Pedal para que te quero

Pedal para que te quero

Ciclofaixa de Lazer de Ribeirão Preto completa sete anos e se consolida como opção de passeio e diversão aos domingos, com média de público semanal de 5 mil ciclistas

João Paulo, Mariene e Alice saem de São José do Rio Pardo para pedalar em Ribeirão PretoDomingo é dia de dormir até mais tarde, especialmente se a noite de sábado foi animada e a balada forte. Certo? Nem sempre. Para cerca de 5 mil pessoas, semanalmente, as manhãs dos domingos são sinônimo de exercícios físicos. Mas não é qualquer prática esportiva, não. Uma atividade específica caiu nas graças de Ribeirão Preto: as pedaladas na Ciclofaixa de Lazer da cidade. 

O percurso une os parques Luiz Roberto Jábali (Curupira), no bairro Ribeirânia, e Luis Carlos Raya, no Jardim Botânico. Nos dois locais é possível alugar as bicicletas para pedalar. O trajeto de seis quilômetros, cuja maior extensão passa pela Avenida Maurilio Biagi, é o mesmo desde a inauguração do projeto, há sete anos, em setembro de 2010. Desde então, a iniciativa, que é a segunda no Estado de São Paulo, se popularizou entre moradores de Ribeirão Preto e da região. O percurso continua o mesmo, mas a organização e o conceito cresceram. 

O diretor da Associação Terra de Ciclismo e coordenador da Ciclofaixa de Lazer, Danilo Terra, relembra o nascimento da iniciativa. “Buscamos inspiração no modelo da capital, que é a primeira do Brasil e foi inaugurada há oito anos. Levei esse projeto para a então candidata à prefeitura Dárcy Vera, em 2008. Conseguimos firmar uma parceria com a iniciativa privada e felizmente o projeto deu certo”, conta.

Rodrigo, Daniela e o filho aprovam a Ciclofaixa de LazerTerra lembra que, inicialmente, como toda ideia nova, a ação sofreu certa resistência. A interdição de uma faixa de trânsito em todo o trajeto foi uma novidade para os motoristas e alterou a rotina de quem precisava trafegar pelas vias que compõem a rota dos ciclistas. Hoje, no entanto, a adesão popular cresceu e se sustentou. O coordenador da Ciclofaixa de Lazer acredita que o respeito também aumentou. “O desrespeito e a insatisfação dos motoristas diminuíram. Além disso, estamos sempre fazendo campanhas educativas, para que sejam respeitados o semáforo fechado e os cavaletes, ainda que não haja cruzamento de veículos liberado em alguns trechos do percurso”, diz.

O resultado do trabalho de conscientização tem surtido efeitos positivos em quem visita o circuito aos domingos, como o engenheiro civil José Luiz Camarero Neto e a jornalista Lívia Borges dos Santos. Com frequência, o casal aluga bicicletas e leva os filhos Felipe, de cinco anos, e Luiza, de três, para um passeio na Ciclofaixa de Lazer. Em geral, a família dá uma volta no percurso e para no Parque Curupira. “Preferimos sempre vir mais cedo, porque o Sol está mais ameno e é melhor para as crianças. Sempre que podemos, nós estamos aqui. O Felipe e a Luiza gostam muito de passear e adoram parar no parque para brincar”, afirma Neto. Segundo Lívia, a organização do projeto é adequada para receber os ciclistas. “Nós utilizamos a água disponível no caminhão do Daerp [Departamento de Água e Esgoto de Ribeirão Preto] no meio do trajeto e os banheiros dos parques. Acho a estrutura bem completa para receber as pessoas”, elogia.

Montagem

É justamente a preparação de toda a estrutura da Ciclofaixa de Lazer que compõe a parte mais intensa e trabalhosa do projeto. Danilo Terra compara a montagem do circuito à realização de um evento a cada semana. Ele explica que os trabalhos começam na véspera: aos sábados, a organização tem início às 12h, quando dois caminhões alugados pela equipe são carregados com os cones e cavaletes que delimitam a pista destinada aos ciclistas, além das bicicletas que ficam disponíveis para aluguel nos parques. O aluguel das bikes – cujos preços variam de acordo com as especificidades de cada uma – está disponível nos parques Curupira e Raya.

No depósito onde ficam os equipamentos, há dois funcionários fixos que prestam serviços. Já no percurso, o número de colaboradores que trabalham a cada domingo varia de 32 a 36, dependendo das necessidades e da circulação. No domingo, a movimentação tem início às 5h, quando começa a montagem da Ciclofaixa de Lazer. “A nossa equipe começa cedo e eu tenho certeza de que o projeto tem caminhado bem por causa do comprometimento das pessoas que trabalham com a gente. Muitos estão desde o princípio e nós nos tornamos uma família”, diz Terra.

Simpatia

E essa família tem seus entes de destaque. “E aí, paizão!”, “Bom domingo para você!”, “Mais uma volta, campeãs? Estão andando rápido hoje”. Quem frequenta a ciclofaixa e passa pela Avenida Carlos Eduardo de Gasperi Consoni, próximo ao Parque Raya, certamente já se deparou com o Wagner Rodrigues da Silva. O monitor, que está há um ano e meio no projeto, chama a atenção pelas saudações animadas e mantém o pique das 5h, quando chega ao trabalho dominical, até as 16h, quando a desmontagem dos equipamentos é concluída. No entanto, o enérgico colaborador que brada cumprimentos simpáticos se revelou tímido para entrevistas. Simples e sucinto, ele se diz feliz em participar da ciclofaixa. “É muito bom trabalhar aqui. Para mim é um prazer”, afirma, entre sorrisos aos ciclistas. 

O monitor Wagner esbanja simpatia entre cumprimentos na ciclofaixaA alegria de Wagner reflete no bom humor dos usuários da ciclofaixa. O comportamento da equipe agrada o administrador Rodrigo de Andrade Pinheiro e a funcionária pública Daniela Guerra Pinheiro. O casal, que pedala junto do filho Rodrigo, de cinco anos, considera os monitores simpáticos e a ação organizada. “Alugamos as bicicletas e participamos com frequência. Acho que os motoristas têm respeitado cada vez mais o projeto e a iniciativa é muito legal para a cidade”, diz Daniela.

A fama da Ciclofaixa de Lazer de Ribeirão Preto tem crescido tanto que a ação atrai moradores da região. Segundo Danilo Terra, o cadastro de aluguel de bikes já ultrapassa os 25 mil nomes e muitos deles são de visitantes de outras cidades. É o caso do corretor de seguros João Paulo Lopes Guerra e da auxiliar de escritório Mariene Trevizan. Os dois atendem à demanda da filha, Alice, de cinco anos, que constantemente pede para passear. Em média, a cada três meses a família de São José do Rio Pardo, então, desembarca em Ribeirão Preto para uma pedalada. “Costumamos dar duas voltas em uma hora, mais ou menos. Depois tomamos água no parque e descansamos. É um passeio muito agradável”, afirma Guerra. Para Mariene, o projeto deveria ser também implantado em outros municípios. “Seria ótimo se tivesse uma iniciativa como essa em nossa cidade. É uma atração que faz a gente querer vir mais vezes”, diz.

Ainda que a ciclofaixa tenha crescido em popularidade, a Empresa de Trânsito e Transporte Urbano de Ribeirão Preto (Transerp) afirma que não há previsão de ampliação ou iniciativas para o incremento da ação. Por meio de nota, a assessoria de imprensa da empresa esclarece que o aumento do projeto teria de levar em consideração a necessidade de mais patrocinadores e funcionários, além da escolha de um local adequado.

Embora pareça uma iniciativa pública, quem financia a Ciclofaixa de Lazer é a iniciativa privada. Todos os recursos para manter o trabalho de pé vêm de patrocinadores, que têm as marcas divulgadas por meio de alguns modelos de publicidade. “Temos várias cotas de patrocínio, que variam de R$ 600 a R$ 8 mil mensais. Para isso, usamos painéis nos parques, logomarca nas camisetas dos monitores e também os chamados ‘pirulitos’, que são colocados em cada cone que delimita o percurso com imagens das empresas que apoiam a iniciativa”, explica.

Novo serviço

Entre as ações propostas pela equipe da ciclofaixa aos amantes do pedal que também podem incrementar o orçamento do projeto está a recente contratação do serviço para eventos específicos e passeios, pontuais ou fixos. Na iniciativa, toda a estrutura proporcionada aos ciclistas fica à disposição de empresas. Os interessados contam com até 200 bicicletas, monitores treinados no percurso escolhido pelo contratante e a organização do evento – que inclui trâmites burocráticos e autorizações junto aos órgãos competentes. “A ideia é dar às empresas e interessados uma oportunidade de reunir amigos, clientes, colaboradores e seus familiares em um programa de interação e confraternização que seja diferente do habitual. Que sirva como um momento de lazer e saúde ao mesmo tempo. Também, quem sabe, despertar o interesse de mais gente para o esporte e para hábitos saudáveis”, diz o coordenador da Ciclofaixa em Ribeirão Preto. O orçamento para contratação do serviço pode ser feito pelo telefone 3329-3989 ou pelo e-mail contato @ciclofaixa.com.br. Por esses contatos também é possível tirar dúvidas sobre o patrocínio ao projeto.

Desafios

Em sete anos de existência, a ciclofaixa acumula conquistas, mas também se depara com desafios. Para Danilo Terra, o principal deles tem a ver com a conscientização. “O comportamento dos motoristas melhorou muito ao longo desse tempo, mas temos dificuldades também com os próprios ciclistas. Ali é um lugar de passeio e não de corrida. Algumas pessoas que pedalam profissionalmente acabam se empolgando e correm na pista. A nossa ciclofaixa é um lugar de lazer, onde há muitas famílias e crianças e o ritmo é mais lento”, conta. Terra destaca que o cunho do projeto é essencialmente cidadão. “A razão de ser do nosso trabalho é educacional, por isso fazemos tantas campanhas e sempre buscamos conscientizar as pessoas sobre um trânsito mais pacífico”, explica.

Ainda que todo processo educativo seja longo e trabalhoso, Ribeirão Preto já começou a trilhar uma rota exemplar. Com o sucesso da ciclofaixa, quem pedala e avança no município não são apenas os ciclistas, mas também a cidadania. 

Ciclofaixa e cicloviaDanilo Terra

O coordenador da Ciclofaixa de Ribeirão Preto, Danilo Terra, destaca a diferença entre ciclovias e ciclofaixas de lazer. Segundo Terra, as ciclofaixas introduzem o hábito das pedaladas. Já as ciclovias são utilizadas para o transporte e deslocamento de ciclistas em atividades diárias. “A ciclofaixa não tira a importância da ciclovia e vice-versa. São iniciativas diferentes”, diz.

Em Ribeirão Preto, a Avenida Henri Nestlé, na Região Leste da cidade, possui uma ciclovia. São 2.235 metros de extensão que passam sobre um viaduto da Via Anhanguera.

Em 2014, a Prefeitura de Ribeirão Preto elaborou um projeto para a expansão de ciclovias na cidade. A ideia é implantar 30 quilômetros desse tipo de via no município. As obras serão financiadas junto ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Mobilidade.

No ritmo certo

Dar voltas de bike aos finais de semana pode ser um bom pontapé inicial para uma vida mais saudável. De acordo com o educador físico e um dos diretores da Corpore, Gustavo Gironi, andar de bicicleta é um exercício de baixo impacto que traz benefícios ao praticante. “Pedalar regularmente reduz o estresse, melhora a capacidade cardiorrespiratória e reduz a glicemia sanguínea, além de aumentar o gasto calórico”, afirma. 

Gustavo GironiNo entanto, segundo Gironi, é importante tomar algumas precauções para o início da prática. “O primeiro passo para começar qualquer atividade física é passar por um médico cardiologista e realizar exames clínicos. Quando estiver pronto para as pedaladas, é importante verificar as características da bicicleta, para ter certeza de que o tamanho do quadro é adequado e de que as alturas do banco e do guidão estão de acordo”, explica.

O educador físico ressalta que quem não pratica exercícios regularmente precisa de cautela para dar as primeiras pedaladas. “De preferência, inicialmente, o ideal é pedalar em percursos planos e num ritmo leve. Depois, a pessoa pode aumentar gradativamente tanto o ritmo quanto as distâncias, de acordo com a melhora de seu condicionamento”, diz.

Gironi completa que o ideal é utilizar sempre equipamentos adequados, como capacetes, luvas, óculos e roupas adequadas. Além disso, estar acompanhado de uma garrafinha de água também é imprescindível. 

Com todas essas dicas e sugestões, o caminho parece estar livre: não há mais desculpas para não arriscar algumas pedaladas na Ciclofaixa de Lazer. 

Texto: Marina Aranha
Fotos: Ibraim Leão

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