comportamento se traduz em cuidados com o fogo, a substituição de processos e produtos poluentes, além das políticas públicas de preservação do meio ambiente.

A divulgação de diversos relatórios mundiais sobre o meio ambiente, a qualidade do ar inclusive, deixa a nítida sensação de que a humanidade está perdendo a luta pela manutenção de um planeta saudável. Além do sério risco de um desequilíbrio ambiental irreversível, as mudanças climáticas cobram um custo elevado da sociedade, especialmente das populações mais pobres, mais expostas e sem proteção. Os prejuízos se generalizam. Por conta do clima seco e da falta de chuva, as projeções indicam que a agricultura brasileira terá um prejuízo de 7 bilhões de dólares este ano. Prefeituras terão que despender mais recursos para cuidar de desabrigados. O cidadão comum pode ter a sua saúde comprometida. 

Aos problemas ambientais se juntam outros que vão surgindo pelo caminho. Parece que a pauta do mundo está invertida, de ponta cabeça, em que problemas centrais perdem espaço para atos de confronto e de provocação.  Em vez de governos, entidades e instituições concentrarem os esforços em questões relativas ao meio ambiente, à saúde, à vacinação, à fome e ao desemprego, para citar apenas alguns, parece que no mundo inteiro há uma pré-disposição para propagar o ódio, o confronto e o conflito. Mal as Olímpiadas acabaram e o Taliban surpreendentemente retomou o Afeganistão para instalar um estado de horror, violência e discriminação. O Brasil mergulha num clima de confronto entre poderes com consequências imprevisíveis num futuro próximo. No sentido literal e figurado, o ar está ficando mesmo irrespirável.

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