A vida é um eterno equilibrar-se

A vida é um eterno equilibrar-se

Viver não é tarefa fácil! Não há receitas e instruções que consigam abarcar a instabilidade inerente ao viver.  Apesar disto ser algo bastante óbvio, percebo que na prática não é bem assim. Ficamos, muitas vezes, tão assustados com a imprevisibilidade a que estamos sujeitos que tentamos de toda forma nos defender da vida e, para isso, utilizamos muitos mecanismos e estratégias que até nos acalmam por um tempo. Mas, é só nos descuidarmos um pouco que somos assaltados por sentimentos, pensamentos e situações que não estavam no roteiro planejado. Aí, dá-lhe coragem para enfrentar o que é que venha pela frente...O dia que prometia ser ensolarado pode dar lugar à chuva, o dia planejado para descansar pode dar lugar à insônia, uma festa previamente marcada pode ser adiada devido à morte de um ente querido, um passeio gostoso com sensação de liberdade e conexão com o mundo pode, inexplicavelmente, levar à sensação de angústia. Enfim, estes são apenas alguns exemplos das inúmeras situações do estar vivo que precisamos constantemente aprender a abraçar e tentar acolher, porque senão viveremos sempre em eterna luta para controlar o que não é controlável.

Lembro aqui de Guimarães Rosa, que sabiamente escreveu: "O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.” Eu acrescentaria que é necessário mesmo muita coragem para conseguirmos não só sobreviver, mas poder alcançar um estado em que seja possível brincar com a vida e fazer poesia com o desconhecido. Muitos pensam que coragem é sinônimo de ausência de medo, mas este é um terrível engano, porque não vivemos sem medo. O que podemos é escolher se vamos tentar criar intimidade com ele e, quiçá, nos tornar amigos ou se vamos encará-lo como inimigo e mantê-lo o mais longe possível. Então, coragem é acolher o medo e fazer parceria com ele, pois o pânico paralisa, o medo não. Dia desses ouvi a expressão "vivendo de medo" e acho que esta é uma boa troca, pois não se morre de medo, visto que a morte é o que finda e não há mais mistério, já a vida é o desconhecido que inicia todo dia, com todas as inúmeras possibilidades de vir a ser.

Como lidar, então, com tudo isso? Penso que muitas vezes o que mais nos atrapalha é a ideia de que as coisas devam ser uma só. Desta forma, muitas vezes achamos que o desenvolvimento deve ser linear e, se um dia estamos desorganizados isso quer dizer que perdemos tudo o que construímos no dia anterior. No entanto, se pudermos entender que o nosso desenvolvimento emocional é feito de constantes oscilações podemos ficar mais tranquilos com o transitar entre diferentes situações e, consequentemente, diferentes estados mentais. Ora estamos alegres, ora tristes, ora bravos e toda essa variedade de sensações podem existir ao mesmo tempo e em uma mesma pessoa. Deste modo, não há nada de errado em um dia estar mais desanimado e repetindo comportamentos que pareciam já "superados" e no outro dia estar com a sensação de que as coisas estão mais equilibradas ou integradas. Penso que justamente por conseguirmos nos entristecer e sentir as próprias dores é que conseguimos também sair delas e sentir outras coisas. O desenvolvimento emocional tem muito mais a ver com poder vivenciar esses diferentes estados mentais, indo e vindo com liberdade, do que com a ideia estanque de ter que sair de um lugar e alcançar outro.

E não é assim em outros âmbitos também? O equilíbrio das pedras nesta foto lhe parece eterno? Será possível estar vivo e fazer parte de algum ambiente e não ser constantemente impactado por ele? Não somos também diariamente afetados pelo nosso ambiente interno marcado pela nossa história pessoal que envolve crenças, vivências e mitos pessoais que deságuam constantemente em nossas novas relações? Se realmente nos relacionamos com o outro com quem estamos e nos permitimos ser tocados e transformados pelo encontro, este também não tem um grande potencial de modificar as construções anteriores? Penso, assim, que podemos até encontrar momentos de equilíbrio como o da imagem acima, mas enquanto estivermos mentalmente vivos e em contato com o ambiente (externo e interno), este equilíbrio não será fixo e estanque, mas sim impermanente, flexível e efêmero. Afinal, a vida não é um jogo em que se esforça para chegar até a última fase e alcançar um estado de completo equilíbrio, mas é, sim, um eterno equilibrar-se!

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