Situações de anormalidade: estado de emergência e estado de calamidade pública

Situações de anormalidade: estado de emergência e estado de calamidade pública

No contexto atual é comum vermos nos jornais e na televisão a utilização de termos como estado de emergência e estado de calamidade pública. Estes termos são chamados formalmente de declaração de situação anormal, utilizados - segundo a Instrução Normativa 02/2016 do ainda então Ministério da Integração Nacional (atual Ministério do Desenvolvimento Regional) - em situações nas quais ocorram um desastre em que seus danos tenham afetado a capacidade de respostas do poder público, municipal, estadual ou federal. Como exemplos da utilização dos termos, pode-se citar a declaração de estado de calamidade pública feita pelos governos federais no início do ano em razão da pandemia do novo coronavírus e a declaração de estado de emergência nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, feita há algumas semanas pelo Ministério da Agricultura em virtude da nuvem de gafanhotos que se aproximava do país.

Ambos os termos têm diferenças entre si e são aplicados em diferentes cenários e situações. O estado de emergência é aplicado em cenários de iminência ou ocorrência de eventos que irão comprometer parcialmente a capacidade de resposta das esferas públicas. Já o estado de calamidade pública é adotado quando o evento já se instalou e comprometeu seriamente a forma de ação das autoridades competentes, acarretando em danos materiais, ambientais e humanos (Fonte: Portal Senado Federal, senado.leg).

A declaração de situação anormal entre essas duas variantes - estado de emergência e estado de calamidade pública - dependerá da intensidade do prejuízo causado por esse desastre ou fenômeno, comparando-a com a capacidade da realização de ações e respostas efetivas passíveis de serem tomadas pelas autoridades locais. Essa intensidade é dividida em três níveis: nível I e nível II, que dão origem ao estado de emergência, e nível III, que dá origem ao estado de calamidade pública (Fonte: Portal gov.br).

No nível I, ocorrem desastres em que existem apenas danos humanos sendo considerados e em que a normalidade pode ser restabelecida de forma rápida por meio dos recursos existentes em nível local – ou por meio de um aporte do governo estadual ou federal. Os desastres de nível II também têm o potencial de serem resolvidos, assim retornando à normalidade rapidamente através da utilização dos recursos em nível local e aportes em nível estadual e federal. Porém, diferentemente do nível I, além de ser preciso ocorrer danos humanos que acarretarão prejuízo econômico à esfera pública, também é necessária a ocorrência de danos em outras esferas: materiais ou ambientais. 

Referindo-se agora ao nível III, ele caracteriza-se por desastres em que os danos e prejuízos não são superáveis pelo governo local no curto prazo. Sendo assim, a normalidade retornará apenas por meio de uma ação conjunta de três esferas de atuação, mais especificamente coordenada pelo Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil, “formada por órgãos e entidades da administração pública federal, estadual e municipal”. (Fonte: Portal do Ministério do Desenvolvimento Regional). Tais desastres podem acarretar, simultaneamente, em interrupção ou interdição de serviços essenciais, óbitos, populações isoladas, destruição ou interdições de moradias e habitações, danificação de obras ou estruturas públicas e prejuízos ao meio ambiente.

No Brasil a declaração de um estado de anormalidade é reservada principalmente às esferas municipais e estaduais. A esfera federal se inclui nesta situação, porém de forma menos comum, como ocorreu na declaração de calamidade pública no início da pandemia do coronavírus. É mais comum a esfera federal declarar o chamado estado de exceção, que de acordo com Gomes e Matos (2017) é “conceituado como medida excepcional à legalidade, sendo autorizado pelo ordenamento diante de situações emergenciais”. Essa medida se caracteriza, principalmente, por uma situação de crise a qual o governo enxerga como ameaça a sua soberania e ordem.

A declaração de anormalidade é feita em nível municipal após a análise dos danos e prejuízos acarretados pelo evento, bem como o nível no qual ele se encontra. O órgão de proteção e defesa civil da cidade, a partir desta análise, emite então um parecer técnico à prefeitura do município explicitando a necessidade de declaração de um estado de anormalidade. Frente a isto, baseando-se no parecer técnico, o Prefeito decreta o estado de emergência ou calamidade pública.

Em esfera estadual, a declaração de estado de anormalidade é feita pelo Governador do estado e ocorre de forma semelhante à declaração feita pela prefeitura de uma cidade; porém, ela acontece quando um determinado evento atinge e inflige danos a mais de um município ao mesmo tempo. Já o parecer técnico é elaborado pela Coordenadoria Estadual de Defesa Civil, e não mais pelo órgão de defesa civil de cada cidade envolvida (Fonte: Portal Ministério do Desenvolvimento Regional, mdr.gov).

Ambos os decretos - tanto os instaurados pelos municípios quanto os instalados pelos estados - devem ter a aprovação da União, que se responsabilizará por alocar os recursos aos municípios e estados afetados pelo desastre. O montante de recurso alocado também é de decisão do Governo Federal, e dependerá do nível de prejuízo e danos causados.

O decreto de um estado de emergência ou calamidade pública tem como objetivo fornecer uma situação jurídica extraordinária, na qual ocorra a facilitação da gestão pública por meio de benefícios que permitam a execução mais rápida de políticas de assistência humanitária e de infraestrutura e que mitiguem os danos e prejuízos do evento causador, promovendo uma recuperação mais rápida da área atingida. Entre esses benefícios estão a possibilidade de dispensar a utilização de processos licitatórios para a aquisição de bens e serviços a serem utilizados para atender a população afetada, bem como para a realização e conclusão de obras de infraestrutura necessárias à situação. Além disso, pode haver a criação de novas linhas de créditos por parte do governo, a possibilidade do estado ou município prorrogar o pagamento de empréstimos federais, a antecipação do benefício social do INSS pela população atingida (correspondente a uma renda mensal) e também a possibilidade de movimentação e saque de parte do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) (Fonte: Portal Ministério do Desenvolvimento Regional, mdr.gov).

Como exemplo de medidas decorrentes da declaração de situação de anormalidade, temos, no contexto do novo coronavírus, a Medida Provisória publicada pelo governo em junho, que permitiu o saque do FGTS em um valor de até R$1045,00; podemos também citar a compra de respiradores importados da China feita pelo governo de São Paulo em caráter de urgência, sem a realização de licitação.

Por fim, resumindo todas as fases e implicações da declaração de situação de anormalidade tem-se que diante de uma situação de anormalidade com relevantes danos e prejuízos, o estado ou município declara situação de emergência ou calamidade pública, e, frente a isso o governo federal analisa o acontecimento, o reconhece e decide as medidas de apoio a serem tomadas; ele então libera recursos à área atingida e todo o aparato assistencial como, por exemplo, a defesa civil militar. O estado ou município atingido pode ainda, prorrogar e parcelar dívidas, não precisa realizar processos licitatórios e sua população tem acesso a antecipação de benefícios sociais e possibilidade de saque do FGTS.

 

Texto escrito por Felipe Augusto Gama Zampollo, estudante de Economia Empresarial e Controladoria na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto

 

Imagem: PxHere

Referências:

GOMES, Ana Suelen Tossige; MATOS, Andityas Soares de Moura Costa. O estado de exceção no Brasil republicano. Rev. Direito Práx.,  Rio de Janeiro ,  v. 8, n. 3, p. 1760-1787,  Julho  2017 .   Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2179-89662017000301760&lng=en&nrm=iso>. access on  29  July  2020.

Sites:

https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/especial-cidadania/defesa-civil/situacao-de-e

mergencia-e-estado-de-calamidade-publica

https://www.mdr.gov.br/protecao-e-defesa-civil/sistema-nacional-de-protecao-e-defesa-civil

https://www.gov.br

https://www.politize.com.br/estado-de-calamidade-publica/

 

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