Verba Pública: de onde vem?

Verba Pública: de onde vem?

Se pedirmos para um cidadão comum enunciar o que é esperado do governo brasileiro, saúde, segurança e educação - todos com um considerável patamar de qualidade - provavelmente estariam entre as principais reivindicações [1]. Pelo menos, é o que a pesquisa Sistema de Indicadores de Percepção Social - Nossos Brasis: prioridades da população constatou. Nos dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a melhoria dos serviços de saúde foi a opção mais assinalada como prioridade pelos entrevistados (87,64%), seguida por uma educação de qualidade (72,97%) e proteção contra o crime e a violência (61,44%). Essas reivindicações são asseguradas pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 6º. Segundo ele, são direitos sociais fundamentais a educação, a saúde, a segurança, e também outras garantias, como a alimentação, o transporte e o lazer [2]. 

No entanto, é importante lembrarmos que a atuação do Estado não se restringe a essas práticas, de modo que outras obrigações também existam, nos mais diversos espectros. As funções do Estado na economia, por exemplo, se dividem em alocação, distribuição e estabilização. A função alocativa diz respeito ao fornecimento de bens que não são comumente ofertados pelo mercado, enquanto a distributiva busca o combate a desequilíbrios regionais e sociais, de modo a promover o desenvolvimento das regiões menos favorecidas. Por fim, a função estabilizadora tem como objetivo o pleno emprego dos recursos econômicos, estabilidade de preços e taxas de câmbio, evitando crises [3]. 

Os exemplos acima foram algumas das mais diversas responsabilidades que o Governo tem. Todavia, há algo em comum entre elas além da busca pelo bem estar social: para a execução de qualquer serviço ou função pública é preciso de verba, desde a concretização de fato das medidas ao pagamento de servidores para trabalhar nesse processo.

Mas de onde esse dinheiro vem? Talvez a primeira palavra que a gente pense seja ‘impostos’, e essa não é uma resposta de fato errada. Ainda que seja a mais conhecida e significativa fonte de recursos públicos, não é a única. No caso da esfera de poder federal, por exemplo, esta receita pode vir também de Contribuições Sociais, aluguéis e venda de bens, prestação de alguns serviços e da venda de títulos do Tesouro Nacional [4].

Porém, vamos concentrar nossa análise na verba pública que sai ‘diretamente’ - e coercitivamente - do bolso dos cidadãos brasileiros. Tendo isso em vista, ao longo deste texto iremos entender melhor as origens da Receita Tributária da União, Estados e municípios.

 

Tributos: o que são?

De acordo com o segundo artigo 2° da Lei 5.172 de 1966, que dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional, tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada [5]. Em outras palavras, os tributos são tudo aquilo que nós brasileiros somos obrigados a pagar ao Estado, devendo este pagamento ser em dinheiro, o que quer dizer que não podemos pagar com imóveis ou outros bens materiais. Além disso, eles possuem como fato gerador algo não ilícito, o que significa que as multas, por exemplo, não são configuradas como tributos, dado que têm origem de alguma infração. A lei também institui que todos os tributos devam ser criados, alterados ou extinguidos com base em outras leis específicas para isso.

Os tributos são divididos em cinco categorias diferentes: impostos, taxas, contribuições sociais, contribuições especiais e empréstimos compulsórios. Vamos conhecê-las melhor!

 

IMPOSTOS

É muito comum que impostos e tributos sejam usados como sinônimos, o que em alguns casos não é verdade. Como o Imposto é um tipo de tributo, podemos afirmar que um Imposto será sempre um tributo, mas o caminho contrário nem sempre vale: um tributo pode não ser um imposto. Pode ser uma taxa ou contribuição.

Mas dito isso, o que é Imposto afinal? Por ser um tributo, é obrigatório e deve ser pago em moeda ou equivalente, porém sua característica principal é não ter uma contraprestação direta do estado. 

De outro modo, isso indica que, ao pagarmos os impostos, seja pelo consumo, renda ou patrimônio, o montante não volta para o contribuinte por meio de um produto ou serviço direto, direcionado a ele. Isso significa que o dinheiro arrecadado com esse tipo de tributo é usado para custear as despesas gerais do governo e serviços indivisíveis, ou seja, serviços em que não é possível determinar quem será beneficiado de fato, como por exemplo a manutenção da iluminação pública em alguma rua. Como não podemos saber de fato quem passará por aquela rua e utilizará o serviço, os custos são rateados para todos os cidadãos.

 

TAXAS

As taxas, ao contrário dos impostos, possuem sim uma contraprestação direta. Isso quer dizer que, quando pagamos este tipo de tributo, em troca, há a prestação de um serviço público ao contribuinte [7]. Por isso, é importante lembrar que as taxas possuem como característica algum serviço específico e divisível, ou seja, um serviço que pode ser identificado e atribuído a quem irá se beneficiar dele. Como exemplo disso, podemos citar algumas taxas para a emissão de documentos, contraprestação do estado que pode reconhecer diretamente quem será favorecido, e, portanto, direcionar os custos para essa pessoa - ou grupo de pessoas.

 

CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA

Imagine que um cidadão comum tenha um imóvel próximo a um terreno vazio, e, tempos depois, a prefeitura decide construir uma praça, teatro, ou qualquer outra obra pública nesse terreno. É provável que o imóvel tenha uma valorização em virtude disso, situação em que a contribuição de melhoria pode ser instituída, pois alguns cidadãos - os proprietários de imóveis na região da construção - certamente irão se beneficiar mais da obra do que outras pessoas. Dessa forma, esse tipo de tributo irá contribuir para o custeio da obra. No entanto, para  que ele possa ser cobrado, deve haver, necessariamente, decorrente da obra em questão, uma valorização econômica do imóvel do pagante [8].

 

CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS

As contribuições sociais, diferentemente dos impostos, taxas e contribuições de melhoria, só podem ser instituídas pela esfera de poder federal. Além disso, esse tipo de tributo, por sua vez, é criado com alguma finalidade social específica, como custear a seguridade social ou corrigir alguma falha de mercado, não tendo, como os outros tributos, o objetivo de suprir o caixa do estado [9]. Como exemplo de contribuição social, podemos ver a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, a CSLL, tributo instituído em 1988 com o fim de financiar a seguridade social do país [10].

 

EMPRÉSTIMOS COMPULSÓRIOS

Os empréstimos compulsórios, assim como as contribuições sociais, também só podem ser instituídos pela União. Para entendermos melhor como funciona esta categoria de tributo, devemos pensar que a sua criação deve envolver algum contexto extraordinário, em que o Governo Federal não é capaz de arcar com as despesas. Sendo assim, com a criação do empréstimo compulsório, de caráter temporário, podemos - coercitivamente - ter de emprestar dinheiro para o Estado em casos de calamidade pública ou guerra, por exemplo. No entanto, como o próprio nome sugere, diferentemente dos outros tributos, ele é restituível depois de determinado tempo, uma vez que o ente arrecadador tem o dever de devolver o valor pago ao contribuinte [11]. 

 

Por fim, convém considerarmos que, embora seja nosso dever como cidadãos pagar os tributos, nosso papel não termina nesse estágio. Muitas demandas são exigidas do Governo como um todo, demandas essas que poderão ser atendidas com a receita dos impostos, taxas, contribuições e empréstimos compulsórios. Dessa forma, para acompanharmos melhor para onde os recursos como um todo estão sendo destinados, podemos acessar o Portal da Transparência dos Órgãos Públicos, no qual é possível ver a parcela da Receita Tributária total aplicada em cada área (saúde, educação, previdência, etc). Sendo assim, poderemos contribuir para o controle social e colaborar para que a verba pública, que agora sabemos melhor de onde vem, volte em forma de serviços e benefícios para cada cidadão brasileiro.

 

Texto escrito por Luma Cicilia Ribeiro Pires, estudante de Economia Empresarial e Controladoria na FEA-USP/RP

Imagem: Farol da Bahia

Referências:

[1]  CAVALCANTI, Pedro. Saúde e educação são as prioridades dos brasileiros. Ipea.gov.br. Disponível em:  https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=20859>. Acesso em: 11 Dec. 2020.

[2] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Senado.leg.br. Disponível em: <https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/CON1988_15.09.2015/art_6_.asp#:~:text=CONSTITUI%C3%87%C3%83O%20DA%20REP%C3%9ABLICA%20FEDERATIVA%20DO%20BRASIL&text=Dos%20Direitos%20Sociais-,Art.,desamparados%2C%20na%20forma%20desta%20Constitui%C3%A7%C3%A3o.>. Acesso em: 11 Dec. 2020.

[3] Módulo. [s.l.: s.n., s.d.]. Disponível em: <https://repositorio.enap.gov.br/bitstream/1/2170/1/Or%C3%A7amento%20P%C3%BAblico%20Conceitos%20B%C3%A1sicos%20-%20M%C3%B3dulo%20%20%281%29.pdf>.

[4] Orçamento da Receita - Portal da transparência. Portaltransparencia.gov.br. Disponível em: <https://portaltransparencia.gov.br/pagina-interna/603237-orcamento-da-receita>. Acesso em: 14 Dec. 2020.

‌[5] L5172. Planalto.gov.br. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/L5172.htm>. Acesso em: 14 Dec. 2020.

[6] O QUE SÃO TRIBUTOS? Portaltributario.com.br. Disponível em: <https://www.portaltributario.com.br/tributario/o_que_e_tributos.htm>. Acesso em: 14 Dec. 2020.

‌[7] Espécies Tributárias: Taxas. DireitoNet. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3584/Especies-Tributarias-Taxas#:~:text=Os%20estudiosos%20do%20Direito%20Financeiro,por%20meio%20de%20um%20taxa.>. Acesso em: 15 Dec. 2020.

‌[8] ESCOLA BRASILEIRA DE DIREITO. Entenda a contribuição de melhoria. Jusbrasil. Disponível em: <https://ebradi.jusbrasil.com.br/artigos/466502021/entenda-a-contribuicao-de-melhoria>. Acesso em: 15 Dec. 2020.

‌[9] REDAÇÃO. Contribuições Sociais: Conheça os principais  detalhes sobre esse tipo de tributo. Rede Jornal Contábil - Contabilidade, MEI , crédito, INSS, Receita Federal. Disponível em: <https://www.jornalcontabil.com.br/contribuicoes-sociais-conheca-os-principais-detalhes-sobre-esse-tipo-de-tributo/>. Acesso em: 15 Dec. 2020.

‌[10] REDAÇÃO. CSLL: O que é e como funciona a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Rede Jornal Contábil - Contabilidade, MEI , crédito, INSS, Receita Federal. Disponível em: <https://www.jornalcontabil.com.br/csll-o-que-e-e-como-funciona-a-contribuicao-social-sobre-o-lucro-liquido/>. Acesso em: 15 Dec. 2020.

‌[11] ESCOLA BRASILEIRA DE DIREITO. O que é empréstimo compulsório? Jusbrasil. Disponível em: <https://ebradi.jusbrasil.com.br/artigos/431715006/o-que-e-emprestimo-compulsorio#:~:text=A%20Uni%C3%A3o%2C%20mediante%20lei%20complementar,despesa%20que%20fundamentou%20sua%20institui%C3%A7%C3%A3o.>. Acesso em: 15 Dec. 2020.

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