Elas no agronegócio

Elas no agronegócio

A participação da mulher em atividades relacionadas à gestão do setor agro deu um salto significativo nos últimos quatro anos, passando de 10% para 31%

Mônika reconhece que as mulheres estão se preparando melhor para o setor agroCelebrado no dia 15 de outubro, o Dia Internacional da Mulher Rural reforça que os negócios relacionados ao campo também já fazem parte do universo feminino. No entanto, apesar de se imaginar que a presença delas nesse meio tenha crescido significativamente, não há dados precisos sobre a quantidade de mulheres que atuam no agronegócio. O que dá para afirmar sem medo de errar é que sua presença tem sido determinante para o crescimento do setor, que representa 23% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Pelo menos, essa é uma das conclusões da 7ª edição da Pesquisa Hábitos do Produtor Rural, realizada pela Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA).

O objetivo do trabalho é identificar o perfil dos produtores rurais brasileiros e contribuir para o raio X do setor primário no país, destacando os novos agentes influenciadores. Para isso, foram ouvidos 2.835 agricultores e produtores de animais de 15 estados de todas as regiões brasileiras. A investigação identificou que a idade média dos produtores rurais é de 46,5 anos — no estudo anterior, realizado em 2013, essa média era de 48 anos. Além disso, aproximadamente 21% deles têm curso superior, com destaque para formação em Agronomia (42%), Veterinária (9%) e Administração de Empresas (7%).

A presença da mulher em funções de decisão nos empreendimentos rurais também apresentou um salto importante nos últimos quatro anos, passando de 10% para 31%. Nas pequenas propriedades, sua participação também tem aumentado significativamente. Dados do Anuário Brasileiro da Agricultura Familiar apontam que cerca de 13% dos mais de 600 mil estabelecimentos rurais no país são dirigidos por elas. A presença feminina na agricultura familiar também cresceu. No total, o setor conta com a força de trabalho de quase 5 milhões de mulheres, ou seja, quase um terço da mão de obra rural no país.

Entre essas mulheres está a engenheira agrônoma Mônika Carneiro Meira Bergamaschi, que cresceu no campo e foi a primeira mulher a assumir a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Hoje, está à frente da presidência executiva do Instituto Brasileiro para Inovação e Sustentabilidade do Agronegócio (IBISA) e do Conselho Diretor da Associação Brasileira do Agronegócio da Região de Ribeirão Preto (ABAG/RP). Desde criança, Mônika foi incentivada a plantar, a cuidar e a criar. A relação com esse universo fez com que escolhesse o curso de Engenharia Agronômica. 

Depois de mais de 20 anos dedicados ao trabalho em associações de classe, Mônika revela que um dos grandes desafios encarados até aqui foi comandar a Secretaria de Agricultura, por toda a complexidade que deriva de sua grande estrutura. Considerando cada passo percorrido um incentivo para continuar, Mônika reconhece que essa experiência foi muito enriquecedora. À frente do cargo, realizou eventos em 362 dos 645 municípios paulistas, identificando características comuns a todos os lugares visitados, entre elas, o respeito e o carinho de seus habitantes — até excessivos em alguns casos, segundo ela. “Curiosamente, centenas de mulheres se manifestaram satisfeitas, representadas, felizes, valorizadas, honradas e até mesmo ‘vingadas’, simplesmente pelo fato do cargo ser ocupado por uma mulher”, relembra a engenheira agronômica. 

Segundo a engenheira agrônoma, a crescente participação das mulheres em diversas atividades do agronegócio se justifica na sua preparação para as diversas funções. Quando iniciou a graduação, na Unesp de Jaboticabal, as meninas da turma significavam pouco mais de 10% dos alunos. Como docente do Departamento de Economia da mesma Faculdade, função que exerceu por dez anos, pôde perceber o maior interesse das jovens pelas ciências agrárias. “Hoje, elas são maioria na graduação e estão participando mais de cursos de especialização e de pós-graduação. Essas profissionais estão aptas a ocupar postos no mercado de trabalho e vieram para somar”, observa a gestora, lamentando que ainda haja uma distorção sexista no mercado, especialmente relacionada às condições do ambiente de trabalho e aos salários, que deve e merece ser resolvida.

Ganhando espaço

Cláudia acredita que a representatividade feminina acontece em todas as áreasAdvogada e responsável pelo setor administrativo da Destilaria Santa Inês, unidade do Grupo Viralcool, Cláudia Tonielo vivencia o agronegócio desde a infância e costuma dizer que nasceu “no meio da cana”. Até os 14 anos, morou em uma casa na própria destilaria e, somente depois dessa idade,  foi conhecer outro tipo de cultura. “O agro faz parte da minha vida desde que me conheço por gente porque sempre vi o meu pai, Antonio, trabalhando nesse meio, assim como meu avô, Eduardo, que me ensinou a fazer contas para que eu pudesse ajudar a atender as pessoas que vinham de diversos lugares para comprar aguardente na porta de casa, que, na época, chamava-se Engenho Toniello. Tudo isso é muito presente na minha memória e marcou a minha infância”, revela Cláudia.

Hoje, tem voz ativa nas decisões da empresa, atuando junto ao setor administrativo, onde acompanha de perto o departamento de Recursos Humanos. Também cuida da parte social da empresa, que mantém vários projetos, como o Jovem Agricultor do Futuro e a biblioteca, criada para incentivar a leitura entre os colaboradores. Presidente do LIDE Mulher Agronegócio Ribeirão Preto, Cláudia antecipa que pretende colocar algumas ideias em prática. Uma delas é a realização de um encontro entre mulheres do agronegócio durante a Fenasucro & Agrocana 2017. “Queremos destacar a presença e a participação da mulher no setor, mostrar a força que elas têm no agronegócio, além de facilitar nosso entrosamento e a troca de experiências”, aponta.

A advogada acredita que a maior representatividade feminina no setor agro acompanha a tendência verificada em inúmeros áreas. Na própria destilaria, as mulheres estão por toda parte, do laboratório ao campo, pilotando grandes máquinas agrícolas. Segundo Cláudia, as mulheres estão mais presentes na distribuição e um pouco menos na indústria por ter alguns serviços mais pesados, com exceção do laboratório. O campo sempre contou com a participação delas, que trabalhavam no corte manual da cana, atividade praticamente extinta devido à mecanização. Hoje, elas dirigem colhedoras e caminhões, fazem análises laboratoriais, realizam pesquisas, comandam o setor de recursos humanos, presidem empresas. Viemos para ficar”, reforça a executiva.

Hora e lugar certos

“Sempre busquei alternativas e venci, tudo feito com muita dedicação ao trabalho”, pontua ReginaPara Regina Margarido, zootecnista e gerente de Nutrição Animal da Biosev, que integra o Grupo Louis Dreyfus, seu contato com o agronegócio começou na faculdade, quando optou pela formação que teria. Graduada, casou-se com um engenheiro agrônomo e pecuarista e foi morar em Morro Agudo. Na nova cidade, descobriu que a Usina Vale do Rosário estava implantando um projeto de confinamento que utilizaria subproduto da indústria sucroalcooleira e entrou em contato. “Estava no lugar certo e na hora certa, pois fui contratada para um trabalho pioneiro. No primeiro ano, confinamos 600 bois, no ano seguinte, 1.200 e, no terceiro, 3.600. A partir daí, não paramos mais e percebi que o agronegócio havia, definitivamente, entrado na minha”, relata.

Pecuarista e vice-presidente do Núcleo Feminino do Agronegócio (NFA), Regina observa que, no início da carreira, ficou um pouco insegura. Aos 23 anos, encontrou um ambiente tradicionalmente liderado por homens. A vantagem é que começou a atuar em uma atividade pouco conhecida, o confinamento. “Meu diretor à época disse que tudo seria uma questão de postura, de se fazer respeitar. Assim, levantei a cabeça, segui em frente, busquei alternativas e venci, sempre com muita dedicação ao trabalho”, reforça Regina.

O maior desafio, segundo a própria zootecnista, foi administrar carreira, marido, filhos e casa. Regina acredita que, apesar da mulher ter capacidade de realizar várias tarefas ao mesmo tempo, em alguns momentos, ela falha, seja por deixar de buscar o filho na escola, por chegar atrasada na comemoração do Dia das Mães ou até mesmo por pular a cerimônia e encontrar com o marido diretamente na festa de casamento de um amigo. “Apesar disso, tenho comigo que, se falhei em algum momento pela falta de tempo, procurei compensar em qualidade e exemplo. Tenho um filho de 19 anos que diz ter muito orgulho de mim e da profissional que me tornei”, argumenta.

Regina é vice-presidente do NFA desde janeiro deste ano, tendo Carmem Perez como presidente. O Núcleo objetiva congregar produtoras rurais para troca de experiências profissionais e para fortalecer os processos produtivos, buscando soluções para os desafios do crescimento do agronegócio. Isso tudo é feito com o devido respeito às novas exigências impostas pelo mercado e pela legislação. Com 21 integrantes, o grupo é formado por produtoras de 11 estados e que trabalham com diversas raças, tanto para fins comerciais quanto aprimoramento genético, de Nelore, Guzerá, Tabapuã, Brangus, Angus, Bonsmara, Simental, Sindi, Marchigiana e Holandês. 

Posicionamento Firme

Foto: Ewerton AlvesMirela Cristina Gradim, superintendente da Cooperativa Agroindustrial (Coplana), dedica-se ao agronegócio há 22 anos, sendo 11 anos ao setor sucroenergético e 11 anos ao universo das cooperativas. Atuante no Núcleo das Mulheres da Coplana, órgão destinado a cooperadas, esposas, filhas e netas de cooperados, incentiva o desenvolvimento pessoal feminino e discute temas como sucessão, liderança, mulher no agronegócio e motivação. Desde o primeiro emprego no Sindicato Rural de Taquaritinga, o setor agro sempre esteve vinculado à sua vida. Trabalhar na Coplana, segundo Mirela, proporciona desafios constantes e muitas gratificações. Não há muitas mulheres na liderança dentro das cooperativas, sendo a única no Estado de São Paulo. “Ainda existe muito preconceito, porém, aos poucos é possível conquistar a confiança de todos. O mais importante é ter um posicionamento firme, mostrar competência e resultados concretos. Daí, o relacionamento fica muito mais fácil”, explica a diretora, que vê o sistema cooperativo com muito otimismo. Segundo Mirela, através de uma cooperativa, o produtor fica sabendo das melhores tecnologias e produtos para o campo, tem acesso gratuito a treinamentos voltados à área técnica, pessoal e de gestão. Desta forma, o cooperado melhora sua produtividade e administra melhor seus custos e sua rentabilidade.

Desafio diário 

Jéssika divide o seu tempo entre várias paixões: o trabalho, o gado e os cavalosFormada em Administração de Empresas, Jéssika Monassi Telles, diretora administrativa da Tracan, divide-se entre o trabalho e a paixão pelos cavalos. Na empresa, é responsável pelas equipes dos setores financeiro, recursos humanos, contabilidade, fiscal, faturamento, tecnologia da informação e controladoria. Seu desafio diário está alicerçado em melhorar a eficiência dos negócios. “Buscamos melhores indicadores de desempenho, pois contra números não há argumentos, eles falam. Transformei essas duas frases em meu lema de trabalho”, enfatiza Jéssika, que cresceu vendo o pai, Arthur, atuando nesse setor. Apesar de todas as interações anteriores com as lavouras, sua proximidade com o agronegócio aumentou depois do casamento com Rafael Telles, que apresentou os cavalos Quarto de Milha e o gado Senepol à esposa. “Iniciamos o criatório Senepol da Barra em 2014. Tanto o gado quanto os cavalos me deixaram muito impressionada: além da extrema docilidade, têm uma beleza sem igual. Assim eu me apaixonei ainda mais pelo mundo agro”, destaca Jéssika, que disputa provas de equitação na modalidade Rédeas. “Pela rotina atribulada, não monto há muito tempo, mas as horas que tenho livre são dedicadas à montaria. Em uma competição, sempre busco o meu melhor e boas notas”, garante a amazona.

Preparadas e conectadas

60% das mulheres no campo têm curso superior.
25% possuem pós-graduação e 88% são independentes financeiramente.
71% já vivenciaram alguma discriminação: não serem obedecidas pelos funcionários (43%) e resistência da família. quando manifestam interesse pelo negócio (41%) são as principais manifestações.
69% acessam a web todos os dias — na população brasileira, o percentual é de 48%.
80% usam redes sociais.

Fonte: Fran6 Pesquisa e Biomarketing Consultoria & Agência
Texto: Rose Rubini
Fotos: Júlio Sian

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