Crise Imobilizada

Crise Imobilizada

Se por um lado o mercado volátil faz com que a crise seja mais profunda no segmento imobiliário, essa mesma volatilidade faz seu desempenho melhorar acima da média em tempos de crescimento econômico

Texto: Paulo Apolinário | Foto: Amanda Bueno e Ibraim Leão 

Andar pelas ruas de Ribeirão Preto e não dar de cara com ao menos uma placa informando “aluga” ou “vende” é fato raro. O aumento de imóveis vagos é mais um dos reflexos da crise econômica. Com a diminuição do poder de compra, aliada ao receio em assumir novas dívidas, a população ribeirãopretana anda cautelosa na hora de investir no mercado imobiliário. É o que revela o Boletim da Construção Civil do Centro de Pesquisa em Economia Regional (Ceper). Segundo o levantamento, no comparativo entre 2016 e 2017, a Região Metropolitana de Ribeirão Preto registrou uma queda de 15,14% nas operações de crédito e 3,41% no financiamento imobiliário. De acordo com o boletim, Ribeirão Preto representa 74,3% das operações de crédito imobiliário da região.

Como o ciclo entre a decisão de um investimento desse porte e a entrega das chaves é longo (cerca de três anos), várias construtoras e incorporadoras decidiram realizar seus lançamentos em um momento em que a economia ainda se encontrava favorável.  Foi justamente essa “bolha” criada antes da crise uma das responsáveis por prejudicar ainda mais o segmento, conforme revela o professor em crescimento e desenvolvimento econômico pela FEA-USP, Luciano Nakabashi. “Na hora da entrega das chaves, as imobiliárias não tinham conseguido vender boa parte dos imóveis, pela rápida e profunda deterioração do cenário econômico, levando a uma grande elevação dos estoques”, analisa.  A crise também fez uma “limpa” no mercado, como pontua o gerente da Mundial Imóveis, Thiago Calil. “O mercado estava muito aquecido, com isso, alguns aventureiros acharam que era fácil. A crise retirou esse pessoal do mercado. Só as empresas com estrutura e experiência conseguiram sobreviver”, enaltece Calil, que afirma ser uma renovação vantajosa para os clientes.
“Ainda há uma grande oferta de imóveis disponíveis para locação, mas menor do que no ano passado”, comenta Sérgio Fortes Guimarães
Com o receio de adquirir uma dívida de décadas e esperando por dias melhores para a economia, a solução passa a ser o adiamento do sonho da casa própria e uma opção pelo aluguel, o que, por um lado, sustenta a recuperação das imobiliárias. É o que indica o diretor de locação da Imobiliária Fortes Guimarães, Sergio Fortes Guimarães. “Em comparação com o ano passado, em que o mercado sofreu demasiadamente com a recessão, podemos notar um aumento muito grande na quantidade de locações concretizadas, notadamente depois de marco. No nosso negócio, 2017 está sendo, inclusive, superior a 2015”, observa Guimarães. 

Essa variação na economia, segundo Nakabashi, faz parte do comportamento do mercado imobiliário.  “Os dados
mostram que o PIB do mercado imobiliário é muito mais volátil do que o do restante da economia, ou seja, costuma ter um desempenho acima da média em períodos de crescimento, com maior retração em períodos de recessão econômica”, esclarece o professor. Além disso, o preço do metro quadrado em Ribeirão Preto ainda está abaixo da média nacional. No boletim imobiliário da Ceper, o metro quadrado ribeirãopretano aparece por R$ 15,71, abaixo de cidades como Salvador (R$ 21,91/m²), Florianópolis (R$ 21/m²), Porto Alegre (R$ 20/m²), Campinas (R$ 18,75/m²), Natal (R$ 17,36/m²), Vitória (R$ 16,67/m²) e Belo Horizonte (R$ 16,00/m²), por exemplo. 

Saindo da crise 
A crise somada à grande oferta fez com que muitos proprietários concedessem descontos nos aluguéis e também flexibilizassem a negociação em relação às garantias solicitadas. Na Fortes Guimarães, por exemplo, essa foi a saída encontrada para se adequar e se manter no mercado durante a recessão. “No nosso caso, além de melhorar os processos internos, disponibilizamos uma nova equipe de vendas. Também investimos em plataformas digitais e de marketing digital para captar mais clientes e, consequentemente, fazer mais negócios”, explica Guimarães.

Para Sérgio Valente, tecnologia, marketing e capacitação profissional foram fatores que ajudaram sua empresa a se manter durante a crisePara Sérgio Valente, diretor da Imobiliária Santa Maria, a crise também abre oportunidades de crescimento. “Vejo esses momentos do mercado como uma oportunidade para a empresa se reciclar. Muitos negócios e profissionais deixam o mercado nesses períodos e isso, de certa forma, fortalece aqueles que permanecem”, argumenta Valente.  Mesmo estando em empresas que competem no mercado, a resposta para gerenciar os negócios durante a crise é parecida entre os empresários do ramo. “Muitas vezes, os detalhes fazem a diferença. Temos investido muito em tecnologia, marketing e capacitação”, explica Valente.

Já Calil ressalta que, para se manter no mercado, é necessário entender a mudança no comportamento de consumo e expectativa dos clientes. Para isso, as empresas precisam investir em inovação, fidelização, atendimento qualificado, publicidade e capacitação profissional da equipe. “Por se tratar de um período de instabilidade, as empresas que se fortalecem na recessão estarão em um patamar de destaque quando a economia for reestabelecida”, finaliza Calil.

“Com a recuperação da economia, os dois mercados estão aquecidos”, analisa Thiago CalilDesse modo, se por um lado o mercado volátil faz com que a crise seja mais profunda no segmento imobiliário, essa mesma volatilidade faz seu desempenho melhorar acima da média em tempos de crescimento. Quando a economia se recupera, ocorre melhora no emprego e na renda, maior otimismo em relação ao futuro e, desse modo, maior disposição por parte das famílias na compra de imóveis, por exemplo. Nestes momentos, quando os juros estão baixos, ocorre um crescimento da demanda por imóveis e outros bens duráveis. 

Outro fator preponderante para a regulação do mercado são as eleições presidenciais de 2018. Cada presidenciável possui um plano econômico diferente para o país e isso faz com que o mercado reaja de maneiras distintas, dependendo de quem for eleito. “Como a crise foi muito profunda e a recuperação está sendo lenta, além de um cenário político incerto decorrente das eleições presidenciais de 2018, há uma tendência de estagnação ou de lenta recuperação do segmento imobiliário no ano que vem. Há a possibilidade de apresentar desempenho bem melhor a partir de 2019, o que depende, em grande medida, do presidente que será eleito no próximo ano”, conclui Nakabashi. 

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