Ponte - Poesia
Com a feiura bela dos recém-nascidos
Veio ao mundo franzina
Com o destino das estatísticas
Esguelhando-se por vida
Às 6
Foi abusada pelo padrasto
Às 12
Era doméstica
Às 16
Era mãe do filho bastardo do patrão
Era demitida
Às 18
Escalou a ponte
Que sombreava a favela
Aos prantos queria voar direto ao chão
Às 19
Transeuntes acusavam
Só quer chamar a atenção
Legitimando as estatísticas
Insensíveis a dor real
Da mulher abusada
Da mulher vitimada
Da mulher violentada
Da mulher esfomeada
Às 20
Agarrada pelo policial
Se apaixonou
Era o primeiro abraço de vida
Negando o passado de morte
Às 21
Acariciando as cicatrizes
Pedindo licença
Respirou e seguiu
Às 22
Havia pouco tempo para sobreviver
Apenas
Ergueu os olhos e a voz
Denunciando as amarras que a feria
Às 23
Fez por outras
O que não fizeram por si
(Wlaumir Souza)