O glutão
Nelson Jacintho
21 Mai 2017 10:37
Ele era médico, havia se formado em uma das boas Universidades do país e recebera uma ótima formação profissional. Possuía algumas qualidades e alguns defeitos que o caracterizavam. Era educado, simpático, muito alegre e cozinhava bem. Era preguiçoso, teimoso e comia exageradamente. Não abriu consultório, porque não queria grandes responsabilidades. Arrumou dois empregos públicos, mas alguns meses depois dispensou um, porque não estava tendo tempo para fazer as deliciosas comidas que gostava de fazer. Apesar de ser cobiçado e perseguido pelas mulheres, nunca se casou. Não tinha, entretanto, queda para o homossexualismo. Foi filho único e morou com os pais, enquanto viveram. Mortos os velhos, continuou na mesma casa. Não modificou nada na casa, por preguiça e por falta de dinheiro. Tornou-se frequentador assíduo das festas dos amigos e de vez em quando ia para a cozinha deles, para fazer um prato especial. Os jantares das reuniões de médicos eram comandados por ele. Começou a engordar aos trinta anos e a curva permaneceu ascendente até aos cinquenta, quando se tornou diabético. O diabetes não lhe diminuiu o apetite, nem o crescimento da barriga, que sempre chegava trinta centímetros na frente do seu peito. Ao invés de diminuir os doces da dieta, aumentou o medicamento para o combate ao diabetes. Por dezenas de vezes foi repreendido pelos colegas, por causa da sua irresponsabilidade médica, consigo mesmo. Nunca ouviu os colegas e as leituras atualizadas que fazia sobre o diabetes. Os conselhos viravam piadas e as leituras, apenas passatempo. Certa manhã ele não compareceu ao Posto de Saúde, onde trabalhava. Alguns amigos foram procurá-lo em casa, para verem o que havia acontecido. A porta da casa estava entreaberta, a luz da sala acesa e ele estava estendido no sofá, diante de uma pequena mesa de guloseimas, de que tanto gostava. Não veio receber os amigos à porta, como de costume. As piadas e brincadeiras com as quais recebia os amigos tinham desaparecido. Ele estava inerte. A cidade acabava de perder o seu solteirão mais cobiçado.
