Memórias de um mega-assalto

Memórias de um mega-assalto

Um ano após o roubo na empresa de transporte de valores Prosegur, nos Campos Elíseos, moradores relembram a madrugada de tiroteio e explosões e confessam conviver, ainda, com o medo e a insegurança

No dia 5 de julho, o maior assalto da história de Ribeirão Preto completou um ano. Nesta data, em 2016, uma quadrilha cercou a empresa de transporte de valores Prosegur, na Avenida da Saudade, no bairro Campos Elíseos, e roubou R$ 51,2 milhões.

De acordo com o delegado João Osinski, investigações já foram fechadas; caso está na justiçaEmpresa destruída, várias casas e carros danificados, queda de energia, falta de água, duas pessoas mortas e várias feridas: este foi o resultado do crime. Centenas de pessoas acordaram assustadas naquela madrugada, com estouros de dinamite e intenso tiroteio vindos da empresa. Mesmo um ano após o mega-assalto, o trauma continua para moradores da região.

A atendente de 19 anos, Karol Santos, conta o drama que viveu naquele final de madrugada. “Acordei e me joguei ao chão. A primeira coisa que passou pela cabeça quando percebi se tratar de tiros foi que eu não queria morrer e não queria perder minha família”, relembra.

A jovem diz que, naquele período, o telefonema para o 190 não funcionou, pois a demanda de ligações para a Polícia Militar devia estar alta. “Ficamos várias horas nesse caos. A impressão é de que eles estavam na nossa varanda, pois o barulho era muito próximo. A sensação que fica agora é de medo e insegurança. O bairro Campos Elíseos nunca foi um seguro, mas esta data se tornou inesquecível”, conta a atendente.

A Polícia Militar (PM) estima que a ação tenha sido realizada por mais de 20 criminosos que estavam em 10 veículos. Na fuga, alguns moradores foram rendidos e tiveram os veículos roubados. Na altura do km 321 da Rodovia Anhanguera, o cabo da Polícia Rodoviária, Tarcísio Wilker Gomes, que fazia patrulhamento, foi morto pelos assaltantes com um tiro na cabeça. No local do crime, um homem morreu em consequência de queimaduras. Ubiratan Soares Berto estava escondido do tiroteio embaixo de um dos veículos incendiados pelos ladrões.

Os trabalhos, durante e depois da ação dos assaltantes, mobilizaram as Polícias Militar e Civil e também a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, representada pelo secretário Mágino Alves Barbosa Filho. A autoridade esteve na cidade logo após a ocorrência e afirmou que a prisão da quadrilha era prioridade e questão de honra para a Polícia do Estado. No mesmo dia da ocorrência, a Polícia identificou a casa que serviu de abrigo para os assaltantes, localizada no bairro Chácaras Rio Pardo. 

Por causa dos disparos e das bombas, a CPFL Paulista informou que cinco transformadores da rede de distribuição de energia foram danificados, resultando no desligamento de um alimentador para 2.265 clientes. A queda da energia também afetou o fornecimento de água em cinco bairros da cidade. 

De acordo com o delegado da Polícia Civil, João Osinski, o caso já foi fechado pela polícia. “A Polícia já prendeu envolvidos, mas quem cuida do crime, neste momento, é a justiça, que aceitou a denúncia no início do ano”, explica. 
Oito pessoas foram acusadas de participação no mega-assalto à empresa Prosegur. Os réus respondem por organização criminosa armada, latrocínio múltiplo, entre outros delitos cujas penas, somadas, ultrapassam 100 anos de prisão, segundo informações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). O caso corre em segredo de Justiça. No final de 2016, a Prosegur desativou a antiga sede por questões de segurança e abriu uma nova base, no Parque Industrial Lagoinha.

Adelia Guarin, de 38 anos, diz que tem medo de que aquela situação volte a acontecer. “Ficamos desesperados e não conseguíamos nos mexer na nossa própria cama. Pensei que seria meu último dia de vida. O trauma não vai embora, qualquer bombinha ou rojão parece uma guerra”, diz.

Outra lembrança da madrugada vivida pelos Campos Elíseos vem do idoso de 85 anos, Olavo Felipe. Ele conta que mora sozinho e foi pego de surpresa por aquele acontecimento. “O medo foi grande, eu estava dormindo e acordei com todo o barulho sem saber o que estava acontecendo. Hoje, estou mais tranquilo, mas tenho a impressão de que, sem os guardas da empresa no local, o bairro fica ainda mais perigoso, com um alto nível de furtos de fios. Restam os estragos que aconteceram na minha casa. Ainda não consegui consertar os vidros quebrados e as portas danificadas”, afirma.

Para Maria Vitória, empresária que trabalha na Avenida da Saudade, perto da antiga Prosegur, a insegurança ainda assusta. “Aqui na nossa região, constantemente somos roubados e assaltados. Por conta disso, a sensação de medo nunca acaba — ela só aumentou com aquele trauma. Parece que trabalhamos para sustentar bandidos. Aquilo foi, e continua sendo, algo horrível”, desabafa.

Curioso foi o que aconteceu com o empresário Marcelo Godoy, dono de uma oficina de carros, que tinha acabado de se mudar quando o mega-assalto aconteceu. “Naquele dia, tive uma sensação de grande alívio, diferente das demais pessoas daquela região. Há cinco anos, minha empresa praticamente dividia o muro com a Prosegur. Quando recebi a notícia do crime contra a antiga vizinha, parecia que estávamos recebendo uma segunda chance de vida. Nunca esquecerei daquela data”, lembra.

A situação da empresa


Um ano depois, local segue fechadoAtualmente, a Prosegur, já fechada, possui um muro que restringe a visão da frente do local. A antiga unidade continua vazia. Por meio de nota, a empresa esclareceu que o prédio onde ocorreu a ação criminosa, em 2016, estava totalmente capacitado para as operações que eram realizadas. Entretanto, desde o atentado, a companhia opera em nova sede na cidade, na Rua Antonio Fernandes Figueroa, 1830. 

A nova base, segundo a Prosegur, recebeu fortes investimentos em tecnologia e em infraestrutura de ponta, que a tornam ainda mais eficiente e segura, inclusive, com uso de tecnologias que invalidam o dinheiro roubado ou impossibilitam a chegada ao local. “Todas as bases da Prosegur no Brasil seguem rígidos padrões internacionais, definidos por grandes seguradoras mundiais, e são fiscalizadas anualmente pelo Ministério da Justiça, por meio da Polícia Federal, cumprindo todas as normas exigidas pela Lei 7.102/1983”, diz o comunicado da empresa.

Além disso, a companhia informou que colabora com as autoridades estaduais e federais para que todos possam trabalhar em conjunto, com ações preventivas e repressivas para evitar grandes ataques. 


Texto: Pedro Gomes 
Fotos: Pedro Gomes e Júlio Sian

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