Arte como resgate social

Arte como resgate social

Evento de grafite foi marcado por ações de organizações sociais de Ribeirão Preto e contou com artistas de grafite local e nacional

Com o tema “Um caminho sem drogas”, o evento intitulado “Graffitti ao pé da letra”, realizado no último fim de semana, trouxe à tona a discussão da luta contra o vício e a arte que revitaliza espaços urbanos. O projeto reuniu grandes artistas do Brasil na Avenida Bandeirantes, na Vila Virgínia. Mais de 100 metros de muro da antiga Ramazini foram pintados com variados estilos e técnicas. O local onde foi realizada a ação é considerado a “Cracolândia da cidade”. Apresentações de DJs, food trucks e outras atrações fizeram parte da programação, além da presença de algumas Organizações não Governamentais (ONGs) convidadas, todas voltadas a atender pessoas em situação de rua — álcool ou drogas. A ação foi promovida pelo artista Lelin Alves e teve apoio da marca de produtos Black Barts.
“Não pensamos em só fazer grafite, mas nos comunicar com quem passa por aqui”, lembra Lelin
Segundo Lelin, a região merecia essa atenção, pois estava inacessível a famílias, que sempre têm receio de passar pelo local. “No lugar, circulam muitos usuários de drogas e moradores de rua. Queríamos fazer um evento para chamar atenção do poder público para que revitalize o espaço. Não pensamos em só fazer grafite, mas nos comunicar com quem passa por aqui. Há 20 anos trabalhando com essa arte, percebo que essas pessoas são as que mais apreciam nosso trabalho, comunicam-se mais e se sentem representadas no muro. Acredito que ele será um dos mais importantes da cidade”, acrescenta. 
Paula: “Se todos tivessem um olhar mais humano, certamente já teríamos avançado mais”
Uma das instituições presentes no evento, o Projeto Mudando Vidas acolhe cerca de 20 pessoas ao mês acima dos 18 anos. Há cinco anos engajada nessa causa, Paula Tostes, coordenadora pedagógica do projeto, diz que é preciso deixar de transferir somente ao poder público a responsabilidade de cuidar desses espaços ou de acolher essas pessoas. De acordo com ela, é preciso que pessoas se unam mais em torno de causas desse cunho para ter a possibilidade de mudanças significativas. “Nós também temos o dever de ajudar. Se todos tivessem um olhar mais humano, certamente já teríamos avançado mais. O evento foi uma forma de misturar arte e população de rua, que não tem acesso a essa cultura, além de deixar a cidade mais bonita”, destaca a coordenadora.
“Estamos revitalizando uma área ociosa, que apresenta problema com entulho, buracos e falta de iluminação”, destaca Onesto
O evento ainda trouxe artistas importantes, como Alex Hornest, o Onesto, e Antônio Carlos Lima, o Ton, que morou em Ribeirão Preto por 12 anos. Eles deixaram marcas no muro que deram cor a uma região dominada pelas drogas. “O grafite é uma expressão que veio para descaracterizar todas as inserções em galerias e museus. Os artistas saem para buscar seu espaço e, aqui, revitalizamos uma área ociosa, que apresenta problema com entulho, buracos e falta de iluminação. A partir dessas ações, geramos outras”, reforça Onesto, que há 25 anos faz grafite e tem obras expostas em algumas cidades do mundo. Ele é um pintor e escultor que vive e trabalha em São Paulo, cidade que o inspira e faz refletir sobre temas urbanos, lúdicos e introspectivos. Sendo assim, os trabalhos de Ornesto são voltados para a relação entre as cidades e seus habitantes.
Fernando teve a ideia de revitalizar o muro da própria empresa a fim de proporcionar um ambiente mais bonito aos moradores
A ideia de desenvolver a ação partiu do fundador da Black Barts  — marca de produtos para barba e cabelos — Fernando Cantolini Sichieri, que, juntamente com Lelin, promoveu o evento com forte apelo social. O muro é a fachada da empresa de Fernando, que há tempos já vinha pensando em revitalizar o espaço e oferecer um ambiente agradável para quem trabalha no local, bem como para pessoas que passam pela região. “Ganhamos até iluminação do poder público. Nós ajudamos a limpar o entulho que tinha ao redor, mas é preciso mais. Não podemos parar. Queremos que esse evento aconteça mais vezes para reunir toda essa galera que esteve aqui. Elas circulavam de cabeça baixa e foi bom ver que já passaram aqui sorrindo. Não podemos parar. Precisamos fazer acontecer”, conclui o empresário. 
Para Ton, o evento estimula o diálogo entre poder público e sociedade
Para Ton, professor de artes e grafiteiro, o evento estimula o diálogo entre poder público, iniciativa privada e classe artística. “Mais do que nunca, nessa relação contemporânea de problematização de muitas questões, iniciativas assim se tornam oportunidade e — por que não — opção”, diz. 

Texto: Bruna Romão || Foto: Pedro Misawa.

Compartilhar: