Campo minado
As fotografias que ilustram a reportagem foram feitas entre os dias 27 e 29 de janeiro de 2019. Até o fechamento desta edição, a

Campo minado

Problema crônico em Ribeirão Preto, qualidade do asfalto incomoda motoristas e pedestres; Secretaria Municipal de Obras Públicas diz que, diariamente, tapa cerca de 800 buracos na cidade

Crítica frequente de quem passa pelas ruas de Ribeirão Preto, a qualidade do asfalto da cidade já se tornou um dos calcanhares de Aquiles do governo do prefeito Duarte Nogueira (PSDB). O problema consome, diariamente, entre 33 e 34 toneladas de Concreto Betuminoso Usinado a Quente (CBU) e Pré-Misturado A Frio (PMF), que são os materiais utilizados nos reparos. Só no ano passado, foram cerca de 10 mil toneladas destinadas à Operação Tapa-buraco, que tem como objetivo minimizar as imperfeições asfálticas da cidade. Entre janeiro e dezembro de 2018, a Secretaria de Obras Públicas recebeu quase 12 mil solicitações para o conserto de buracos nas ruas de Ribeirão Preto. Segundo o Executivo, 80% destes chamados já foram atendidos.
Trechos da Avenida Costa e Silva, em Ribeirão Preto, têm buracos à mostra e complicam a vida de motoristas
Para especialistas, no entanto, o reparo de buracos paliativamente não é a maneira mais adequada para estabelecer a qualidade da malha viária do município. É necessário, antes da reconstrução, um planejamento completo do trabalho. “É preciso um sistema que envolva a avaliação de toda a malha viária para definição das estratégias de intervenção nos pavimentos. Partindo do zero até a reconstrução, passando pela manutenção corretiva, manutenção preventiva e reforço estrutural. De uma maneira geral, tem faltado manutenção preventiva. É como se não fosse necessário comprar vacinas, apenas cuidar de quem está na UTI”, explica o engenheiro José Leomar Fernandes Júnior, professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola de Engenharia de São Carlos da USP (EESC-USP).

O professor ainda afirma que, quando uma via já tem mais de 10% da sua extensão com “remendos” provenientes da Operação Tapa-buraco, a Prefeitura está “jogando dinheiro fora”.  Neste caso, os remendos não são o suficiente para solucionar o caso. “Achar que só porque se está utilizando um CBUQ haverá a solução dos problemas, como uma panaceia, é ignorar muitos aspectos técnicos que, se não controlados, levam a um insucesso. Dada a complexidade do problema, há necessidade de uma abordagem técnica desde o diagnóstico, planejamento, projeto, execução, controle tecnológico e acompanhamento, com as atividades de manutenção e reabilitação, se necessário”, explica o especialista.

Para o engenheiro civil Anderson Manzoli, uma das saídas seria quantificar e qualificar todo o pavimento da cidade. Construir um banco de dados completo com as vias que recebem mais veículos pesados como ônibus e caminhões, quais são as rotas onde há maior deslocamento de ambulâncias e veículos de resgate, entre outras. "O sistema emergencial das operações tapa-buraco não resolve nada, é uma enganação. Não existe um levantamento quantitativo e um qualitativo dos buracos, é tudo empírico. Quando é emergencial, você não precisa de licitação. Por isso, eu acho muito difícil que a prefeitura ou as empresas abram mão deste sistema", critica Manzoli.

A maneira como as ruas recebem os reparos também apresenta problemas. Não há um estudo sobre qual o melhor tipo de pavimento para cada via e região da cidade. O mesmo material é utilizado em vias de trânsito pesado, com caminhões e ônibus, e para vias com pouco ou quase nenhum movimento. O que muda é apenas a espessura do material utilizado.

Além disso, em alguns pontos, da cidade, como em trechos da Avenida Nove de Julho, do centro e em vias mais antigas, como a Avenida Capitão Salomão, o revestimento é aplicado sobre uma camada de paralelepípedos do século passado.

Além disso, o professor também ressalta a questão da drenagem mal feita. “A água é uma grande inimiga dos pavimentos, tanto que no período chuvoso, que se inicia em outubro, na nossa região, aumentam os problemas”, acrescenta.

Outro lado

A Prefeitura de Ribeirão Preto admite que, em alguns casos, a Operação Tapa-buraco apenas reveste a camada superior do pavimento, não consertando o problema nas camadas inferiores. Veja infográfico explicativo nas páginas X e Y. “Na maioria das vezes, é realizado o reparo de revestimento. Quando há necessidade, é realizada a manutenção das camadas”, conclui.

De acordo com o governo, o serviço de tapa-buracos é realizado de forma emergencial em pontos específicos de vias que possuem imperfeições isoladas e oferecem risco à população. “Já o recapeamento, além de necessitar verba mais elevada, é indicado em situações em que o asfalto da via, em sua extensão, já está muito comprometido, não sendo possível executar a operação”, alega a prefeitura.

“A durabilidade da pavimentação atinge uma média de 8 anos. Além disso, podem ocorrer inúmeros casos de interrupção de galerias pluviais, redes de água e de esgoto, principalmente devido à idade naquelas localizadas em bairros antigos. Neste caso, ocorrem infiltrações que danificam os pavimentos”, informa o Executivo, por meio de nota. 

Qual o problema?

Os especialistas ouvidos pela Revide apontaram os principais problemas do asfalto da cidade:

• Desorganização na Operação Tapa-Buraco
• Falta de um plano geral para a pavimentação em Ribeirão Preto
• Falta de análise profissional e técnica do tipo de material e da maneira adequada para a pavimentação e reparos das vias públicas
• Zelo maior por medidas preventivas ao invés de emergenciais
• Falta de auditoria especializada

Por outro lado, a Prefeitura de Ribeirão Preto argumenta que realiza o serviço seguindo todas as normas técnicas. “Salientamos que, tanto o serviço do tapa-buracos quanto as obras de recape, seguem normas e especificações técnicas existentes após o levantamento para verificação dos tipos de defeito, nível de severidade, volume e tipos de tráfego”, explica, por meio de nota. Com relação à organização do serviço, o Executivo diz que existem cronogramas para os reparos. “Determinadas vias têm prioridade em detrimento de outras no município, considerando a seguinte ordem: atendimento a casos de risco, vias principais, vias secundárias e via locais”, acrescenta.

Sem equipamento adequado

O secretário municipal de Infraestrutura, Alexandre Betarello, afirmou, em Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal que apura irregularidades na Operação Tapa-buraco, que quatro equipes possuem apenas um rolo compactador e não têm compressão de jato de ar, impossibilitando que os serviços sejam executados segundo as normas do Departamento de Estradas e Rodagem (DER). Uma diligência será feita para acompanhar o trabalho. Por meio de nota, a prefeitura esclareceu que já providencia a contratação de empresa que será responsável pelo serviço em fevereiro. Será estipulado que ela tenha os equipamentos adequados.

Nas ruas

“O novo governante entra e começa a fazer o tapa-buraco, mas é mal feito e com um material de péssima qualidade. Percebemos isso, porque, a partir das primeiras chuvas, após consertos, os buracos voltam a surgir. Neste ano, choveu pouco e há muitos buracos. Não tem desculpa. Para nós, ou desviamos do buraco e batemos o carro, ou caímos no buraco e estragamos o veículo”.

Carlos Alberto Martins, empresário.

“Os buracos são muito perigosos. Eles são o motivo de muitos acidentes e, às vezes, até de mortes. Trabalho com veículos e tenho de tomar muito cuidado. Não atuo em áreas grandes, mas, como lido com os automóveis de outras pessoas, os cuidados têm de ser redobrados. Mesmo assim, no entanto, nós vemos uma situação muito precária. Há muitos buracos no asfalto e o trânsito está cada vez mais difícil”.

Erich Castro de Farias, manobrista.

Promessa de campanha

Durante a campanha à Prefeitura de Ribeirão Preto, em 2016, Duarte Nogueira afirmou que fiscalizaria, de perto, a qualidade do asfalto da cidade.

Texto: Paulo Apolinário | Fotos: Luan Porto e Pedro Gomes.

Compartilhar: