Ele viu... Ele vê...
Nelson Jacintho
15 Nov 2017 07:33
Sentado em sua cadeira de vime no alpendre de sua pequena e velha casa ele viu e vê a vida passar...
Viu a sua primeira calça curta e os chinelos que não lhe paravam nos pés aos seus dois anos de idade... Viu o seu primeiro doce pé de moleque que comprou na “venda” aos três... Viu-se criança caminhando pela estrada empoeirada a caminho da escola... Viu a junta de bois velhos e cansados puxar o grande arado de ferro para revolver a terra... Viu o leiteiro que entregava leite em litros, de casa em casa, em uma carroça puxada por um cavalo que se chamava brinquedo... Viu o padeiro passando com a carrocinha e sua buzina, que soava pam pam pam, entregar pães às empregadas domésticas vestidas com vestidos de chita e avental de algodão grosso, enquanto as patroas dormiam o terceiro sono... Viu cavaleiros tangendo o gado, logo depois de sua porta, pois morava na última casa da rua vizinha de um retiro, onde ele, de vez em quando tomava leite com açúcar na sua caneca de lata... Viu as crianças morrerem no Posto de Saúde do bairro atacadas pelo mal de simioto, que nada mais era do que desnutrição e desidratação...
Viu o primeiro carro passar comprado por um milionário plantador de café que depois quebrou e passou a andar a pé... Viu o primeiro caminhão que carregava três toneladas de peso, um tremendo exagero para a época... Viu o primeiro avião de hélice que trouxe um político importante para inaugurar a exposição de animais... Viu a instalação da primeira leiteria que distribuía o leite e da primeira padaria que obrigava as pessoas saírem de casa para comprarem os respectivos produtos... Viu o surgimento do primeiro empório, semente que veio a se transformar nos supermercados atuais... Viu o aparecimento do primeiro trator que revolvia a terra e fazia o trabalho antigo de cem juntas de bois... Viu as primeiras séries de histórias filmadas e os primeiros cow boys americanos fantasiados de homens bravos e destemidos enfrentarem e dizimarem grandes populações indígenas para lhes roubarem as terras... Viu as crianças caminhando para a escola, vestidas de uniformes dos mais diferentes modelos... Viu o aparecimento dos ônibus modernos e confortáveis que vieram substituir as velhas jardineiras compradas de segunda mão que nunca terminavam as viagens porque sempre se quebravam pelas estradas... Viu o aparecimento dos aviões de carreira, das locomotivas a óleo diesel e dos grandes aviões a jato que riscavam e riscam as nuvens como um grande e interminável giz branco... Viu as pessoas pararem de morrer velhos aos 50 anos de idade e atingirem a idade de 80, 90 anos com aspecto de 60. Viu e vê pessoas falarem na terceira idade e ultimamente na quarta, para o gáudio dos jovens setentões que estão procurando mulheres de 20 para fazerem o segundo, terceiro matrimônio... Viu e vê a modificação física e comportamental das moçoilas que aumentavam e aumentam seu prestígio frente aos rapazes enquanto diminuíam e diminuem suas saias...
Ele viu... Ele vê... Quanta coisa haverá de ver enquanto a vida passa...?
