A conexão que afasta

A conexão que afasta

Olá pessoal, tudo bem?

Hoje gostaria de convidá-los a pensar sobre o uso cada vez mais frequente de recursos tecnológicos por crianças e adolescentes.  O que vocês pensam sobre o assunto?  Eu tenho percebido, tanto em meu consultório quanto nas ruas e nos locais públicos, que a intensidade do uso de celulares, ipads, computadores e a falta de moderação, monitoramento e cuidado dos pais tem chegado a níveis extremos, o que muito tem me preocupado.  Vejo que os pais estão cada vez mais atarefados e comprometidos com o trabalho, o que influencia no pouco tempo de qualidade que possuem para estar verdadeiramente com seus filhos e, assim o celular ou o computador tornam-se bons e fáceis substitutos do contato humano.

Neste sentido, muitas vezes percebo nos pais uma preocupação rasa com o uso excessivo da tecnologia, isto é,  demonstram uma certa preocupação que não vai além de colocar a culpa no celular ou no computador, como se estes fossem os verdadeiros vilões dessa era moderna. Também é bastante frequente o deslocamento dessa culpa para a criança ou o adolescente, como se estes tivessem condições psíquicas de sozinhos conseguirem se controlar e fazer o uso responsável e saudável da tecnologia. Se é difícil para nós, adultos, nos desligarmos das redes sociais e dos aplicativos, imagina quão complicado é para uma criança que possui uma mente ainda em construção?

Muitas pesquisas têm mostrado que a superexposição a eletrônicos pode ser prejudicial por limitar em grande parte os estímulos do ambiente e, assim, a criança pode tornar-se mais vulnerável a desenvolver transtornos como o déficit de atenção e hiperatividade ou sintomas de ansiedade como impaciência e intolerância frente às frustrações e às situações do cotidiano que envolvem a necessidade de esperar. Penso que isso ocorre, pois a criança não tem sido ajudada pelo seu meio a desenvolver recursos pessoais para esperar o tempo das coisas acontecerem, o que envolve inevitavelmente terem que lidar com a falta e também com o esforço inerente ao processo de construção.

No entanto, o que tem acontecido é que ao invés de sentirem-se entediadas e, por isso, desenvolverem a criatividade e a imaginação para lidar com o que não está ainda pronto, elas têm sido estimuladas a assistir a vídeos ou a jogar joguinhos enquanto o que elas desejam ainda não está à sua disposição. Deste modo, os pais sentem-se mais tranquilos e sossegados mas também evitam que seus filhos sintam o desconforto da espera e deixam de lhes ensinar uma importante lição, que é entender o processo das coisas e não apenas receber o resultado magicamente pronto. Os filhos perdem, assim, a oportunidade de sentir o tempo que leva para um bolo ficar pronto ou não têm a possibilidade de testar sua criatividade na espera por uma consulta médica ou muitas vezes nem experimentam os estímulos do ambiente, pois estão focados no mundo paralelo dos vídeos, jogos, redes sociais, entre outros.  Às vezes fico perplexa ao perceber a baixa tolerância de crianças ainda tão pequenas que sequer conseguem aguardar o tempo de download de um vídeo, pois isto é considerado algo extremamente chato e, então, enquanto o vídeo ainda não foi carregado, elas transferem sua atenção para outros estímulos do celular ou do ipad. Assim, parecem estar sempre ligadas a tudo, no entanto a triste realidade é que não estão de verdade em nenhum lugar. Assustador, não é mesmo?

Mas, o que fazer então se vivemos numa era tão tecnológica? Penso que o equilíbrio é a resposta para essa questão, pois a tecnologia pode trazer muitos benefícios para nossas crianças e adolescentes, no entanto o segredo está no modo como esta é utilizada. Antes de uma criança ser presenteada com um celular ou com um ipad, ela precisa ter experimentado situações da vida real, do contato e convívio humano, do toque, das brincadeiras de faz de conta, da socialização com os pais, com os familiares e com amigos, dos passeios ao ar livre, entre tantos outros momentos fundamentais para o desenvolvimento saudável. Para que isso seja possível é fundamental a presença viva e atenta dos pais com seus filhos, pois presença não é estarem juntos no mesmo cômodo cada um olhando para sua tela, mas sim olharem um para o outro e poderem, a partir disso, construir algo juntos. Acho que esta pode ser uma grande oportunidade para muitas famílias se desconectarem e se reconectarem entre si, possibilitando, assim, a oportunidade de perceberem o potencial que há na interação e que muito tem sido desperdiçado. 

Assim, quando nos conectamos com nós mesmos e com os que estão a nossa volta podemos até conseguir utilizar os recursos tecnológicos de forma mais consciente e atenta, não deixando que estes nos controlem! 

Compartilhar: