Síndromes do cortador de cana e do uso errado da carteira

Síndromes do cortador de cana e do uso errado da carteira

                              Síndrome do cortador de cana

 

 

 

        Magro, olhos fundos, respiração ofegante, taquicardia de esforço, pele seca, rugas profundas na face, olhar quase parado. Pele grossa queimada pelo sol. Estatura que varia de um metro e sessenta a um metro e setenta e cinco, na média. Sisudo, conversa pouco e quando conversa, fala de sua terra. Roupa suja de poeira, e ou de carvão, mãos, braços e rosto, sujos e  da mesma cor. A saliva é concentrada e a cor varia da cor da poeira à cor do carvão. Urina pouco, bebe muita água, sinais evidentes de desidratação permanente.  É triste. Quando tira os olhos do eito da cana, procura enxergar ao longe o seu futuro, mas em geral vê apenas o seu passado e o  presente, sofridos.  Saudoso da família, muitas vezes se embriaga para sufocar as frustrações, e briga para provar que ainda está vivo. Não pára o trabalho, nem por um minuto, porque cada minuto parado significa alguns pés de cana deixados de cortar. No trabalho pensa pouco, quase nada, porque não pode tirar a concentração do eito. Dorme pouco, porque o corpo massacrado pelo trabalho não tolera a cama por muito tempo.  A cama é dura e o colchão praticamente inexiste.  O lençol é curto, o cobertor da pior qualidade, se cobre o pé, não cobre o peito. Durante as noites de chuva  tenta usá-lo como protetor do frio e da chuva que cai dos telhados rotos, inundando o chão imundo . Levanta cedo, alimenta-se  mal e trabalha em excesso. A cada meta vencida, outra se apresenta mais desafiadora. A comida não lhe supre as calorias necessárias e a sobremesa nunca aparece,  sendo  somente  lembrada nas piadas de mau gosto, do gato , o empreiteiro que o trouxe para a linha de frente do trabalho. O suco mais próximo está na cana semi queimada, torcida entre os lábios, com gosto de vinagre. Se for diabético, hipertenso, ou chagásico, tem os dias contados, no eito. A competição, que estimula a produção, continua enquanto houver uma gota de suor para pingar. O gato  está sempre vigilante: se a produção cai, o conceito cai junto e o emprego periga. O ganho do gato depende da produção de cada trabalhador.  O seu maior amigo é o facão bem amolado, que não sai do seu lado. O cortador de cana não gasta, tudo o que ganha é guardado, para voltar à sua terra natal. O sonho de voltar com dinheiro, nem sempre é realizado. Muitas vezes, nem a volta. Os nossos cemitérios estão recebendo cada vez mais os corpos desses infelizes trabalhadores, que vêm à procura da vida. Alguns não encontram a vida, infelizmente  encontram a morte. A vida do cortador de cana é uma gota d’água num canavial em chamas.

 

 

 

                              Síndrome do uso errado  da carteira.

 

                             Muitos homens têm o hábito de usar a carteira no bolso de trás, da calça. Além disso, ao invés de usarem uma carteira maior, de mão, põem tudo o que cabe e o que não cabe na coitada da carteira que fica estourando de tão cheia. Quando colocada no bolso traseiro da calça, impedem que a nádega e a coluna vertebral lombo-sacra se acomodem no banco do carro ou em outro banco qualquer. Com tal volume o sentar fica totalmente defeituoso. Sabemos que a boa postura recomendada é aquela em que as nádegas e a coluna lombar ficam totalmente aderentes ao encosto posterior do banco do carro.

 Com a carteira em  situação completamente irregular  a pessoa vai sentar-se incomodamente com uma das nádegas mais para frente e outra, mais para trás . Essa má postura vai forçar a bacia, torcendo-a. A bacia torcida vai fazer uma rotação da coluna lombo-sacra e pinçar um dos discos da coluna   lombar e comprimir uma ou mais raízes nervosas. Isto, certamente vai provocar dor na região da inervação de uma ou mais  raízes nervosa. É comum pacientes chegarem com um quadro clínico de compressão de raiz nervosa lombar, simplesmente por usar a carteira no bolso errado. Dei a esse conjunto de sintomas o nome de Síndrome do uso errado da carteira. Em muitos casos basta que a pessoa corrija esse hábito, para que a dor lombar e radicular desapareça. A dor se manifesta com maior ou menor intensidade de acordo com o volume da carteira. Inicicialmente ela aparece como um simples incômodo da musculatura para vertebral lombar e pode  piorar até transformar-se em uma verdadeira dor ciática. Inicialmente não mostra nenhuma alteração ao exame radiológico da bacia e da coluna lombar, mas com o passar do tempo pode mostrar os desvios relatados.  É uma síndrome que aparece somente nos homens, pelo uso errado da carteira no bolso traseiro da calça. Nunca vi essa síndrome em mulher. Podemos rotulá-la como uma doença originada do trabalho, onde não houve a orientação correta para o uso da carteira.

Este é um alerta para pessoas que têm esse hábito incorreto de usar a carteira, e também para os colegas ortopedistas que muitas vezes têm dificuldade de elucidar a origem de uma dor lombo-sacra cujos exames nada revelam inicialmente.

                                                                                                

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