O futuro nas mãos

O futuro nas mãos

Em 2017, a palavra crise foi pronunciada exaustivamente, assumindo o significado de um mantra negativo que, tomara, não se repita em 2018. Dizem que foi a pior crise da história recente, mas essa é uma afirmação relativa. Em uma sociedade capitalista e desigual, as dificuldades econômicas não atingem a todos na mesma proporção. 

Economistas e jornalistas costumam comparar a recessão que está se encerrando com as anteriores. Isso vale para estudos acadêmicos e para especialistas, mas, para os pobres mortais, como os 12 milhões de desempregados atualmente estimados, a crise que vale mesmo é a atual, pois as anteriores são apenas lembrança desagradável. 
Se o agronegócio, por exemplo, passou quase incólume por essas dificuldades e a indústria automobilística só agora redescobriu onde fica o acelerador, o setor bancário manteve ganhos e lucros milionários. Experts no assunto, os bancos têm receita para todos os cenários. Em época de bonança, expandem as operações de crédito e, em momentos de instabilidade, reduzem a oferta de dinheiro circulante na praça para diminuir o risco. Não há nada de ilegal nisso, pois essas são as regras do jogo de mercado do dinheiro. 

A sociedade que hoje está de olho no Congresso Nacional para combater a corrupção e que começou a questionar as benesses do Judiciário precisa conhecer melhor as regras desse mercado. Qual a explicação lógica para uma inflação abaixo de 5% ao ano e um cartão de crédito que cobra mais de 300% ao ano? O próprio financiamento da dívida pública forma uma espiral que contribui para que o Brasil tenha uma das taxas de juros reais mais altas do mundo, apesar das significativas reduções que ocorreram. Quem comanda o Ministério da Fazenda é o banqueiro Henrique Meirelles, que se prepara para ser candidato à presidência da República. O presidente do Banco Central é Ilan Goldfajn, sócio do Itaú. Dois banqueiros comandam a política monetária do país e se pode questionar se legislam em causa própria.
Há poucos dias, os bancos deram mais uma inequívoca demonstração de que não perdem negociação quando há dinheiro em jogo. Depois de arrastarem os processos das perdas das aplicações financeiras por anos, fecharam um vantajoso acordo de pagamento com correntistas que perderam rendimentos em uma sequência de planos econômicos mal-sucedidos. O poder político das instituições financeiras se funde com o poder econômico sem maiores questionamentos. 

Essa capacidade de influência que independe das correntes políticas no poder passa ao largo das crises e, de quebra, produz os melhores comerciais da premiada publicidade brasileira. Tem sido assim, por exemplo, com o Itaú, cuja campanha publicitária se tornou uma atração aguardada. Este ano, a qualidade reflexiva se repetiu desde o começo de dezembro, com a narração da atriz Fernanda Montenegro chamando a atenção para a importância dos pequenos acontecimentos da vida e do futuro. Pelo menos na economia, os bancos são os primeiros a saberem o que acontecerá conosco.

O futuro geralmente se apresenta como enigmático, incerto e, às vezes, assustador. A narrativa do comercial sugere uma inversão para amainar a ansiedade que vem à tona na passagem de ano. A voz de Fernanda Montenegro ecoa dizendo que não é o futuro que controla o destino das pessoas. O que precisa ocorrer é justamente o contrário. O segredo parece repousar em palavras simples, como naturalidade, suavidade e capacidade de contemplação para buscar a felicidade nos pequenos prazeres do cotidiano. A postura menos carregada e obsessiva abre caminho para uma melhor apreciação do presente com os olhos direcionados para o que está ao alcance das mãos e não para o que está faltando. Os povos considerados mais sábios e felizes aprenderam a valorizar o que possuem e não esperam pela virada dos mega-acontecimentos. A riqueza de cada ser humano está na qualidade e na intensidade das relações estabelecidas. 
Sob a chancela do Itaú, o badalado comercial de fim de ano aponta o medo que o futuro provoca, uma incerteza que chega a assustar. Na verdade, o que está por vir é uma espécie de campo neutro, um roteiro em branco que ainda será escrito. Isso depende fundamentalmente das escolhas a serem feitas. A intolerância deixará de existir se o respeito passar a ser praticado neste momento. Quem deseja ser feliz, não deve esperar o futuro, mas pode começar apreciando o que tem no presente, seja uma bela paisagem, um aroma agradável ou uma boa conversa que afaste a solidão do caminho. Embora pareça simples, essa sempre é uma tarefa complexa: entrar em um novo ano sabendo que carrega o futuro nas próprias mãos. Feliz 2018! 

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